A ação penal pública incondicionada não é cabível em qualquer crime de estupro de vulnerável. De acordo com decisão da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, nos casos em que a pessoa está desmaiada — é incapaz de oferecer resistência apenas na ocasião da ocorrência dos atos libidinosos — a ação penal permanece condicionada à representação da vítima.
No caso, uma mulher desmaiou após ser agredida por um homem. Enquanto estava desmaiada ela foi vítima de estupro. Apesar do ocorrido, ela não ofereceu representação contra o homem. O Ministério Público apresentou denúncia com base no artigo 217-A, parágrafo 1º — estupro de vulnerável.
O homem — que confessou o crime durante as investigações — foi condenado em primeira instância e a decisão mantida pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. A defesa do réu então, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça alegando que a ação era nula pois não houve nenhuma representação por parte da vítima.
De acordo com a defesa do réu, embora a vítima estivesse supostamente desacordada durante a prática do crime, tal circunstância não tem o condão de modificar a ação penal do crime para pública incondicionada, pois a situação não se amolda a nenhuma das situações previstas no artigo 225, parágrafo único, do Código Penal (vítima menor de 18 anos ou vulnerável).
Ao analisar o caso, o ministro Sebastião Reis Júnior, relator na 6ª Turma do STJ, deu razão à defesa do réu. Em seu voto, ele explica que de acordo com o artigo 225 do CP, o crime de estupro, em qualquer de suas formas, é, em regra, de ação penal pública condicionada à representação, sendo, apenas em duas hipóteses, de ação penal pública incondicionada, quais sejam, vítima menor de 18 anos ou pessoa vulnerável.
Porém, segundo o ministro, a própria doutrina reconhece a existência de certa confusão na previsão contida no artigo 225, caput e parágrafo único, do CP, o qual, ao mesmo tempo em que prevê ser a ação penal pública condicionada à representação a regra tanto para os crimes contra a liberdade sexual quanto para os crimes sexuais contra vulnerável, parece dispor que a ação penal do crime de estupro de vulnerável é sempre incondicionada.
Para Sebastião Reis Júnior, a interpretação que deve ser dada ao referido dispositivo legal é a de que, em relação à vítima possuidora de incapacidade permanente de oferecer resistência à prática dos atos libidinosos, a ação penal seria sempre incondicionada. Mas, em se tratando de pessoa incapaz de oferecer resistência apenas na ocasião da ocorrência dos atos libidinosos — não sendo considerada pessoa vulnerável —, a ação penal permanece condicionada à representação da vítima, da qual não pode ser retirada a escolha de evitar o strepitus judicii (escândalo causado pela divulgação do fato).
"Com este entendimento, afasta-se a interpretação no sentido de que qualquer crime de estupro de vulnerável seria de ação penal pública incondicionada, preservando-se o sentido da redação do caput do artigo 225 do CP", concluiu. Seguindo o voto do relator, a Turma anulou a condenação e a ação penal contra o reú.
Voto vencido
O ministro Rogerio Schietti Cruz discordou do relator quanto à questão da vulnerabilidade. Para ele, a ação penal no crime de estupro é pública incondicionada, se presente a violência real.
Ele explica que se aplica ao caso a Súmula 608 do Supremo Tribunal Federal que diz: "no crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação é pública incondicionada".
"A letra do disposto no artigo 225 do Código Penal, ainda incide a Súmula 608 do STF nos crimes praticados mediante violência real, como no caso dos autos, em que a violência empregada contra a vítima, ainda que de natureza leve, restou incontroversa", afirma o ministro.
Clique aqui para ler o acórdão e os votos.
Revista Consultor Jurídico, 21 de fevereiro de 2015.
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