“Não se pode considerar crime fato que não tenha violado, verdadeiramente, o bem jurídico tutelado — a liberdade sexual —, haja vista constar dos autos que as menores já se prostituíam havia algum tempo.” A declaração é da ministra Maria Thereza de Assis Moura, da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que entendeu que a presunção de violência no crime de estupro tem caráter relativo e pode ser afastada diante da realidade concreta, mesmo quando o crime foi supostamente praticado contra menores de 14 anos.
No centro da questão estão um adulto e três meninas, todas de 12 anos. No caso, ele foi acusado de ter praticado estupro contra as menores. Mas tanto o juiz quanto o Tribunal de Justiça de São Paulo o inocentaram, porque as garotas “já se dedicavam à prática de atividades sexuais desde longa data”.
A decisão da 3ª Seção trata do artigo 224 do Código Penal, já revogado. De acordo com a ministra, que relatou o caso, não se pode considerar crime o ato que não viola o bem jurídico tutelado — no caso, a liberdade sexual. Ela observou que as meninas a que se referia o processo julgado se prostituíam havia tempos quando do suposto crime.
“A prova trazida aos autos demonstra, fartamente, que as vítimas, à época dos fatos, lamentavelmente, já estavam longe de serem inocentes, ingênuas, inconscientes e desinformadas a respeito do sexo. Embora imoral e reprovável a conduta praticada pelo réu, não restaram configurados os tipos penais pelos quais foi denunciado", afirmou o acórdão do TJ-SP, que manteve a sentença absolutória.
Entendimento pacificado
A 5ª Turma do STJ havia reformado a decisão do TJ paulista, decidindo pelo caráter absoluto da presunção de violência no estupro praticado contra menor de 14 anos. Já a 6ª Turma considerava ser relativa.
A decisão da 5ª Turma levou a defesa a apresentar embargos de divergência à 3ª Seção, que alterou a jurisprudência anterior para reconhecer a relatividade da presunção de violência na hipótese dos autos. Houve alteração significativa de composição da Seção. Por maioria, vencidos os ministros Gilson Dipp, Laurita Vaz e Sebastião Reis Júnior, a Seção entendeu por fixar a relatividade da presunção de violência prevista na redação anterior do CP.
A ministra, relatora do caso na Seção, afirmou que, apesar de buscar a proteção do ente mais desfavorecido, o juiz não pode ignorar situações nas quais o caso concreto não se insere no tipo penal. “Não me parece juridicamente defensável continuar preconizando a ideia da presunção absoluta em fatos como os tais se a própria natureza das coisas afasta o injusto da conduta do acusado”, disse.
Segundo ela, “o direito não é estático, devendo, portanto, se amoldar às mudanças sociais, ponderando-as, inclusive e principalmente, no caso em debate, pois a educação sexual dos jovens certamente não é igual, haja vista as diferenças sociais e culturais encontradas em um país de dimensões continentais”.
Com informações da Assessoria de Comunicação do STJ.
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