09/05/12
A representante da Universidade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro, Tayssa Marins de Oliveira Sato, defendeu, na audiência pública sobre Lei Seca, a necessidade de outros meios de prova da embriaguez e de mais políticas públicas nos diversos estados voltadas para a prevenção dos problemas de trânsito causados pelo álcool. Ela chamou a atenção para a mudança do critério para a responsabilização criminal (artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro) – concentração maior ou igual a seis decigramas de álcool no sangue, em que o condutor é punido com seis meses a três anos de detenção, multa e suspensão da carteira de habilitação.
Para a expositora, não se devem admitir critérios absolutos na definição dos crimes. Assim, o artigo 306 do CTB não pode ser interpretado apenas pelo limite de concentração alcoólica, mas também especificar sua efetiva potencialidade lesiva. “Se o motorista estiver dentro dessa faixa, será detido e responderá a processo criminal sem que haja outros meios de prova da suposta embriaguez”, assinalou.
A representante da Cândido Mendes ressaltou que não defende a impunidade, e sim do uso da proporcionalidade e da razoabilidade. “O álcool tem diversos efeitos em diversos organismos, causando embriaguez ou não, e não precisamos de nenhum estudo aprofundado para sabermos disso”, afirmou. “A prova da embriaguez, porém, deve ser eficaz e robusta”.
Segundo a expositora, o papel do Direito Penal é punir, e não prevenir ou educar. Por isso, defende o reforço de políticas públicas – entre elas a melhoria dos transportes públicos, principalmente de madrugada, e ações como a Operação Lei Seca, realizada no Rio de Janeiro. E propõe que essas operações forneçam aos cidadãos outros meios de prova além do bafômetro, como teste psicomotor e a presença de peritos e médicos. “A Lei Seca, as políticas públicas, em conjunto com o Judiciário, e a conscientização da população salvam vidas, mas devem ser aplicadas com razoabilidade e proporcionalidade”, concluiu.
Produção de provas
O advogado e professor Rogério Taffarello, que falou em nome do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), abordou a questão a partir de sua preocupação com a redação do artigo 5º, inciso IV, da Lei Seca. O dispositivo alterou o artigo 277 do CTB, que passou a prever, no parágrafo 3º, a aplicação de penalidades e medidas administrativas aos condutores que se recusarem a se submeter aos testes de alcoolemia (bafômetro).
Para o especialista, a redação do parágrafo foi “extremamente infeliz” ao impor sanções (multa e suspensão da CNH) ao cidadão que se submeta ao bafômetro. “A Constituição garante, no inciso LXIII do artigo 5º, o direito ao silêncio, corolário do direito de não constituir prova contra si, por sua vez corolário do princípio da dignidade da pessoa humana”, observou.
Taffarello observou que é comum que as pessoas se identifiquem com as vítimas de delitos, mas é necessário também que se coloquem na posição de potenciais investigados e suspeitos. “Todos nós, uma hora ou outra, podemos nos ver diante da espada do Direito Criminal, a forma mais violenta de intervenção do Estado na liberdade individual dos cidadãos”, assinalou. “Estamos falando de direitos que são de todos nós.”
Na visão do especialista, não é possível que o exercício de um direito ou garantia fundamental por parte do cidadão resulte em qualquer tipo de punição, seja administrativa ou criminal. “Não pode haver um automatismo de punição para aquele que simplesmente argumentar ou recorrer ao exercício de um direito constitucional”, afirmou, lembrando episódios de abusos oficiais cometidos nas ações policiais e vícios de consentimento no uso do bafômetro. “O Judiciário deve estar atento a isso, sem prejuízo da preocupação de todos nós quanto à efetividade da lei”.
Encerrando, Taffarello disse acreditar que o déficit não é de mais endurecimento da legislação, mas de fiscalização. “Quanto mais fiscalização tenhamos, menores serão os índices de acidente”, afirmou, citando os exemplos “eloquentes” do Rio de Janeiro e do Distrito Federal apresentados nas exposições anteriores. “Para isso não é necessário uma Lei Seca que amesquinhe uma garantia fundamental tão importante quanto o direito de não produzir prova contra si mesmo”, concluiu.
Fonte: STJ
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