A denúncia anônima, sozinha, não serve para embasar a abertura de inquérito, mas tem força suficiente para justificar diligências preliminares com o objetivo de apurar a veracidade das informações obtidas anonimamente. Feito esse processo, é possível instaurar uma investigação, que pode, se necessário, envolver a interceptação de telefones, e-mails, mensagens de texto e cartas.
Com esse entendimento, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, negou recurso de uma mulher condenada por desviar verbas públicas federais e apropriações indevidas em duas Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) sediadas em Curitiba.
Ela foi condenada em julho de 2014 a 26 anos e 8 meses de prisão por peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa, falsidade ideológica, fraude em licitação e associação criminosa. Antes do STF, o recurso foi negado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (RS, SC e PR) e pelo Superior Tribunal de Justiça.
No Supremo, a defesa alegou a ausência de fundamentação na decisão do juízo da 2ª Vara Criminal Federal de Curitiba que autorizou as interceptações telefônicas. Alegou que as diligências foram feitas sem investigação preliminar e baseadas somente em denúncia anônima.
Pediu ainda a nulidade das interceptações telemáticas argumentando que o parágrafo único do artigo 1º da Lei 9.296/1996 seria incompatível com o sigilo da correspondência (artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal). Mas o pedido foi rejeitado pelo relator do recurso, ministro Dias Toffoli.
Ele afirmou que, segundo os autos, apesar de apócrifo, o documento que noticiou as ilicitudes indica como seu autor o então presidente do Instituto de Defesa dos Direitos Humanos (IDDEHA). Verificou também que, antes das interceptações, já havia investigações em curso para apurar as movimentações financeiras das Oscips.
A partir da denúncia, enfatizou Toffoli, a autoridade policial fez diligências preliminares e recebeu informações do Ministério da Justiça e dados enviados pela Controladoria-Geral da União.
“O procedimento tomado pela autoridade policial está em perfeita consonância com o entendimento desta Suprema Corte, segundo o qual a denúncia anônima, por si só, não serve para fundamentar a instauração de inquérito, mas, a partir dela, poderá a autoridade competente realizar diligências preliminares para apurar a veracidade das informações obtidas anonimamente e, então, instaurar o procedimento investigatório”, destacou Toffoli.
Segundo ele, tanto a decisão que autorizou as interceptações quanto as que as prorrogaram foram devidamente fundamentadas. Especificamente sobre a suposta incompatibilidade das interceptações telemáticas com o direito individual do sigilo de correspondência, o ministrou destacou que nenhuma garantia constitucional é absoluta.
“Sigilo da comunicação de dados por meios informáticos, assim como os demais direitos individuais, não é absoluto, podendo ser afastado para apuração de crime por meio de decisão judicial devidamente fundamentada”, afirmou.
Ele lembrou ainda que a 1ª Turma do STF, ao julgar o HC 70.814 validou a interceptação de e-mails enviados pelos sentenciados. Nesse caso, a corte entendeu que a inviolabilidade do sigilo não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas ilícitas.
Partindo desse princípio, Toffoli detalhou que a exceção constitucional ao sigilo alcança as comunicações de dados telemáticos, não havendo qualquer vício no caso em análise. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.
Clique aqui para ler o voto do relator.
RHC 132.115
Revista Consultor Jurídico, 10 de fevereiro de 2018.
Nenhum comentário:
Postar um comentário