Em casos excepcionais, a Justiça pode manter a sentença de condenação do acusado, mas dispensá-lo do cumprimento da pena. Tal possibilidade atende aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, também contemplados no instituto da dispensa da pena, previsto no artigo 74 do Código Penal português.
Com esta linha de entendimento, a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sulconfirmou a condenação de um pedreiro que tentou levar maconha ao filho internado numa instituição de menores em Porto Alegre. Entretanto, ele foi dispensado de cumprir as medidas restritivas de direito impostas na sentença. O homem foi condenado com base nas sanções do artigo 33, caput, combinado com o artigo 40, inciso III, ambos da Lei 11.343/2006 (Lei de Antidrogas).
Tantos os desembargadores, como o próprio procurador do Ministério Público no colegiado, Roberto Neumann, entenderam que, face às peculiaridades do caso, o mais acertado era aplicar ambos os princípios. Afinal, o homem confessou espontaneamente o crime, é trabalhador, não tem antecedentes e se envolveu no delito por pressão do filho, que é viciado. Além disso, tinha ficado quase 40 dias no Presídio Central de Porto Alegre, cumprindo prisão provisória.
O relator da Apelação, desembargador Jayme Weingartner Neto, disse que o instituto da dispensa da pena — embora sem previsão em regra específica do sistema penal brasileiro — está de acordo com os princípios que orientam nossa política criminal. Para isso, citou doutrina de Jorge de Figueiredo Dias.
“Do que se trata aqui é, na verdade, de comportamentos que integram todos os pressupostos da punibilidade — que constituem, isto é, ações ilícitas, típicas, culposas e puníveis —, mas não determinam a aplicação de qualquer pena (antes, só a declaração de que o agente é culpado) em virtude de seu caráter bagatelar, ligado à falta de carência de punição do fato concreto. Em casos tais, manda a lei que se não aplique uma pena, pura e simplesmente, porque ela não surge, perante as finalidades que deveria cumprir, como necessária.” O acórdão foi lavrado dia 27 de junho.
O caso
Em 8 de setembro de 2012, o pedreiro foi flagrado tentando entrar na Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (ex-Febem), de Porto Alegre, com uma porção de maconha para consumo de seu filho. A droga estava escondida na cueca, em três "tijolos". O homem teve a prisão preventiva decretada pela 10ª Vara Criminal da capital — baseada nas sanções do artigo 33, caput, combinado com o artigo 40, inciso III, ambos da Lei 11.343/2006 . Ficou preso de 8 de setembro a 17 de outubro, quando foi libertado graças a Habeas Corpus aceito no TJ-RS.
Ao proferir a sentença, a juíza Tania da Rosa disse que o fato da droga apreendida não se destinar à venda não impede a condenação pelo ilícito apontado no artigo 33, caput, da Lei de Drogas. Isso porque o simples fato de trazer o tóxico consigo, para entregá-lo ao consumo de outra pessoa, já caracteriza o tráfico, uma vez que o tipo penal abarca conteúdo variado. Ou seja, não é necessária a materialização de todas as condutas nele previstas para configurar o fato.
Assim, o réu foi condenado à pena de um ano, 11 meses e 10 dias de reclusão. Na dosimetria, a pena foi substituída por duas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços comunitários e ao pagamento de um salário-mínimo destinado à entidade social. Além disso, o pedreiro foi multado em 194 dias-multa.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 5 de agosto de 2013
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