A Campanha CUMPRA-SE é um esforço cidadão de indivíduos, coletivos, entidades e movimentos sociais, para que a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIntDH) sobre a questão da Guerrilha do Araguaia seja cumprida integralmente, visando a afirmação dos Direitos Humanos no Brasil e o respeito à jurisprudência e à jurisdição internacional da CIntDH expressa em nossa constituição.
A chamada Guerrilha do Araguaia, composta por militantes do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), tinha por objetivo realizar uma revolução socialista partindo do campo e foi duramente reprimida pelo Exército brasileiro, sob o governo da ditadura civil-militar. Na época, as ações militares de repressão foram escondidas do resto do país por uma cortina de censura, que impedia a divulgação de qualquer informação sobre a guerra que ocorria no sudeste do estado do Pará.
Em 2003 a Justiça brasileira expediu uma sentença na qual condenava o Estado a abrir os arquivos das Forças Armadas para informar, em 120 dias, o local do sepultamento desses militantes. Porém o governo, a época recorreu contra a Justiça, visando não cumprir a lei, apresentando todos os recursos possíveis. Em 2007 esgotaram-se os recursos legais, resultando na condenação.
[1]
Por causa da demora, desde 1995 os familiares dos militantes desaparecidos recorreram à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que considerou o Brasil responsável pelas violações perpetradas contra os membros da Guerrilha do Araguaia e, encaminhou o caso para a Corte Interamericana.
O processo na OEA reconheceu tanto a responsabilidade do governo brasileiro da época pelo desaparecimento forçado das vítimas quanto a situação de impunidade e a falta de transparência em relação a esses crimes. Como signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, o Brasil tem de acatar decisões da Corte.
Em 14 de dezembro de 2010, o Brasil foi condenado pela CIntDH por violação ao direito ao reconhecimento da personalidade jurídica, à vida, à integridade, à liberdade, às garantias e proteção judiciais, à liberdade de pensamento e expressão, em razão da detenção arbitrária, tortura e desaparecimento de 70 membros do Partido Comunista do Brasil e de camponeses da região do Araguaia no período de 1972 a 1975. Em decorrência dessa responsabilização, a Corte condenou o Estado brasileiro a reparar as vítimas diretas e a sociedade em geral por meio da investigação penal e da aplicação das sanções aos indivíduos responsáveis pelos crimes, da localização do paradeiro dos restos mortais dos desaparecidos e da revelação de toda a verdade relativa ao caso, do oferecimento de assistência médica e psicológica aos familiares, da realização de um ato público de reconhecimento de sua responsabilidade internacional, da capacitação de sua Força Armada acerca dos Direitos Humanos e da tipificação do desaparecimento forçado de pessoas como crime em sua legislação penal.
[2]
Tal sentença veio contrariar o posicionamento do Supremo, reafirmado - em abril de 2010, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por 7 votos a 2, declarar a constitucionalidade da Lei de Anistia ao decidir uma ação ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil.
Apesar da desaprovação de alguns, o governo informou no dia 15 de dezembro de 2010 que cumpriria “sem hesitação” a sentença da CIntDH, esclarecendo que a medida não comportaria recurso e não seria contestada politicamente pelo governo.
O Estado continua a não cumprir a decisão e tampouco a sentença de 2007, transitada em julgado, isto é, sentença final da Justiça brasileira, nem a sentença do ano passado da Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Dessa maneira, conforme bem colocado no Editorial do nosso Boletim em fevereiro de 2011:
“ O Brasil, um país que se pretende democrático, portanto transparente e garantidor de direitos, que desponta no cenário internacional como grande potência em desenvolvimento, não pode lidar com seus acontecimentos relativos aos Direitos Humanos de maneira covarde como vem fazendo. É notório que o desaparecimento das 70 pessoas aconteceu, e que os restos mortais não foram entregues aos seus familiares, bem como os fatos envoltos a essa situação não foram revelados, e que, ao longo dos últimos 30 anos, o Brasil também não empreendeu esforços suficientes para resolver e reparar esses casos – por isso sua postura face a isso deveria ser de responsabilidade, como se espera de um Estado maduro, e não de alegações defensivas como fez durante o processo perante a CIntDH. Resta agora aguardar e cobrar para que o Estado brasileiro cumpra sua responsabilidade internacional de dar cumprimento à sentença da Corte, e que suas autoridades políticas compreendam que somente assim o País se qualificará e se afirmará para ser a potência da qual seus cidadãos terão orgulho.”
(Janaina Soares Gallo)
Para conhecer a Cumpra-se não deixe de conferir o site oficial.
[1] Responsabilidade internacional por violações de direitos humanos: a condenação do brasil no caso da guerrilha do Araguaia.
In Boletim IBCCRIM. São Paulo : IBCCRIM, ano 19, n. 219, p. 01-02, fev., 2011.