quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Zaffaroni defende contenção do poder punitivo


O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais abriu, nesta terça-feira (28/8), seu 18º Seminário Internacional de Ciências Criminais com dois olhares estrangeiros sobre o Direito. A primeira palestra do dia foi do ministro da Suprema Corte argentina Raul Zaffaroni, que defendeu a criação de uma “dogmática de contenção do poder punitivo”.
“Temos de fazer um filtro do poder punitivo. A nossa função é de Cruz Vermelha. Não podemos evitar a guerra”, afirmou. Para o professor da Universidade de Buenos Aires, o mundo atual vive numa espécie de adoração cega pela punição, como se ela fosse capaz de resolver todos os problemas contemporâneos, da economia ao meio ambiente. “O poder punitivo virou um ídolo, que como religião falsa, tem os seus fanáticos”.
Em sua palestra, Zaffaroni fez críticas duras à imprensa e considerou-a em parte responsável pelo clima “paranoico” que existe na sociedade contemporânea. “A mídia está criando uma sociedade paranoica. E o único criminoso que vemos é o garoto da favela.”
Chamou atenção para um assunto ao qual tem se dedicado a estudar: o pensamento jurídico na Alemanha pré-Segunda Guerra e sua influência na América Latina. “Estamos importando doutrinas que provinham de Estados legais de Direito sem controle de constitucionalidade”.
Um tópico que o deixa particularmente intrigado refere-se à atuaçao da comunidade jurídica no período do nazismo. “Não está muito esclarecido para nós o que aconteceu com o saber jurídico entre 1933 e 1945”, quando Hitler esteve no poder. Segundo o professor, o neokantianismo, com o discurso de fornecer uma construção neutra e vazia, serviu de base para o preenchimento das ideias nazistas. “A corporação judiciária de Waimar foi a primeira inimiga da República de Waimar e passou de 33 a 45 sem perceber os milhões de mortos”, afirmou.
Apesar de concentrar sua crítica nas ideias conservadoras e de extrema-direita, Zaffaroni também abriu fogo sobre a base marxista do pensamento da esquerda. “A esquerda arrasta aquela moral marxista que não é muito diferente da moral conservadora. O proletariado sadio tem que ser salvo do proletariado sujo e isso deu no stalinismo”.
No fim de sua palesta, Zaffaroni deixou uma questão no ar: "Estamos em condições de defender, no Direito Penal, os limites do poder punitivo no momento em que o poder punitivo está ameaçando os Direitos Humanos no mundo todo?"
Acordos e Rogatórias
Já o advogado americano Bruce Zagaris tratou sobre cooperação internacional em matéria penal entre Brasil e Estados Unidos e abordou as diferenças entre a carta rogatória e os MLats (Mutual Legal Assistance Treaty ou Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal). Ele defendeu os tratados como mecanismo mais eficaz do que as cartas rogatórias. “As cortes americanas levarão mais seriamente um pedido feito com base num acordo de cooperação mútua do que numa carta rogatória”, diz.

Segundo Zagaris, os tribunais atendem aos pedidos de carta rogatória “por questão de cortesia”. Nos tratados, a cooperação é obrigatória. Entre as vantagens dos tratados, ele elencou a possibilidade de requerer documentos, registros, sequestro e confisco de bens e oitivas.
Disse também que, com a adoção de tratados, a burocracia é menor, o que resulta num tempo mais curto para a efetivação dos pedidos. Na carta rogatória, o pedido do tribunal é enviado ao Ministério da Justiça local, que reenvia a solicitação ao seu congênere do outro país, e só depois disso a solicitação chega ao outro tribunal. “Por mais que eu queria essa prova no Brasil não posso espera 18 meses. Ainda mais que a prova admitida no Brasil talvez não seja a mesma que a dos EUA.”
Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 29 de agosto de 2012

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