Nos últimos dias, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, fez um pequeno tour pela imprensa. O objetivo era explicar como funciona o direito de defesa e os males da sanha punitivista, além de relembrar que o Brasil já teve diversos casos de heróis de cera da Justiça — no final, sempre derretem e não ajudam no avanço das instituições.
Nesta quinta-feira (27/6), o jornal O Estado de S. Paulo publicou entrevista com Gilmar. O ministro propôs uma autocrítica da imprensa, que está sempre ansiosa em eleger o justiceiro da vez. Falou do procurador Luiz Francisco e do delegado Protógenes Queiroz, mas poderia ter citado, como usualmente faz, Fausto de Sanctis, Joaquim Barbosa e Eliana Calmon.
"A mídia em algum momento transforma [alguém] em herói e, quando se revela a sua inconsistência, ela lhe dá um enterro silencioso. Se a mídia já tivesse feito um exame, talvez a gente não tivesse de conviver com esses falsos heróis da atualidade. Em geral, não têm vida longa. O cemitério está cheio desses falsos heróis", disse.
Esse ato de insuflar heróis que vestem a capa e vão atrás de resolver, por seus próprios métodos, os problemas do Brasil "estimulou muito esse jogo de espertezas institucionais", lembra o ministro. Gilmar ressalta que a própria ideia de "força-tarefa" já é uma ideia distorcida ("por que não operar com as próprias pessoas que lá estão?").
Porém, o ministro acredita que um saldo positivo resultará dos tropeços. "Acho que vamos ter uma grande evolução e um grande aprendizado a partir desses episódios. Todos nós vamos ficar mais preparados, e a própria legislação que virá em decorrência desses fatos todos será muito mais realista e talvez mais precisa, evitando essa discricionariedade abusiva."
Questionado, Gilmar diz não ter colocado Sergio Moro na lista dos falsos heróis. Mas afirma que analisar uma possível parcialidade do ex-juiz não ameaça a investigação de corrupção.
"O que ameaça qualquer operação policial é o serviço malfeito. Qualquer operação que é mal inspirada ou sem base jurídica acaba sendo uma ameaça. Por isso que se recomenda modéstia, cautela, cuidado", disse.
Conversas não ortodoxas
Outra entrevista de Gilmar Mendes foi ao canal Globo News na noite desta quarta-feira (26/6). Nela o ministro foi enfático: caso sejam reais, as conversas entre Sergio Moro e os procuradores da "lava jato" não são normais e podem gerar nulidade das condenações do ex-presidente Lula.
“Essas conversas de consulta entre promotor e juiz, dessa maneira, não existem. O Brasil normalizou os absurdos, mas não vamos normalizar isso. Não é normal esse tipo de consulta. Se vocês me perguntarem: existe? Sim, claro. Isso de alguma forma se estruturou, mas não é correto. Se as conversas aconteceram de fato, elas não são ortodoxas. O juiz não pode aconselhar a parte.”
E finalizou: "O grande embaraço diante desse caso é que se está diante de uma possível comprovação de uma parceria [entre Moro e Dallagnol]".
Fernando Martines é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 27 de junho de 2019.
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