* Daniel Torrey
O Foreign Corrupt Practices Act, ou FCPA (Lei Americana Anti-Corrupção no Exterior[1]), é uma lei estadunidense promulgada pelo Congresso dos EUA em 1977 destinada a criar sanções cíveis, administrativas e penais no combate à corrupção comercial internacional. Esta lei se aplica a pessoas e empresas Americanas que, em atividade comercial no exterior, utilizam de corrupção no poder público estrangeiro para obter ou reter transações comerciais naquele país. Da mesma forma, esta lei cria uma estrutura administrativa para combater a prática de corrupção em transações comerciais internacionais.
Até meados de 1997 não havia um consenso internacional quanto à ilegalidade deste tipo de conduta, o pagamento de propinas para autoridades públicas estrangeiras era até mesmo incentivado em muitos países, inclusive nações desenvolvidas. Por exemplo, o código tributário francês permitia que empresas francesas deduzissem de seu imposto de renda quaisquer despesas que tivessem no exterior, inclusive as destinadas a “molhar a mão” de oficiais de governos estrangeiros[2]. Apenas com a introdução do art. 39-2 bis que o Code Général des Impôts passou a proibir tal dedução.
Até então os EUA eram um dos poucos países que proibiam suas empresas de pagarem propinas para autoridades públicas estrangeiras. A partir de então, após esforços diplomáticos sob os auspícios da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), ocorreu a ratificação e entrada em vigor da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE[3], informalmente conhecida como Convenção Anti-propina.
Por sua vez, o Brasil ratificou a Convenção Anti-Propina em 15 de junho de 2000[4], e promulgou legislação específica para implantar as sanções penais exigidas pela mesma[5] (Lei Federal nº 10.467/2002), emendando o Código Penal e a Lei dos Crimes de Lavagem de Dinheiro. No entanto, a legislação brasileira não trouxe mecanismos específicos para detectar e angariar provas dos possíveis ilícitos. Em contraste, o FCPA obriga empresas a adotarem e manterem um sistema interno de controles contábeis[6] suficientes para evitarem adulteração das contas, bem como a apresentarem[7] anualmente demonstrações contábeis de suas transações financeiras globais, sob pena de severas sanções cíveis, administrativas e criminais[8].
No caso brasileiro, compete a uma variedade de órgãos o combate à corrupção internacional, dentre eles o COAF e o BACEN. Ao COAF compete receber, analisar e identificar possíveis práticas ilícitas, bem como notificar as autoridades competentes para instauração dos procedimentos cabíveis, sobretudo o MPF. O BACEN obriga instituições financeiras a informar transações financeiras suspeitas pelos membros do sistema financeiro nacional. Todavia, após uma década da ratificação da Convenção, ainda não houve nenhum caso registrado de aplicação da legislação específica de acordo com a OCDE[9].
Tendo isto em vista, o Brasil prepara o Projeto de Lei n° 6.826/2010 com o objetivo de reforçar seus mecanismos no combate à corrupção internacional. Este projeto, que tramita na Câmara dos Deputados, contempla severas sanções civis e administrativas, dentre elas multas no valor de até 30% do faturamento bruto anual da pessoa jurídica, impedimento de contratação com o poder público e dissolução compulsória da pessoa jurídica.
Ainda em 2012, deve ser realizado um seminário em Curitiba com o objetivo de obter a opinião de juristas e empresários para aprimorar o projeto de lei.
* O autor é advogado da Popp & Nalin Sociedade de Advogados, mestre em Direito Internacional e Comparado pela The George Washington University Law School e bacharel em Direito pelo Centro Universitário Curitiba – UNICURITIBA
[1] Existe uma versão em português desta lei no site do Departamento de Justiça dos EUA, disponível no sitio:http://www.justice.gov/ criminal/fraud/fcpa/docs/fcpa- portuguese.pdf
[2] O art. 39-2 bis do Code Général des Impôts passou a proibir tal dedução a partir da Convenção Anti-Propina.
[3]Com entrada em vigor internacional em 15 de fevereiro de 1999. Disponível em português no sitio do Ministério das Relações Exteriores: http://www2.mre.gov.br/dai/ corrup.htm e no texto oficial em inglês e francês no sítio oficial da OECD: http://www.oecd.org/document/ 21/0,3746,en_2649_34859_ 2017813_1_1_1_1,00.html.
[5] Lei Federal nº 10.467/2002, que promulga a Convenção, acrescentou os artigos 337-B, 337-C e 337-D ao Código Penal, bem como o inciso VIII ao art. 1º da Lei dos Crimes de Lavagem de Dinheiro[5].
[8] 15 U.S.C, § 78dd-1, et sequentia. As penas variam desde multas até 25 milhões de dólares, 20 anos de prisão, revogação de licenças administrativas, banimento de participar em licitações e contratos da administração, ao confisco dos lucros obtidos em virtude da vantagem corrupta obtida.
[9] 2010 Data on Enforcement of the Anti-Bribery Convention (Dados Sobre o Cumprimento da Convenção Anti-Propina de 2010), pág. 04. Disponível, em inglês no sitio oficial da OCDE: http://www.oecd.org/dataoecd/ 47/39/47637707.pdf
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