Processo Penal. Requisitos da denúncia. Norma penal em branco. Falta de descrição do complemento. Inépcia.
“Crime de adulteração de combustível. Não preenchimento dos requisitos da norma penal em branco. Inépcia da inicial acusatória. A denúncia deve descrever o complemento da norma penal em branco. Suscitação de tese defensiva na sustentação oral. Tese de inépcia da inicial acusatória acolhida. Trancamento da ação penal” (TJSP - 3ª C. - Ap. 993.07.016458-1 - rel. Luiz Pantaleão - j. 12.5.2009 - DJE 11.03.2010 - ementa não-oficial).
Anotação: Quando se trata de crime previsto em norma penal em branco, como é o caso, por exemplo, daqueles tipificados nos arts. 1º, I, da Lei nº 8.176/91; 33, da Lei nº 11.343/06 e; 7º, II, da Lei nº 8.137/90, a denúncia deve descrever qual o complemento do tipo penal, que torna a conduta criminosa.
Nas normas penais em branco são os complementos que ditam a tipicidade da conduta. Dessa forma, se a norma complementar não descreve determinada substância como sendo entorpecente, a conduta de vender ou ter em depósito referida substância não poderá ser considerada crime. E isso deve ser devidamente narrado na inicial acusatória.
Não é de hoje que o Supremo Tribunal Federal entende que é necessária a indicação da lei complementar na denúncia, quando se trata de norma penal em branco, cf. 1ª T., RHC 65.130/AC, rel. Octavio Gallotti, DJU 07.08.1987, p. 15.435. E o Superior Tribunal de Justiça também partilha desse entendimento, tendo já decidido de forma reiterada que “é de rigor que a denúncia narre o respectivo complemento normativo, sob pena de flagrante inépcia” (5ª T., HC 82.734/PE, rel. Jane Silva, DJU 26.11.2007, p. 221. No mesmo sentido: 5ª T., RHC 18.919/PA, rel. Felix Fischer, DJU 14.08.2006, p. 302 e 6ª T., HC 42.486/MG, rel. Nilson Naves, DJU 22.05.2006, p. 252).
Assim, a narrativa na inicial acusatória do complemento do tipo penal em branco é imprescindível para atender aos requisitos do art. 41 do CPP. Caso contrário, a denúncia torna-se imprecisa, vaga e indefinida, padecendo de irremediável inépcia. Aliás, carecendo a exordial da devida indicação da norma completadora do tipo penal em branco pode-se até mesmo imputar indevidamente a alguém a prática de uma conduta atípica.
Outro aspecto importante desse julgado que vale ressaltar é a possibilidade de invocação e acolhimento de nova tese defensiva em sustentação oral, como forma de consagrar a ampla manifestação do direito de defesa e o princípio da oralidade.
Cecilia Tripodi.Direito Penal. Causas de aumento da pena da Lei de Drogas.
“Réu preso em flagrante depois de vender maconha a dois usuários, sendo apreendidos em seu poder vinte e um reais e vinte e cinco centavos e outra porção de maconha, no esconderijo onde mantinha o entorpecente guardado para vendas no estacionamento externo de shopping center. É indiscutível que em locais dessa natureza há sempre muitas pessoas transitando. Todavia, não estão expressamente enunciados no rol taxativo do inciso III do artigo 40 da Lei nº 11.343/2006, que não pode ser interpretado extensivamente para incluir as cercanias de recinto de trabalho coletivo” (TJDFT - C. - EI 2007.01.1.029485-6 - rel. George Lopes Leite - j. 08.02.2010 - dju 12.03.2010).
Direito Penal. Tráfico de Drogas. Quadrilha ou bando. Vínculo associativo não comprovado.
“Inexistindo provas judicializadas da convergência de vontades, estável ou permanente, não há que se falar em delito de formação de quadrilha, pois a sua caracterização exige prova inconteste de vínculo associativo permanente com a finalidade de cometer crimes, formando uma verdadeira societas sceleris para essa finalidade” (TJMG - 3ª C. - AP 1.0143.05.009070-1/001 - rel. Antônio Armando dos Anjos - j. 15.12.2009 - DOE 10.03.2010).
Direito Penal. Princípio da proibição do bis in idem. Proibição de aplicação de uma agravante já considerada.
“Incabível a cumulação da agravante do art. 61, inciso II, alínea “f”, e da majorante do art. 226, inciso II, ambos do Código Penal, por configurar bis in idem, uma vez que ambas tem o mesmo objeto: a punição do delito praticado no âmbito doméstico. Readequação da pena de ofício” (TJMT - 3ª C. - AP 106381/09 - rel. Luiz Ferreira da Silva - j. 10.02.2010 - DJE 24.02.2010).
Direito Penal. Crimes de trânsito. Direção de veículo sob a influência de álcool. Prova pericial. Teste de alcoolemia.
“A caracterização do delito de embriaguez ao volante, tendo em vista a nova redação do art. 306 dada pela Lei 11.705/08, exige a quantidade igual ou superior a de 0,6 dg de álcool por litro de sangue, podendo esta somente ser aferida mediante prova técnica. (...), não há que se falar em condenação baseada no livre convencimento do juiz e nem em provas testemunhais” (TJPR - 2ª C. - EDC 0603835-7/01 - rel. Noeval de Quadros - j. 18.02.2010 - ementa não-oficial).
Direito Penal. Estelionato. Torpeza bilateral.
“Acusada que, passando-se por inspetora de polícia, negocia ‘preço’ com possíveis candidatos, prometendo-lhes vaga nos quadros da polícia civil sem que eles tenham que se submeter a concurso público. Ao pagarem o ‘preço’ exigido pela acusada as vítimas sabiam da absoluta ilicitude de suas pretensões, configurando-se, assim, a torpeza bilateral, que torna impunível a conduta da acusada. E o crime de falsa identidade ‘foi perpetrado para o cometimento do crime-fim, que seria o do art. 171 CP, e, pelas mesmas razões acima expostas, não merece subsistir como delito autônomo’” (TJRJ - 5ª Câm. Crim. - AP 2008.050.07209 - rel. Sergio de Souza Verani - j. 08.10.2009).
Direito Penal. Conflito de competência. Turma recursal. Justiça estadual. Competência penal estadual.
“O conflito de competência entre Juízos do Juizado Especial Criminal e da Justiça Criminal Comum deve ser resolvido pelo Tribunal de Justiça Estadual, conforme atual orientação do STF. Competência declinada para o Tribunal de Justiça” (TJRS - TRC - C. Comp.71002435584 - rel. Jucelana Lurdes Pereira dos Santos - j. 22.02.2010 - DOE 26.02.2010).
Direito Penal. Desacato. Atipicidade da conduta.
“Tendo o réu proferido ofensas contra os policiais militares em momento de descontrole emocional, após ser violentamente agredido por terceiros, impositiva a sua absolvição porque ausente a intenção de ofender os policiais ou de depreciar a função pública. Recurso provido” (TJRS - TRC - AP71002427250 - rel. Cristina Pereira Gonzales - j. 22.02.2010 - DOE 26.02.2010).
Direito Penal. Direito Processual Penal. Concurso material ou real. Reformatio in pejus.
“Se um dos acusados admite ter escondido as armas e a granada e foi ele quem indicou esse local aos policiais que os arrecadou, tem-se por certa a autoria. Todavia, o fato de haver mais de uma arma e uma granada não constitui concurso de infrações, mas crime único, resolvendo-se a multiplicidade de objetos na dosimetria da pena. Por outro lado, se, apesar disso, a pena fixada na sentença for menor que aquela que resultaria do novo cálculo, tratando-se de recurso defensivo, deve ser ela mantida, sob pena de real prejuízo para o réu em razão da ofensa do princípio no reformatio in pejus” (TJRJ - 1ª Câm. Crim. - AP 2009.050.05556 - rel. Ricardo Bustamante - j. 18.01.2010).
Direito Processual Penal. Instrução criminal. Audiência de instrução e julgamento. Excesso de prazo.
“Paciente acusado de substrair uma bicicleta, marca Caloi, em 25.05.2009, que se encontrava presa a uma corrente. Conduta filmada por equipamento instalado no local. Paciente preso em 26.06.2009. Excesso de prazo na instrução. Acolhimento. Citação ocorrida em 15.07.2009 e designação de audiência de instrução e julgamento para 26.12.2010. Inexistência de razoabilidade. Excesso de prazo configurado” (TJBA - 1ª Câm. Crim. - HC 1549-1/2009 - rel. Vilma Costa Veiga - j. 02.02.2010).
Direito Processual Penal. Rejeição da denúncia. Excesso de prazo. Princípio da razoabilidade. Princípio da dignidade da pessoa humana.
“I - Instrução criminal não iniciada, após quase sete meses da prisão precautelar do paciente. Informações prestadas pela autoridade coatora, confirmando o não recebimento da denúncia, até o momento, bem assim a injustificável delonga, de resto, não imputada ao paciente, nem à sua defesa técnica, tampouco, à complexidade do feito. II - O princípio da razoabilidade deve orientar a análise do julgador, para que seja verificada, em cada situação concreta, a ocorrência, ou não, de demora irrazoável, no que pertine ao trânsito da instrução criminal. Nessa alheta, há de levar-se, em linha de conta, a existência, ou não, de inércia, desídia, ou mau funcionamento do aparelho judiciário. III - Forte, em Claus Roxin, dir-se-é que: ‘la dignidad humana no puede ser objeto de ponderación. Ella está constituida por aquel núcleo esencial interno de la individualidad, que el tribunal pasado, presente y futuro del derecho procesal penal. 1ª ed. Santa Fe: Rubinzal culzoni, 2007, p. 124 constitucional declara, com razón, como intangible (...)’. Em tradução livre: a dignidade humana não pode ser objeto de ponderação, ela está constituída por aquele núcleo essencial da individualidade, que o tribunal constitucional declara, com razão, como intangível. IV - Inequívoco malferimento da letra legalitária do art. 5°, LXXVIII, que estatui, como direito fundamental, a razoável duração do processo. Configuração de excesso de prazo, que vergasta, desapiedadamente, o princípio da dignidade da pessoa humana. V - Parecer da procuradoria de justiça pela concessão do pedido. VI - Ordem concedida” (TJBA - 1ª Câm. Crim. - HC 12417-5/2009 - rel. Lourival Almeida Trindade - j. 09.02.2010).
Direito Processual Penal. Prova testemunhal. Reconhecimento feito pela vítima.
“O reconhecimento feito pela vítima, em contraposição às declarações do réu, é insuficiente para a condenação se não amparado por outros elementos probatórios” (TJDFT - 1ª T. - AP 2006.07.1.018684-0 - rel. César Loyola - j. 11.02.2010 - dju 09.03.2010).
Direito Processual Penal. Prisão cautelar. Necessidade de demonstração inequívoca dos pressupostos legais.
“O fato de o paciente residir em região de fronteira, não é suficiente para respaldar a custódia preventiva, mostrando-se como inidônea a autorizar a prisão cautelar, eis que desvinculada de fatores concretos, que não a própria prática delitiva” (TJMT - 1ª C. - HC 6519/10 - rel. Rui Ramos Ribeiro - j. 23.02.2010 - DJE 03.03.2010).
Direito Processual Penal. Cerceamento de defesa. Defensor Público. Intimação pessoal das decisões. Nulidades insanáveis.
“Mister se faz o reconhecimento de qualquer nulidade absoluta, como a falta de intimação pessoal de defensor dativo, considerando tratar-se de matéria de ordem pública, devendo ser analisada pela segunda instância, porém, através de habeas corpus.A injusta frustração desse direito, por falta de intimação pessoal do Defensor Público para a sessão de julgamento do recurso de apelação interposto pelo Ministério Público, afeta, em sua própria substância, o princípio constitucional da amplitude de defesa. O cerceamento do exercício dessa prerrogativa - que constitui uma das projeções concretizadoras do direito de defesa - enseja, quando configurado, a própria invalidação do julgamento realizado pelo Tribunal, em função da carga irrecusável de prejuízo que lhe é ínsita” (TJPR - 5ª C. - Rev. Crim. 0559677-2 -rel. Denise Hammerschmidt - j. 18.02.2010 - ementa não-oficial).
Direito Processual Penal. Crimes ambientais. Ausência de prova pericial.
“Ausente prova pericial, para comprovar a potencialidade poluidora da atividade exercida pelo réu, o delito do art. 54 da lei ambiental não restou plenamente configurado. Absolvição impositiva. Recurso da defesa provido e prejudicado o apelo do MP” (TJRS - 4ª C. - AP70033574377 - rel. Gaspar Marques Batista - j. 25.02.2010 - DOE 10.03.2010).
Processo Penal. Prisão em flagrante. Garantia do prazo razoável na duração do processo. Excesso de prazo.
“Prisão em flagrante. Instrução processual já encerrada. Feito em termos para prolação de sentença de mérito. Pendência de certidão de antecedentes criminais de um dos corréus. Superação da Súmula 52 do STJ. Prazo para a ultimação dos processos de réus presos orienta-se por critérios de razoabilidade. Certidão de antecedentes criminais não influi no julgamento da ação penal. A paralisação do feito configura injustificável abuso contra a liberdade de locomoção do paciente. Ordem concedida. (TJSP - 7ª Câm. Crim. - HC 990.09.283673-0 - rel. Pedro Menin - j. 25.02.2010 - ementa não-oficial).
Execução Penal. Assistência ao condenado, ao internado e ao egresso. Direitos do preso provisório, do condenado e do internado. Direito de receber visitas.
“Os direitos respeitantes à assistência familiar ao preso e de proteção do estado à unidade familiar tem total prevalência sobre regras de caráter geral da administração penitenciária.A restrição relativa à natureza do visitante, pessoa condenada, a toda evidência, ofende o direito impostergável que todo cidadão tem de receber visitas e de visitar, estando na condição de presidiário ou tendo parentes nessa condição” (TJDFT - 1ª T. - HC 2009.00.2.017216-9 - rel. George Lopes Leite - j. 18.02.2010 - dju 11.03.2010).
Execução Penal. Habeas corpus. Progressão de regime prisional. Ausência de vaga em estabelecimento prisional. Manutenção em regime prisional mais gravoso. Regime aberto.
“O preso não pode ser punido pela falta de estrutura carcerária do Estado. Habeas corpus é instrumento apto a sanar tamanha ilegalidade. Se não há vagas no regime de cumprimento de pena adequado - e determinado pelo Juízo da Execução -, assiste ao sentenciado o direito de aguardar em regime aberto pela determinada. Fixado o prazo de 48 horas para a transferência do sentenciado para o regime adequado. Caso não seja cumprido, será expedido alvará de soltura para que aguarde no regime aberto a vaga apropriada” (TJSP - 7ª Câm. Crim. - HC 990.09.297.697-4 - rel. Cristiano Kuntz - j. 04.02.2010).
Jurisprudência compilada por Adriano Galvão Dias Resende, Alice Matsuo, Andrea Lua, Camila Benvenutti, Caroline Braun, Cecília Tripodi, Cunha Di Sarno, Daniel Del Cide, Fernanda Carolina de Araújo, Fernando Gardinali Caetano Dias, Lúcia Reinert, Priscila Pamela dos Santos, Nestor Eduardo Araruna Santiago, Rafael Carlsson Gaudio Custódio e Renan Macedo V. Guimarães.
Boletim IBCCRIM nº 209 - Abril / 2010
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