terça-feira, 13 de setembro de 2011

Apenas 10% dos inquéritos de homicídios dolosos são concluídos

Quatro meses após o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) lançar a Meta 2 – uma determinação para que todos os inquéritos de homicídios dolosos abertos até 2007 sejam concluídos ainda neste ano –, apenas 10% das 140 mil investigações espalhadas pelo Brasil foram concluídas. No Paraná, apenas 7,2% dos 7.352 inquéritos tiveram algum destino.

O mais preocupante é que, quando a Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp) estabeleceu a meta, o objetivo era combater a impunidade. Na prática, porém, os promotores optaram por arquivar em massa, em vez de investir mais nas investigações para chegar a dezembro com prateleiras vazias.
Nos primeiros quatro meses de Meta 2, os MPs do país já aarquivaram 11.282 casos e ofereceram denúncia em apenas 2.194. Goiás é o maior arquivador: pediu o encerramento de 97% dos casos examinados. No Paraná, 87% dos 531 casos analisados foram arquivados e em apenas 9% alguém foi denunciado.
A prática de arquivar antecede a Meta 2. No 1.° Tribunal do Júri de São Paulo, que concentra mais da metade dos casos de homicídio da cidade, só no ano passado foram arquivados 1,5 mil inquéritos. Cerca de 90% desse total é arquivado por falta de informações sobre a autoria do crime. E a maior parte desses crimes acontece em bairros pobres, em meio a famílias sem condição financeira ou social para clamar por Justiça.
Crítica
O pesquisador do Núcleo de Violência da Universidade de São Paulo e secretário-geral do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, defende as metas do Enasp, mas critica um eventual arquivamento indiscriminado dos casos. “O arquivamento revela a deficiência não da Meta 2, mas do modelo de investigação. É importante fazer com que a investigação seja feita. Não cabe só à polícia o papel de má nessa história, se o MP não for fundo, a Meta 2 vira procedimento administrativo.”
Coordenador da meta do Enasp em São Paulo, o promotor Fernan do Pastorello Kfouri nega que os promotores estejam sob pressão para avaliar os inquéritos rapidamente e afirma que o não cumprimento da meta não resultará em punição. Kfouri diz que não há intenção de rever casos arquivados. “A Meta 2 é de priorização dos casos anteriores a 2007. Quanto mais antigo o inquérito, menor a chance de um desfecho positivo.”
O responsável da Delegacia de Homicídios Rubens Recalcatti, que lidera o grupo Honre (Ho micídios Não Resolvidos), em Curitiba, afirma que na maioria dos inquéritos arquivados não foi possível descobrir a autoria ou o autor está morto. No caso do Paraná, segundo ele, falta estrutura para apurar crimes antigos. “Nos últimos quatro meses, conseguimos concluir cem inquéritos, mas a dificuldade é grande. Não temos acesso a dados importantes, como da Receita Federal, que podem subsidiar informações. Temos dificuldade de localizar familiares, testemunhas, falta material, pessoal e tempo para ler e organizar o inquérito.”
SÃO PAULO - Somente 6% dos BOs viram inquéritos
Levantamento do pesquisador Sérgio Adorno, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, revelou que entre 20% e 40% dos casos de assassinatos levados às delegacias paulistas nem ao menos viram inquéritos. E as vítimas têm endereço certo: bairros pobres da periferia e favelas.
Adorno se debruçou sobre 344 mil boletins de ocorrência para revelar que apenas 6% são transformados em inquéritos. Em caso de homicídio, de 60% a 80% viram inquérito, mas a maioria dos crimes sem autoria definida fica sem apuração. E aponta a desigualdade no tratamento dado aos pobres mortos. O estudo foi realizado sobre os anos de 1991 a 1997, mas o pesquisador, que estuda a impunidade há dez anos, disse acreditar que a realidade nas delegacias não tenha mudado.
Casos raros
"Os homicídios investigados são os que têm autoria conhecida. Casos que envolvam um corpo que foi encontrado, uma vítima do tráfico de armas ou o crime organizado raramente são investigados. Em geral, argumenta-se que não há provas nem elementos", diz o pesquisador. Adorno afirma que a maioria dos casos é amparada por testemunhas, que acabam sumindo. Esse sumiço se explica pela lei do silêncio que impera nos bairros pobres e sem o amparo do estado. "Grande parte das provas é testemunhal, não se recolhem provas técnicas e, muitas vezes, elas não são o que nós vemos aí em Lei e Ordem [seriado de tevê sobre investigação criminal]. A testemunha é uma figura que desaparece, se sente ameaçada", explica.

Fonte: GABRIEL AZEVEDO - Gazeta do Povo

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