Um projeto de lei que começou a tramitar no parlamento uruguaio, nesta quinta-feira (15/11), propõe a criação de uma espécie de empresa estatal, o Instituto Nacional da Cannabis, com a finalidade de assumir a liderança na venda de maconha no país — e controlar todas as atividades relacionadas à planta, da produção ao consumo, de acordo com o Washington Post, com a agênciaAssociated Press (AP).
O Instituto também terá a atribuição de licenciar indivíduos e empresas para produzir e vender maconha para consumo recreativo, medicinal ou industrial. De acordo com o jornal El Nuevo Herald, o Instituto deverá assumir "o controle e a regulamentação de atividades de importação, exportação, plantação, cultivo, colheita, aquisição, armazenamento, comercialização e distribuição da cannabis ou seus derivados".
Além disso, qualquer pessoa poderá plantar em sua casa uma quantidade limitada de maconha. E ter a posse de uma certa quantidade para seu próprio consumo. Poderão ainda ser criadas associações que se encarregarão de fornecer sementes da cannabis para seus membros, de acordo com o projeto de lei.
O projeto de lei que passou a tramitar no parlamento uruguaio é bem mais liberal do que o inicialmente proposto pelo governo há alguns meses. O presidente Jose Mujica havia anunciado que apenas uma empresa estatal teria permissão de vender maconha no país. A permissão para o cultivo individual da maconha para uso pessoal e a criação de associações não estavam no projeto governamental.
A ideia principal da proposta é acabar com o tráfico de drogas de maconha no país e, tanto quanto possível, de outras drogas. O Uruguai espera se livrar dos grandes traficantes de drogas — e da violência que faz parte de suas atividades — permitindo aos usuários a aquisição de maconha de uma fonte oficial. Ou mesmo de uma fonte privada, licenciada pelo estado, ou ainda de recursos próprios.
O governo também espera que a liberação do consumo da maconha possa contribuir significativamente para reduzir o consumo de cocaína, principalmente entre os jovens. "O objetivo central é separar o mercado da maconha do mercado de drogas pesadas", disse à AP o sociólogo uruguaio Agustin Lapetina. "Queremos impedir que as pessoas que vão ao mercado negro atrás de maconha acabem sendo atraídas para o consumo de cocaína ou outras drogas", declarou.
O governo uruguaio espera, ainda, rastrear o consumo de maconha no país por meio de um banco de dados confidencial. Uma possibilidade é fornecer a cada usuário um cartão magnético para a compra da maconha, para alimentar o banco de dados. Com o dinheiro arrecadado do licenciamento para a produção, distribuição e venda da maconha — e da venda, que não será o principal negócio do Instituto, o governo quer financiar campanhas contra drogas e tratamento dos usuários.
O projeto de lei estabelece que qualquer pessoa pode plantar e manter em sua posse até 40 gramas de maconha para seu próprio consumo. E plantar seis pés de maconha em sua própria casa, produzindo até 480 gramas de maconha por vez. Prevê ainda que pessoas podem se filiar a associações com até 15 usuários de maconha que, juntos, podem plantar até 90 pés e armazenar até 7.200 gramas por ano. A identidade dos compradores de maconha seria protegida pela lei.
A proposta uruguaia se assemelha à legislação aprovada pelo estado americano do Colorado, diz Colette Youngers, uma especialista do Escritório de Washington para a América Latina, que foi ao Uruguai ajudar a discutir e redigir o projeto de lei. A legislação de Colorado também permite aos usuários plantar até seis pés de maconha em suas casas. A legislação aprovada pelo estado de Washington permite o consumo recreativo, mas não permite que o usuário plante maconha em sua casa.
De acordo com Colette Yourgers, o governo uruguaio ainda está tentando avaliar qual seria a melhor maneira de implementar essa lei. "É um experimento que ainda não foi feito por país algum", disse. Assim, o governo pretende dar a maior flexibilidade possível a estrutura jurídica da lei, para que ela possa ser ajustada conforme seja necessário, a qualquer tempo.
O projeto de lei já foi tecnicamente aprovado pelo partido de situação. Os parlamentares de oposição foram convidados, na quinta-feira, a apresentar sugestões para o projeto. O governo espera que a Câmara dos Deputados aprove o projeto em dezembro, para que o Senado o avalie logo no início do ano. Isso feito, a criação de infraestrutura para colocar a lei em prática poderá durar todo o ano de 2013.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 16 de novembro de 2012
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