sexta-feira, 2 de setembro de 2016

LITERATURA, SUICÍDIO E LUGARES INCRÍVEIS

Uma análise sobre o livro Por Lugares Incríveis de Jennifer Niven, as reflexões e lições que aprendemos com a leitura, os casos de suicídio no Brasil e porque precisamos falar sobre isto sem vergonha ou medo dos julgamentos alheios.

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Então você ganha um livro de presente que te conquista já na capa. Um verde gostoso, lembrando aquela cor meio água, meio vintage, com um prédio feito com aqueles blocos dos “pequenos construtores”( e se você tiver mais de 30 como eu, automaticamente será remetido a sua infância) e um casal estilo palitinho. Ok! A capa já te ganhou, fica mais fácil dar uma chance para o conteúdo.
Todo o livro que começamos tem aquelas dez páginas iniciais que ou te fazem amar ou odiar. Não tem meio-termo. A gente até pode dar mais uma chance para o livro, mesmo odiando, depois das dez páginas iniciais, mas é fato que o que apaixona está ali, naquele começo. Então Por Lugares Incríveis te ganha nas primeiras 3 páginas. Leitura gostosa, fluente, linguagem simples e você percebe logo de cara que a autora traz uma carga emocional pesada no texto, apesar de sua sutileza em abordar questões como: perda, depressão, adolescência, suicídio, abandono emocional, opa suicídio?
Como assim? O livro fala sobre suicídio? Não se fala de suicídio. Falar encoraja as pessoas, constrange os familiares, é desagradável. Você já parou para pensar que enquanto você pensa nisso, uma pessoa se matou no mundo? Um relatório divulgado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 2014, informou que a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio no mundo e o Brasil é o oitavo país com mais casos de suicídio. E tudo que temos é um serviço de Apoio a Valorização da Vida de telefone. Onde estão as campanhas? Como prevenir? Como ajudar? Onde estão as notícias e informações sobre o assunto e os casos? Ninguém sabe, pois temos medo de falar sobre isso como se fosse uma lepra ou a praga zumbi.
No livro, Theodore Finch, um adolescente no final do colegial, pesquisa vários métodos de suicídio enquanto avalia se conseguiria levar algum adiante. Enquanto ele estuda as possibilidade da vários sinais de que não está bem, que precisa de ajuda e que está com problemas. Mas todos a sua volta ignoram. Sua família, seus amigos, as pessoas que o conhecem e nem sabem o quanto podem ajudar ou prejudicar a vida de alguém. Simplesmente ninguém quer ver, ninguém enxerga. Todos preferem “ele é assim”.
É exatamente o que acontece em nossa sociedade. As pessoas ignoram os avisos, os pedidos silenciosos de ajuda de alguém que está doente. É mais fácil eu fingir que está tudo bem, ela só está triste, chateada. Vai passar. Só que as vezes não passa. As vezes, quando você resolve prestar a atenção, não existe mais nada Às ser feito.
O suicida não consegue enxergar outra alternativa para curar sua dor se não a morte. Ele planeja, pensa e avalia, mas a solução que ele encontra é tirar a própria vida. Isso não pega, não contagia, não se prolifera como um vírus. A doença está na mente do suicida. Então por que não falamos sobre o assunto? Por que cada vez que alguém se mata é tudo tratado com sigilo? Precisamos de campanhas educativas e preventivas. Precisamos de centros de apoio, precisamos noticiar os casos, os motivos. Precisamos parar de ter vergonha de amigos e familiares. Precisamos acordar.
Em Por Lugares Incríveis conhecemos lugares incríveis da mente de um suicida. Passeamos sobre os sentimentos e o que os leva a tomar tal atitude. Viajamos e percorremos caminhos que fazem a gente refletir que está na hora de olharmos mais para os lados, prestar atenção nas coisas que nos cercam e, principalmente, nas pessoas que amamos. Elas podem estar pedindo socorro silenciosamente e nós por vergonha, não sei exatamente do que, ignoramos.

LUÍSA ARANHA

Luísa Aranha é gaúcha, nascida em Porto Alegre. Formada em jornalismo pela Universidade Federal do Pampa e autora do blog Causos & Prosas. 
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