O Tribunal de Justiça de São Paulo reduziu em três anos e meio a pena imposta a um homem acusado de estupro com violência presumida. O crime resultou na gravidez da vítima, na época com 15 anos. A garota sofria de retardamento mental moderado. O réu era motorista da perua que a transportava todos os dias à escola com sala para crianças especiais.
O crime ocorreu no município de Itanhaém, no litoral paulista. Exame de DNA feito por peritos do Imesp (Instituto de Medicina Social e Criminologia de São Paulo) aponta com 99,9% de certeza que a menina gerada pelo estupro é filha do acusado. A vítima tem hoje 21 anos. O processo corre em segredo de Justiça.
A chamada violência presumida acontece quando o ato é praticado em pessoas sem capacidade de discernimento e, portanto, sem condição de manifestar uma vontade livre. Antes da Lei 12.015/09, a violência presumida estava prevista no artigo 224 do Código Penal. Com a nova norma, esse gênero de violência ganhou tipo penal próprio no artigo 217-A, configurando o que se chama de estupro de vulnerável.
O réu foi condenado, em primeira instância, a 10 anos e seis meses de reclusão, em regime inicial fechado. Ao dosar o castigo, o juiz, além da pena base para o crime de estupro e mais um sexto pela continuidade do delito, aplicou como causa de aumento o artigo 9º da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/90) acrescentando metade a sanção imposta ao acusado.
Insatisfeita, a defesa recorreu ao Tribunal de Justiça. Pediu a reforma da sentença. Buscou em primeiro lugar a absolvição de seu cliente com a alegação de que nunca houve violência real e de que a vítima era portadora de retardo mental leve sendo, por isso, estando em condições de consentir livremente na relação sexual. Como alternativa, o advogado pediu à turma julgadora a redução da pena, que considerava exagerada.
O TJ paulista entendeu que a absolvição do réu era medida inviável. No entanto, considerou que a redução da pena encontrava amparo legal. Para o desembargador Tristão Ribeiro, relator do recurso, os laudos médicos, a palavra da vítima e os depoimentos das testemunhas formavam um conjunto de provas a incriminar o acusado e o retardo mental da garota ficou comprovado, assim como a paternidade da criança gerada com o estupro.
“Evidente a incapacidade de consentir livremente quanto às relações sexuais, o que caracteriza a vulnerabilidade dela [vítima] que, ao tempo dos fatos, era considerada pela legislação a título de violência presumida, não convence as alegações defensivas em sentido contrário”, destacou o desembargador Tristão Ribeiro.
De acordo com a denúncia, em dois dias consecutivos em que não houve aula, o réu teria abusado sexualmente da garota. Na primeira vez, a levou a um motel e, na segunda, à praia. Ainda segundo a acusação, depois de abusar da menina a ameaçou de morte no caso dela contar o que havia ocorrido.
Ele nega o crime. De acordo com a defesa, a garota tinha consciência e discernimento sobre a vida sexual, não sendo possível ser abusada como alega o Ministério Público. “É certo que a condutra do réu é moralmente reprovável”, reconheceu seu advogado. “Todavia entender que agiu com dolo característico de estupro é afastar-se integralmente das provas”, completou.
O relator entendeu ser impossível a adoção da tese da defesa de atipicidade uma vez que o réu sequer alegou ter mantido relacionamento amoroso consensual com a garota. Além disso, acrescentou Tristão Ribeiro, a vítima relatou a grave ameaça feita pelo réu, sendo a condenação de rigor.
O desembargador, no entanto, considerou que a causa do aumento da pena prevista na Lei dos Crimes Hediondos deveria ser afastada, pois só incide nas hipóteses em que a violência resulta em lesão grave ou na morte da vítima.
O relator aplicou a pena base, de seis anos, acrescida do aumento de um sexto pela continuidade do delito. Ou seja, sete anos de reclusão. O réu, se for primário, tem direito à progressão de regime após o cumprimento de dois quintos do castigo. Caso seja reincidente, o benefício só será aplicado depois de três quintos da pena.
Apelação 990.10 266244-6
Revista Consultor Jurídico, 21 de janeiro de 2011
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