A primeira impressão é a que fica. Essa é a frase lapidar, muito conhecida, pouco valorizada, que todo advogado criminalista deveria inscrever a ferro e fogo em sua própria mente. Não apenas por causa do marketing pessoal. Primeiras impressões são essenciais para o sucesso no Tribunal do Júri, porque ficam definitivamente marcadas nas mentes dos jurados. Há provas científicas. "São quase impossíveis de reverter ou de desfazer", diz o site de Psicologia Mind Tools.
A primeira impressão pode ser decisiva, por exemplo, na inquirição direta de testemunhas, especialmente quando o inquirido é o próprio réu. O advogado pode criar ou destruir a credibilidade da testemunha com a escolha de suas perguntas iniciais. As respostas às primeiras perguntas podem resultar em boa ou má impressão que os jurados terão da testemunha — e das quais não conseguirão se livrar, por mais que os fatos indiquem um caminho diferente na sequência.
Para exemplificar, o advogado e professor de Direito Elliott Wilcox relata o que ocorreu em um julgamento em que a defesa considerou que o testemunho do réu era importante para ganhar o caso. Um traficante fora acusado de vender drogas a um agente federal disfarçado, com a intermediação do réu, segundo a Promotoria. A defesa estava certa de que poderia demonstrar a inocência do réu na transação, bem como que alguns fatos foram distorcidos e algumas declarações foram mal interpretadas. E, por fim, que o traficante agiu de forma totalmente independente quando vendeu cocaína ao agente federal.
O advogado também sabia que o caso tinha alguns pontos fracos e decidiu esclarecê-los para os jurados desde logo. Essa é uma técnica da inquirição direta. Se a defesa deixa de mencionar problemas do réu na inquirição direta, quando ele serve de testemunha, o promotor pode fazer um estrago na inquirição cruzada, porque não deixará de fazer as perguntas comprometedoras. Mas se a defesa discute o problema com o réu na inquirição direta, esvazia a força destruidora da inquirição cruzada. Se o promotor voltar a fazer as mesmas perguntas, estará perguntando o que já foi perguntado e produzirá um sentimento de desconforto nos jurados, que podem nem levar a sério sua inquirição.
Os problemas do réu que precisavam ser esclarecidos por seu advogado — antes que o fossem pelo promotor — eram esses: ele estava desempregado há dez anos, por causa de um problema físico, e já fora condenado três vezes por crimes diferentes e sem relação com o caso. O advogado o fez, mas no pior momento: no início da inquirição, quando a primeira impressão é criada. Foi assim:
Advogado: Onde o senhor trabalha?
Réu: Não trabalho há dez anos, por causa de meu problema físico.
Advogado: O senhor já foi preso alguma vez?
Réu: Sim.
Advogado: Quantas vezes?
Réu: Três vezes.
Entende-se que, depois que essa primeira má impressão é registrada na mente dos jurados, todas as perguntas e respostas subsequentes não ajudariam o réu. Isso porque as respostas do réu são reconstruídas nas mentes dos jurados, de acordo com o que ficou registrado na impressão inicial. Assim:
Advogado: O senhor conhecia Archie (o traficante)?
Réu: Sim. O filho dele e meu filho estudam na mesma escola.
Registro na mente do jurado: desempregado e três vezes condenado era conhecido do traficante.
Advogado: O senhor frequentava a casa de Archie?
Réu: Não. Nunca fui à casa dele.
Registro na mente do jurado: desempregado e três vezes condenado diz que não frequentava a casa do traficante.
Assim, os pontos fracos do depoimento do réu só devem vir à tona depois que a credibilidade do réu é instituída. A partir daí, suas respostas, mesmo as mais difíceis, podem até "cair bem", como demonstração de sinceridade. De qualquer forma, o que permanece na mente dos jurados é a impressão inicial. Se ela foi boa, o que vier depois, bom ou ruim, não terá tanta influência na formação de seu conceito sobre o réu.
O escritor Ted Simendinger, especializado em formação de líderes, diz que as evidências científicas são virtualmente unânimes na constatação de que as pessoas confiam muito mais em suas opiniões iniciais do que em qualquer informação posterior, "porque o que vemos primeiro representa a verdade". Por isso, diz ele, "impressões são formadas rapidamente e mudadas lentamente". Não importa se é justo ou não. O que importa é que esse processo faz parte da natureza humana.
As impressões iniciais se estendem muito além do relato e da acumulação dos fatos, ele diz. Primeiras impressões são difíceis de apagar porque, uma vez formadas, as pessoas não se esforçam — nem querem se esforçar — para mudá-las. "O que buscamos, depois de formar a primeira impressão, são informações que as validem, não que as contrariem. Como encontramos na vida o que buscamos, tendemos a encontrar essa validação. O processo de mudança é muito mais lento", afirma.
Um estudo do Departamento de Psicologia da Universidade de Nova York mostrou que as primeiras impressões são feitas em duas regiões do cérebro. As primeiras impressões chegam primeiro às amígdalas — não as da garganta, mas as do cérebro, a mesma região que processa o instinto de sobrevivência. As amígdalas podem identificar quase que instantaneamente o que é seguro e o que é perigoso. Em seguida, a informação é passada para a outra região, o neocórtex, que a processa.
Se a pessoa evita um acidente por uma reação rápida, isso é um trabalho da amígdala — e essa sensação permanece no cérebro por um longo tempo. E não há raciocínio lógico que a apague, tão facilmente. O mesmo processo ocorre quando uma pessoa tem um primeiro contato com qualquer outra pessoa: as primeiras impressões são processadas no eixo amígdalas-neocórtex. Raciocínios lógicos não as conseguem apagar rapidamente. Se conseguem, o fazem apenas parcialmente, para determinadas circunstâncias.
Por isso, a primeira impressão, a primeira imagem, a primeira frase são importantes, quando se há que lidar com jurados. Na inquirição direta, trabalhar a primeira impressão é fundamental. Mas cada coisa tem seu lugar. Na alegação inicial, o que fica na mente dos jurados é a frase inicial — a que abre a história que o advogado (ou promotor) vai contar aos jurados. Na alegação final, a frase de abertura também é importante, mas o advogado pode comentar um ou mais pontos fracos do caso logo de início, para usar, em seguida, o poder das conjunções adversativas: "O réu está desempregado, já foi condenado três vezes por outros tipos de crime, mas, apesar disso...".
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 15 de fevereiro de 2013
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