O juiz e professor de direito Bruno Azevedo, pioneiro no uso de tornozeleira eletrônica
Mais conhecidas do público por conta de seu uso por políticos, as tornozeleiras eletrônicas para monitorar presos completam uma década de aplicação no Brasil. A primeira experiência desses equipamentos ocorreu quando o então juiz da Comarca de Guarabira (PB), Bruno Azevedo, decidiu testar as tornozeleiras em cinco presos voluntários.
Azevedo é autor do livro "O Monitoramento Eletrônico de Presos e a Paz Social no Contexto Urbano", no qual faz uma análise desde o lançamento, em 2007, do seu projeto "Liberdade Vigiada - Sociedade Protegida". O livro foi lançado na Escola Superior da Magistratura, em João Pessoa, na quinta-feira (21).
Para Azevedo, o monitoramento deveria se tornar um novo tipo regime de prisão, em substituição atual ao regime semiaberto. "A forma como o semiaberto é aplicado no Brasil é uma grande falácia", diz.
UOL - Passados dez anos do início do monitoramento eletrônico, hoje há uma difusão desse método de controle pelo país. Para o senhor, o sistema está consolidado ou há ainda deficiências?
Bruno Azevedo - Posso dizer que o sistema é um avanço, mas pode ser aprimorado um pouco mais. Por exemplo, no projeto que desenvolvemos, apresentamos dois tipos de tecnologia: essa que hoje em dia utilizamos, que batizamos de tornozeleira online. Há outra que nunca foi usada que é a tornozeleira domiciliar, com custo bem menor e capacidade de duração de bateria maior. Mas a tornozeleira representou uma primeira geração de monitoramento. Agora é hora de avançar para o chip. Isso representa um grande ganho para o reeducando.
Por que seria um ganho aos presos?
A prisão já nasceu como instrumento falido desde o seu princípio, mas ela é um mal necessário à nossa sociedade
Bruno Azevedo, juiz
Há algum estudo ou número que aponte para números positivos, como queda na reincidência, por exemplo?
Acredito que a experiência do monitoramento é extremamente positiva. Não é uma ferramenta para ser utilizada em todo e qualquer preso, mas naqueles que possam realmente dar provas de confiabilidade. No entanto, mesmo quando o preso a retira, ela acaba gerando uma prova cabal para o juiz de que aquele preso não é merecedor de oportunidades. E, sem a tornozeleira, ele acabaria indo para a rua de qualquer forma [após o cumprimento da pena].
Hoje vemos falta de tornozeleiras em alguns Estados. Falta investimento ou interesse das autoridades?
Mesmo com monitoramento e medidas alternativas, o número de presos só cresceu no país nesta década. O Brasil está errando na quantidade de encarceramentos?
O juiz brasileiro usa pouco punições ou medidas cautelares fora a prisão?
No tocante às medidas cautelares, elas ainda não pegaram, digamos assim. Se você olhar as várias decisões que determinam a privação da liberdade, via de regra não há uma valorização devida quanto à possibilidade das demais medidas cautelares. Se observar as medidas cautelares do artigo 319 do Código de Processo Penal, seis das nove só se efetivam com monitoramento eletrônico. Além do monitoramento, é necessário trabalhar outros conceitos, como a justiça restaurativa [de prevenção].
Outro fator que agrava a falência da prisão no nosso país é a falta de políticas públicas no setor. O Estado não investe em ressocialização, não investe na criação de vagas. A Lei de Execução Penal é de 1984, e até hoje só temos quatro presídios federais no Brasil, todos criados nos últimos dez anos.
Dá para dizer que monitorar presos é um caminho sem volta?
Sem dúvida é, sendo preciso evoluir para o chip eletrônico. Mas há outras coisas. Por exemplo, acredito que o sistema semiaberto poderia deixar de existir. Até porque a forma como ele é aplicado no Brasil é uma grande falácia.
A lei prevê que é uma forma de execução, mas, devido à falta de vagas, ao excesso da massa carcerária, acaba se dando um velho "jeitinho brasileiro". E o que seria esse jeitinho? Em via de regra, o preso passa o dia na rua e à noite volta para o sistema prisional. É assim que ele é executado Brasil afora, quando a lei prevê que ele deveria ficar em liberdade dentro dos muros do sistema prisional.
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