O caso do assassinato dos seis jovens de Luziânia (GO) - violentados e mortos pelo pedreiro Adimar Jesus da Silva, que confessou os crimes e indicou a localização dos corpos - teve, no fim de semana, um desfecho que voltou a colocar em xeque o sistema penal brasileiro. Neste domingo (18), Adimar foi encontrado morto em sua cela, numa delegacia em Goiânia.
Para entender os diversos aspectos legais que se relacionam o caso, a Agência Senado conversou com o consultor legislativo Fabiano Silveira, mestre em Ciências Penais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Silveira fez o histórico de duas decisões recentes na legislação penal brasileira que tiveram consequências diretas no caso Adimar da Silva: o fim da exigência de exame criminológico para concessão da progressão de pena e a extensão do benefício da progressão para os casos de crimes hediondos.
Esses temas foram abordados pelos senadores Demóstenes Torres (DEM-GO) e Romeu Tuma (PTB-SP) na audiência pública que a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) promoveu na última semana, a respeito dos assassinatos em Luziânia.
Problema prático
Muito se questiona a respeito da decisão que colocou Adimar em liberdade depois de já ter estado preso por quatro anos, acusado de pedofilia. O pedreiro recebeu o benefício da progressão de pena e foi posto em regime semiaberto uma semana antes de assassinar o primeiro dos jovens de Luziânia.
De acordo com o consultor, ainda que nada impeça que o juiz responsável pelo caso solicite a perícia, a partir da Lei 10.792/03, o bom comportamento passou a ser o principal critério a ser levado em consideração para a concessão da progressão do regime prisional. Antes, a soltura dependia da realização obrigatória do exame criminológico. A medida, de acordo com Silveira, gerou uma maior mobilidade da população carcerária, que passou a crescer num ritmo menos acelerado.
- Antes, o preso obtinha o prazo para a progressão [1/6 da pena], mas havia demora na confecção do laudo da perícia. Como resultado, os presos ficavam mais tempo em regime fechado, o que gerava um problema prático - disse o consultor.
À época da sanção do projeto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o senador Demóstenes Torres criticou em Plenário a modificação. Ele afirmou, então, que a intenção real do governo, com o projeto, seria "aliviar a pressão do sistema penitenciário e acabar com as notícias ruins no setor".
Segundo informações da imprensa, a decisão judicial que permitiu a progressão da pena de Adimar para o regime semiaberto foi embasada em um exame criminológico de 2008, que apontou para a necessidade de realização outros exames. Ele foi liberado em 2009 após ser submetido a um exame psiquiátrico e um psicológico.
Reinserção em sociedade
Em 2006, nova alteração na jurisprudência estendeu o benefício da progressão da pena aos condenados por crimes hediondos - até então, lei aprovada pelo Congresso os obrigava a cumprir integralmente suas penas em regime fechado. Naquele ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que a progressão seria um estatuto positivo para o preso que apresentasse bom comportamento e proporcionaria meios para sua reinserção em sociedade. A decisão, à época, de acordo com o consultor, não foi unânime.
Em 2007, para adequar a legislação à decisão do STF, o Executivo enviou ao Congresso um projeto de lei cujo objetivo seria endurecer o regime de progressão de pena para os condenados por prática de crimes hediondos. O projeto, que deu origem à Lei 11.464/2007, estabelecia que os condenados por crimes hediondos só teriam direito à progressão penal após o cumprimento de 2/5 da pena em regime fechado, em caso de réu primário, e após o cumprimento de 3/5, se reincidente.
Entre uma e outra decisão, porém, como observou o consultor Fabiano Silveira, houve um "vácuo legislativo" que permitiu que condenados por crimes hediondos fossem postos em liberdade após o cumprimento de apenas 1/6 da pena.
Problema estrutural
Na opinião do consultor Fabiano Silveira, o problema do sistema penal brasileiro é mais estrutural, de recursos humanos e logísticos do sistema carcerário, do que propriamente de ordem legislativa. Porém, ele apontou duas medidas legislativas que, a seu ver, poderiam minimizar os riscos à sociedade.
- Uma delas é o monitoramento eletrônico, já previsto no projeto de reforma do Código do Processo Penal. E, em casos extremamente graves, que envolvam psicopatias, exame criminológico obrigatório - disse.
Raíssa Abreu / Agência Senado
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