Punições para crimes sexuais cometidos por soldados não estão previstas em legislação recém-aprovada.
A morte da estudante indiana de 23 anos que sofreu um estupro coletivo em Nova Délhi, em dezembro, causou protestos na Índia, além de uma mudança na lei que pune crimes sexuais no país. No entanto, analistas afirmam que três pontos considerados importantes não foram alterados, o que prova, segundo a advogada Duhita Lewis, de Mumbai, que é preciso haver uma mudança cultural entre os indianos, não apenas uma alteração legislativa.
"A maneira com que as mulheres são tratadas (na Índia) está tão enraizada na cultura que elas próprias se veem como inferiores aos homens. A menos que a sociedade, que engloba integrantes do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, entenda que crimes sexuais são atos de violência e não apenas um ultraje, o problema continuará."
De acordo com o National Crime Records Bureau, Nova Délhi tem o maior número de crimes sexuais na Índia. Em 2011, 568 casos foram registrados na cidade, mas o número de ocorrências pode ser maior, já que muitos casos não são relatados.
A nova lei, sancionada no dia 3, ignorou sugestões de uma comissão formada por juristas indianos e não aborda casos de estupro matrimonial. "Esse país é regido por uma cultura patriarcal, na qual a mulher é vista como um objeto para agradar o marido em casa, o que, de certa forma, exclui a possibilidade de trazer o estupro conjugal para o âmbito do direito penal", afirmou Duhita.
Além disso, políticos que enfrentam acusações de crimes sexuais não perdem seus cargos ou direitos políticos e a violência sexual cometida por integrantes das Forças Armadas não está incluída na legislação. Segundo Duhita, a comissão propôs que os militares fossem julgados sob a lei civil.
"Esses dois pontos são (possíveis) alterações muito distantes, considerando a falta de respeito com a mulher", disse a especialista. "O que vemos é a corrupção permitindo que esses políticos prosperem, com votos do povo sem informação, e a distorção da imagem dos integrantes das Forças Armadas."
A principal mudança na legislação contra crimes sexuais na Índia está na pena para os casos de estupro: um aumento da pena máxima de prisão para 20 anos e a possibilidade de pena de morte em casos em que as vítimas morram ou fiquem em coma em virtude da agressão.
No caso da estudante de 23 anos, cinco homens foram acusados pela Justiça e devem ter a pena capital pedida pelo promotor do caso, Rajiv Mohan.
Para Duhita, essas mudanças são um passo importante na sociedade indiana. "As alterações tiram o poder do tribunal de reduzir a pena. Acabam sendo uma proteção contra arbitrariedade na definição da sentença."
O professor de direito internacional, David Crane, da Syracuse University College of Law, considera "imprescindível" a mudança na legislação indiana, mas lembra que, além da alteração legislativa, o respeito aos direitos humanos, incluindo a igualdade de gêneros, é um pré-requisito para sociedades modernas.
"A mudança na legislação pode ser um indício de que as autoridades estão se conscientizando de quão problemático e embaraçoso isso é para a democracia da Índia. E se a Índia quiser seguir adiante como uma democracia no século 21, terá de rever a forma como as mulheres são vistas e tratá-las como iguais perante a lei, a cultura e a sociedade."
FERNANDA SIMAS - O Estado de S.Paulo
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