Nos Estados Unidos, a maconha assumiu um novo papel: o de pomo da discórdia entre o governo federal e os governos estaduais. A legalização da maconha já foi aprovada por 17 dos 50 estados do país, por um motivo ou outro. A Califórnia abriu o caminho. Agora, três outros estados estão na fila: Washington, Oregon e Colorado. Mas o governo federal ameaça dar trabalho a eles, como já vem fazendo com os estados que saíram na frente.
O estado de Washington se convenceu de que deve descriminalizar a maconha não com base em fundamentos médicos ou jurídicos, mas com uma razoável sustentação econômica. A legalização da maconha vai render aos cofres estaduais pelo menos US$ 2 bilhões em tributos, nos primeiros cinco anos, de acordo com o órgão de administração financeira do estado. As informações são do San Francisco Chronicle, com a agência Associated Press (AP).
As contas já foram feitas. O estado licenciaria 100 plantadores de maconha, que forneceriam o produto a 328 lojas especializadas. As lojas venderiam 187 mil libras (quase 85 mil quilos) da maconha a 363 mil usuários — números que foram obtidos em levantamentos do governo federal sobre usuários de drogas.
Os consumidores pagariam US$ 12 por grama, um preço que já é pago por usuários de maconha para fins medicinais em outros estados. Seria criado um "imposto da maconha", com alíquota de 25%. Além disso, haveria um imposto sobre circulação de mercadorias, de 10%, além de possíveis impostos municipais, de acordo com especialistas em tributação.
Mas as vantagens financeiras não acabariam aí. Todo o sistema envolvido no combate ao tráfico e uso da maconha, no Executivo e no Judiciário, seria desativado. Haveria uma grande economia com o fim de investigações policiais, prisões e processos judiciais contra traficantes e usuários de maconha. Além disso, todos os custos de manter os condenados nas prisões seriam eliminados. Cerca de 10 mil pessoas são processadas só pelo uso de maconha, todos os anos.
Entretanto, como nem tudo é perfeito, o estado lamenta que, em contrapartida, vai perder algum dinheiro, ao deixar de receber verbas do DEA (Drug Enforcement Administration), destinadas ao combate do tráfico e do uso de maconha.
Aparentemente o governo estadual não está preocupado em discutir aspectos medicinais, jurídicos, religiosos ou morais aos eleitores, que vão votar contra ou a favor de um projeto de lei que já está pronto em novembro, durante as eleições gerais. Mas está apresentando um argumento que pode agradá-los: todo o dinheiro arrecadado será aplicado na educação, na saúde e na prevenção do abuso de substâncias.
O governo estadual está mais preocupado com as reações do governo federal. O Departamento de Justiça, que pode acionar o FBI, ou DEA e outros órgãos policiais, pode, por exemplo, prender e processar os empregados das lojas licenciadas pelo estado, mover ação judicial em tribunais federais para impedir que a legislação estadual entre em efeito ou, simplesmente, confiscar todas as receitas tributárias do estado, por considerá-las um rendimento de transações consideradas ilegais pela legislação federal.
O governo federal pressiona, por meio de seus órgãos de repressão ao tráfico e uso de drogas, todos os estados que já descriminalizaram a maconha, onde encontra brechas para fazê-lo. Em Nevada, por exemplo, a lei permite a pessoas portadoras do cartão de usuário plantar maconha em suas propriedades, para seu próprio consumo. Mas a lei é vaga e não descriminaliza claramente a compra de sementes de maconha para o plantio.
"Isso quer dizer que a pessoa primeiro tem de cometer um crime, que é a compra ilegal da semente, para depois poder exercer o seu direito legal de plantar e consumir maconha", diz o advogado Robert Draskovich, que defende alguns dos distribuidores de maconha que foram presos no estado, conforme noticiou a revista Consultor Jurídico em setembro do ano passado.
Os eleitores e Oregon e Colorado também terão de se manifestar nas eleições de novembro. Em Washington, o projeto de lei apresenta a justificativa de que o desenvolvimento do mercado de maconha vai substituir o atual mercado ilícito, eliminar atividades criminais que lhe são inerentes e gerar receitas tributárias. O projeto propõe liberar a venda a maiores de 21 anos de 1 onça (28 gramas) de maconha seca, 1 libra (454 gramas) de produto com infusão de maconha em forma sólida (como em barras de chocolate) ou 72 onças (2 quilos) em forma líquida com infusão de maconha.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 16 de agosto de 2012
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