A sessão plenária do Conselho Nacional de Justiça desta terça-feira (21/6) terminou por volta das 19h. Cerca de meia hora depois, advogados do Rio de Janeiro e do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil começaram a trocar telefonemas que mesclavam indignação com incredulidade. Motivo: sem a presença de representantes da Ordem, o CNJ havia julgado o processo que discute se a OAB é competente para regular os trajes adequados para os advogados atuarem nos fóruns e tribunais do país. Por unanimidade, os conselheiros decidiram que não cabe à OAB, mas sim aos tribunais, regular a vestimenta.
O que revoltou os advogados foi o fato de que Miguel Cançado, presidente em exercício do Conselho Federal, e Wadih Damous, presidente da OAB-RJ, haviam deixado a sessão com a promessa de que o processo não seria julgado. Ouvido pela revista Consultor Jurídico, Cançado afirmou que o presidente do CNJ, ministro Cezar Peluso, lhe garantiu que não haveria tempo para julgar o processo. “Eu manifestei a intenção de fazer sustentação oral no processo. Não teria saído se houvesse a possibilidade de julgamento”, disse.
O presidente em exercício da OAB lamentou que o processo tenha sido julgado à revelia da entidade: “O presidente Peluso me afirmou, expressa e pessoalmente, que não chamaria o processo a julgamento”. O conselheiro Jorge Hélio, indicado para o CNJ pela OAB, disse à ConJur que foi induzido a erro. “Julgamos em bloco, no final da sessão, sem tomar conhecimento da matéria. Eu pensava, inclusive, em pedir vista do processo para trazer uma nova análise porque está claro que a competência para definir isso é da OAB. Jamais teria votado dessa forma”.
Jorge Hélio também afirmou que pedirá a reabertura da discussão. “Fui induzido a erro e vou solicitar a revisão desse julgamento”, garantiu. E acrescentou que considera o julgamento em bloco “um perigo”. De acordo com o conselheiro, na sessão desta terça houve um pedido de anulação de julgamento por conta de outro processo que foi julgado em bloco, sem sustentação oral.
O presidente da seccional fluminense da OAB, Wadih Damous, também criticou duramente o julgamento do caso. A OAB-RJ é a autora do pedido feito ao CNJ. “Estou indignado. A OAB foi desrespeitada. O ministro Cezar Peluso não deveria ter informado o Miguel Cançado que o processo não seria julgado se houvesse essa possibilidade”, afirmou Damous. “Lamento a atitude do conselheiro Nelson Braga, relator do caso, que hoje é juiz, mas oriundo do quinto constitucional da advocacia”, disse o presidente da OAB-RJ. Para Damous, o processo “não poderia ter sido colocado para ser julgado pela modalidade de julgamento célere que, aliás, nunca vi no Código de Processo Civil ou em qualquer legislação processual”. Ele também defendeu que o caso seja julgado novamente.
O presidente do CNJ, ministro Cezar Peluso, foi procurado pela reportagem da ConJur por meio de sua assessoria de imprensa, mas não deu retorno à ligação até a publicação deste texto.
Com que roupa?
O Conselho Nacional de Justiça fixou que os tribunais possuem autonomia para decidir sobre os trajes a serem usados dentro das instalações do Poder Judiciário. O relator do caso, conselheiro Nelson Braga, baseou seu entendimento no artigo 99 da Constituição Federal, que prevê a autonomia administrativa e financeira do Poder Judiciário.
O Conselho Nacional de Justiça fixou que os tribunais possuem autonomia para decidir sobre os trajes a serem usados dentro das instalações do Poder Judiciário. O relator do caso, conselheiro Nelson Braga, baseou seu entendimento no artigo 99 da Constituição Federal, que prevê a autonomia administrativa e financeira do Poder Judiciário.
O pedido da seccional fluminense da OAB foi feito ao CNJ em razão de ato da juíza da 5ª Vara do Trabalho de Duque de Caxias, Leila Costa de Vasconcelos. A juíza não respeitou resolução da Ordem que permitia aos advogados do Rio de Janeiro não vestir terno e gravata durante o verão.
O advogado Guilherme Peres, subprocurador-geral da seccional que assina o pedido, explicou à revista Consultor Jurídico que a resolução da OAB-RJ já havia perdido o objeto, já que valia até 21 de março passado. Mas a seccional pediu que o CNJ reconhecesse a competência da OAB e editasse uma resolução sobre o assunto, o que faria com que as seccionais dos 27 estados do país possam tratar do tema de acordo com as peculiaridades de suas regiões.
O pedido da Ordem se baseia no artigo 58, inciso XI do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994), que diz que compete privativamente ao Conselho Seccional determinar “critérios para o traje dos advogados, no exercício profissional”.
Para prevenir possíveis problemas, em 2010, a OAB-RJ entrou com um pedido de providências no CNJ, para garantir o cumprimento da Resolução 39/2010, que desobrigava o uso do terno. Em decisão monocrática, o conselheiro relator Felipe Locke indeferiu o pedido por entendê-lo absolutamente inviável, dizendo que “o CNJ não poderia ingerir nas determinações da OAB”.
Assim como a Resolução 39/2010, a 233/2011 autorizou os advogados a trajarem calça e camisa sociais, até o dia 21 de março — exatamente durante o verão. Segundo Peres, não há lei que exija o uso de terno, mas como é costume, alguns juízes não deixam o profissional participar de audiência ou despachar um pedido se não estiver com a vestimenta, e as resoluções foram feitas para que os clientes não fossem prejudicados com possíveis faltas.
Esse ano foi diferente. O conselheiro relator Nelson Braga, também monocraticamente, não conheceu do pedido de providências dizendo que o controle de legalidade feito pelo CNJ é dirigido aos atos do próprio Judiciário, e que, no caso, a decisão dos trajes a serem usados em audiência é matéria administrativa a ser regulamentada pelo próprio Judiciário, e não pela OAB. A entidade recorreu dessa decisão e, hoje, perdeu o recurso.
Revista Consultor Jurídico, 21 de junho de 2011.
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