A comissão de juristas que trabalha na reforma do Código Penal aprovou duas propostas que prometem dificultar a libertação prematura de indivíduos condenados a longos períodos de prisão, como é o caso de criminosos que mataram ou estupraram várias pessoas.
Se o texto passar pelo Congresso e pela Presidência da República como está, a pena total para esses criminosos refletirá o número exato de vítimas e servirá como base única para o cálculo de benefícios como a progressão de regime. Com isso, ficará mais difícil para esses criminosos sair da prisão antes de ter cumprido a pena de 30 anos.
Antes de virar lei, no entanto, as propostas da comissão deverão percorrer um longo caminho. Os juristas, que trabalham desde o ano passado no assunto, deverão entregar o anteprojeto do Código Penal em junho. Ele, então, passará pelo Senado e pela Câmara, antes de ir à sanção presidencial.
Caso vença essas etapas, evitará que episódios como o do policial Paulo Roberto Alvarenga se repitam. Alvarenga foi um dos PMs acusados de assassinar 21 moradores da favela de Vigário Geral, no Rio de Janeiro, em 1993. Mesmo condenado a 449 anos, ficou preso apenas cinco.
A chacina de Vigário Geral teve repercussão nacional. Alvarenga foi encarcerado em 1997 e se tornou o primeiro PM julgado pelo crime. Cinco anos depois, foi libertado por se beneficiar de brechas existentes na legislação.
Uma delas brechas — que a comissão de juristas pretende abolir — foi introduzida no Código Penal em 1984. Por conta dela, crimes cometidos com violência podem ser considerados “crimes continuados”, isto é, vistos como um único ato criminoso. Assim, se um indivíduo mata 21 pessoas , o juiz pode entender que se trata de um único crime, podendo, no máximo, triplicar sua pena.
Na prática, isso quer dizer que, em vez de condená-lo pela morte de 21 pessoas, o assassino paga, no máximo, por três. Foi isso que o Supremo Tribunal Federal entendeu em 1998, quando reduziu a condenação de Alvarenga de 449 para 57 anos.
A decisão da comissão de acabar com o “crime continuado” vem acompanhada de uma proposta sobre o cálculo de benefícios carcerários. A ideia é que ele seja feito sobre o tempo total da pena. Se um criminoso for condenado a 300 anos, pode ter direito à progressão de regime ao completar 50 anos de prisão (um sexto do total). Como ninguém fica na cadeia mais de 30, na prática, isso significa que o condenado passará toda a pena preso.
Atualmente, há juízes que adotam essa interpretação, mas outros preferem fazer o cálculo em cima dos 30 anos. No caso de Vigário Geral, tanto faz ser condenado a 449 ou a 57 anos já que o direito à progressão de regime se dá depois de cinco anos (um sexto da pena máxima de 30 anos).
Fonte: O Globo
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