quinta-feira, 14 de julho de 2016

Comércio formal de maconha movimentaria R$ 5,7 bilhões no Brasil

Estudo de consultores da Câmara avalia impacto econômico da legalização



BRASÍLIA E RIO — A legalização da maconha no Brasil movimentaria, ao ano, R$ 5,7 bilhões, com perspectiva de gerar uma arrecadação tributária de R$ 5 bilhões, segundo estudo elaborado por profissionais da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. Com base em experiências internacionais e dados nacionais, a pesquisa estimou um público consumidor recreativo de cannabis de 2,7 milhões de pessoas no país. A projeção de receita considerou um mercado regulado, aos moldes do que fez o Uruguai, com limite máximo de compra de 40 gramas ao mês por usuário. No cenário traçado, os impostos cobrados do setor seriam os mesmos hoje aplicados à indústria do tabaco.

Com o título “Impacto Econômico da Legalização da Cannabis no Brasil”, o estudo estimou ainda que, além da arrecadação aos cofres públicos, haveria uma redução de R$ 997,3 milhões dos gastos anuais com o sistema prisional, depois que traficantes relacionados à maconha deixassem de ser encarcerados. Na segurança pública, no sistema judiciário e na rede de saúde, os consultores não encontraram evidências de que a medida diminuiria ou aumentaria despesas. Um dos autores do estudo, o consultor Pedro Garrido da Costa explica que as projeções foram traçadas com base em informações nem sempre completas:

— Há muitas lacunas em termos de estatísticas, mas reunimos a literatura e os números disponíveis para avaliar a medida do ponto de vista econômico. O estudo serve à Casa, mas também aos formuladores de políticas públicas, estudiosos do tema, ao público em geral — afirma Garrido.

A pesquisa considerou o preço de US$ 1,20 por grama de maconha, com base nos dados do Uruguai. Dessa forma, cada usuário frequente poderia gastar, segundo a cotação do dólar à época do estudo, de cerca de R$ 3,60, o total de R$ 2.073,60 por ano. Daí vem a receita movimentada apenas com a venda do produto e a estimativa de arrecadação da ordem de R$ 5 bilhões.


Num segundo cenário traçado pela pesquisa, com base no que ocorreu no Colorado (EUA), haveria um incremento de consumidores pós-liberação, que chegariam a 3,2 milhões de pessoas, responsáveis por gerar uma receita ao Estado estimada em R$ 5,9 bilhões. Para calcular a arrecadação, foram considerados cinco tributos federais e um estadual, cuja alíquota usada no levantamento foi a de São Paulo.





As conclusões do estudo dividiram a opinião dos parlamentares. Para o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), os dados de arrecadação trazidos pela pesquisa não devem justificar uma legalização da maconha. Ele considerou “equivocada” a afirmativa de que a liberação não trará impactos na área da saúde e apontou como indiscutíveis os danos causados pela maconha no cérebro:

— Não temos essa conta porque os danos são invisíveis e nem sempre tratados. O que precisamos é intensificar as campanhas de conscientização. Não adianta aumentar arrecadação às custas da saúde das pessoas.

Já o deputado Paulo Texeira (PT-SP) acredita que a legalização da maconha dentro de um mercado regulado, como no Uruguai, é uma boa saída para diminuição da violência associada à clandestinidade da venda de maconha.

— Esse estudo demonstra que temos que regular e usar o dinheiro para a segurança pública e sistema prisional.

Para especialistas da área, como Maria Lucia Karam, membro da Leap (aplicação da lei contra a proibição, na sigla em inglês), organização que defende o fim da guerra às drogas, o dinheiro arrecadado poderia ser utilizado, por exemplo, para investir em educação. Maria Lucia defende também que todas as drogas sejam legalizadas e não só a maconha.

— O impacto positivo não é apenas com a legalização da maconha, mas de todas as drogas. Primeiro, geraria impostos para o estado e depois economizaria nos enormes gastos que são feitos hoje nessa guerra às drogas. No Brasil, 28% estão presos por tráfico de drogas, quase um terço. São despesas enormes no sistema carcerário — argumenta Maria Lucia. — Há estados americanos que utilizam grande parte da renda gerada com a maconha legal para investir na educação e na saúde. Seria fundamental estabelecer que esses impostos de produção e venda de drogas legalizadas fossem investidos nesses campos.

Ela destaca que essa legalização, no entanto, deve seguir os moldes das demais drogas permitidas no país:

— Só para adultos, da mesma forma que as drogas já lícitas são reguladas. Assim como é com o álcool e o cigarro.

Para o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, Antônio Geraldo da Silva, os ganhos obtidos a partir de impostos sobre a maconha não justificam a legalização da droga:

— Trata-se do mesmo marketing aplicado com o cigarro, e hoje está provado que o gasto com o tratamento de doenças ligadas ao tabaco é de três a cinco vezes maior do que o arrecadado pelo Estado com a venda deste produto — destaca. — Não podemos levar em conta apenas o ganho direto e ignorar os danos à saúde. A maconha provoca enfermidades psiquiátricas irreversíveis, além de ser uma porta de entrada para outras drogas, como o crack.

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