Defensor público não pode ser obrigado a manter inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil nem precisa se submeter aos regulamentos da categoria. Por entender que tratam-se de classes profissionais diferentes, a 13ª Vara Federal em Minas Gerais determinou que a OAB-MG cancele as inscrições de quatro defensores públicos federais e não aplique qualquer medida disciplinar contra eles.
Na ação, os defensores públicos contam que solicitaram ao presidente da OAB-MG a sua exclusão dos quadros da entidade, sem prejuízo das atribuições dos cargos públicos ocupados. No entanto, de acordo com o processo, os pedidos foram negados de imediato, com uma suposta ameaça de aplicação de sanções disciplinares previstas no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994).
A OAB-MG condicionou o cancelamento do registro ao desligamento dos autores da Defensoria Pública. Para o juiz federal Valmir Nunes Conrado, o argumento da seccional é paradoxal: “O propósito dos defensores públicos é justamente obter medida em sentido inverso”.
Ao analisar Mandado de Segurança, Conrado concordou que os defensores públicos, além de não poderem receber honorários, estão proibidos de advogar fora de suas atribuições institucionais. “Mesmo porque as atribuições funcionais da Defensoria Pública gravitam em torno da orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados.”
Já os advogados, segundo a decisão, têm um espectro maior de atuação, como apresentar pedidos, sem restrições, a órgãos do Judiciário, prestar consultoria, assessoria e direção jurídica, além de liberdade de escolher a causa que quer atuar. O juiz conclui que se defensores e advogados têm direitos diferentes, a filiação compulsória à OAB atestaria que as duas categorias têm os mesmo direitos, mas prerrogativas distintas.
Conrado afirma que os defensores não podem ficar submetidos, ao mesmo tempo, a dois regimes administrativos e disciplinares diferentes — da OAB e da Defensoria Pública, com suas respectivas hierarquias. “De fato, a exposição do defensor público federal a dupla supervisão e, mais que isso, a um duplo código de ética, o exporia a uma insegurança jurídica e profissional que não se justifica”, escreveu.
Além das diferenças de natureza profissional, o ingresso na Defensoria Pública depende apenas da nomeação e posse no cargo público, conforme previsto no artigo 4º da Lei Complementar 80/1994, que organiza a instituição no âmbito da União e do Distrito Federal. Esse dispositivo, de acordo com o juiz, dissipou qualquer incerteza em relação à previsão de registro instituída pelo Estatuto da Advocacia em seu artigo 3º, parágrafo 1º.
Em sua manifestação, o Ministério Público Federal afirmou que a mesma lei complementar prevê, em seu artigo 26, a exigência de inscrição. O juiz apontou, no entanto, que o registro na Ordem é necessário apenas como pré-requisito de inscrição no concurso público.
“Tenho por evidente que a redação atual do parágrafo primeiro do artigo 3º da Lei no 8.906/94 viola a dicção do artigo 5º, XX, da Constituição Federal[ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado], porquanto obriga o defensor público federal a permanecer inscrito nos quadros da OAB sem qualquer causa que o justifique”, concluiu.
O juiz determinou, dessa forma, que as inscrições sejam canceladas com efeito retroativo a 3 de novembro de 2009, data em que foi apresentado o primeiro pedido administrativo, sem que seja aplicada qualquer punição aos autores.
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Processo: 0088514-58.2010.4.01.3800
Revista Consultor Jurídico, 31 de julho de 2014.
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