segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Olha para os seus filhos, Brasil!




Fora de foco, o menino na foto retrata bem a situação das crianças que trabalham nas ruas das metrópoles brasileiras: até a bota velha é mais importante do que ele, que ninguém vê direito.



Feita com uma máquina manual pelo físico Pedro Brandimarte Mendonça no Centro de São Paulo, a fotografia intitulada “Chute na Infância” (foto ao lado) foi a vencedora do concurso Filhos do Brasil, promovido pelo Instituto para o Desenvolvimento da Criança e Adolescente Educação, Cultura e Esporte (Idecace). Ela e as outras 41 fotografias concorrentes estão expostas até 24 de agosto em 42 painéis de 3m x 5m montados na alameda em frente ao Planetário do Parque do Ibirapuera, em São Paulo. A mostra itinerante Filhos do Brasil segue em outubro para Recife e depois para Salvador, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre.



“A foto ficou bem representativa da situação marginalizada das crianças que estão nas ruas. Outras pessoas também perceberam a simbologia da criança desfocada”, diz Brandimarte. Ele conta que conheceu a realidade das crianças que vivem nas ruas aos 16 anos, quando trabalhou como voluntário na Associação de Meninos e Meninas da Praça da Sé. “Quando a criança vai para a rua se sujeita a situações muito ruins. É barra pesada”, lembra o doutorando em nanotecnologia na USP, que continua no voluntariado, hoje como professor de física na Educafro, uma rede de cursos pré-vestibulares comunitários.



O concurso recebeu fotos de lugares diversos do Brasil. Em comum, o fato de retratarem crianças e adolescentes em situações desumanas e impróprias, seja nas grandes cidades ou no meio rural. Uma comissão julgadora selecionou 15 fotos e os três primeiros colocados foram eleitos por um júri popular pela internet.



Crianças e jovens alunos das escolas das redes públicas estaduais e municipais que visitam a mostra são incentivados a refletir em diversas atividades educativas. Além do concurso e da mostra, o projeto Filhos do Brasil - Desordem e Progresso inclui a realização de um livro, um espetáculo de teatro e um longa-metragem, além das constantes palestras e debates.



De acordo com o publicitário Wilson Cardoso, presidente do Idecace e idealizador do projeto, o objetivo das ações é chamar a atenção da sociedade e dos gestores públicos para a questão da infância e adolescência. “A idéia dos concursos de fotos e vídeos era fazer uma radiografia do que acontece em cada local e então trabalhar com informações de cada região para buscar soluções para cada problema. Mostramos aos gestores experiências positivas e sugerimos modelos operacionais”, explica.



Cardoso acrescenta que a gestão pública não sabe como executar projetos. “A administração é precária, não se sabe prestar contas ou fazer uma relação com a sociedade”, diz. Em cada cidade por onde passar ao longo de um ano, a mostra promoverá debates sobre os problemas específicos daquela região.

No Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, por exemplo, um dos problemas é a exploração do trabalho infantil na agricultura. Segundo colocado no concurso, o estudante de publicidade Paulo Henrique Lopes fotografou, com uma máquina emprestada, um menino na cidade de Divisópolis, na divisa dos estados de Minas e Bahia (ao lado).



A foto não mostra, mas a criança tinha uma barriga enorme, causada por verminose. Apesar do alerta de Paulo Henrique e dos outros estudantes que lá estavam fazendo um trabalho acadêmico, a mãe do menino desdenhou o diagnóstico, insistindo que o que o menino era assim porque tomava muita água. Conscientes, os estudantes pediram a enfermeiros da cidade que atentassem para este e outros casos na região.



Voluntário do Projeto Rondon, que mapeia problemas a serem tratados no Brasil, Paulo Henrique explica que o nome da sua foto, "Mito da Caverna", refere-se à história em que os personagens não encaram as verdades que doem.



“As pessoas vêem as crianças em situação de risco e fingem que não está acontecendo nada. O povo olha, sente dó, mas ninguém faz nada. Os prédios colocam plantas e quadros para tapar a imagem das favelas. A criança na minha foto representa todas as outras exploradas na agricultura, sexualmente e em outros tipos de trabalho”, conclui.



O Brasil está entre os países com os maiores índices de trabalho infantil. A Organização Internacional do Trabalho no Brasil estima que cerca de quatro milhões de crianças e adolescentes entre cinco e 16 anos trabalhem no Brasil, prejudicando seu desenvolvimento físico, emocional e intelectual.

Comunidade Segura.

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