A Suprema Corte do Canadá decidiu, na quinta-feira (28/3), que toda prisão preventiva deve ser revista por juízes periodicamente — 30 dias em caso de crimes de menor poder ofensivo (com penas inferiores a dois anos) e 90 dias para os demais crimes. De certa forma, os presos têm direito a uma audiência de custódia em prazos estabelecidos, podendo ser libertados ou permanecer na cadeia até o julgamento.
No Canadá, como em outros países, os presos podem passar centenas de dias na cadeia até serem julgados. Mas isso está errado, escreveu o presidente da corte, ministro Richard Wagner, na decisão por 9 votos a zero. "No Canadá, a lei prevê que aguardar o julgamento em liberdade é a regra e, na cadeia, é a exceção", afirmou o ministro.
O ministro explica, na decisão, que os responsáveis pela cadeia devem notificar o juiz sobre a proximidade do fim do prazo de 90 dias. O juiz deve então marcar a audiência, quando irá examinar o processo, as provas e as razões para manter o réu preso. O advogado do réu e o promotor podem participar da audiência e contribuir com informações relevantes para a análise do juiz, que também pode submeter o "material" existente à devida diligência.
"Na revisão do caso, o juiz pode considerar quaisquer provas novas ou mudanças nas circunstâncias do acusado, o impacto da passagem do tempo e qualquer atraso não razoável na proporcionalidade da detenção, bem como a base racional para a ordem de prisão inicial", escreveu o ministro. "No final, o juiz deve explicar ao preso as razões pelas quais mantê-lo preso é justificável ou não".
Segundo a decisão, há apenas três razões básicas para manter uma pessoa em prisão preventiva (à semelhança de outros países): se for necessário para garantir seu comparecimento a audiências; se for necessário para a proteção ou segurança do público; se for necessário para manter a confiança do público na administração da justiça.
Fora disso, o réu deve aguardar o julgamento em liberdade, porque a prisão preventiva causa vários males como: sérios impactos prejudiciais à capacidade do réu de ajudar a preparar a defesa; um custo significativo em termos de perda da liberdade; um impacto negativo em seu bem-estar físico e mental, bem como no bem-estar de sua família; e perda dos meios de sobrevivência do preso.
O advogado Justin Myers, que representou o réu no caso perante a corte, reconheceu que a decisão irá sobrecarregar os juízes, que poderão ter de fazer audiências após audiências. Mas, para ele, a decisão contém um recado da Suprema Corte para eles:
"Apressem-se. Quanto mais rapidamente os julgamentos forem realizados, menos audiências terão de ser feitas caso a caso. É uma questão de organização do tempo, de programação e de fazer os julgamentos tão rapidamente quanto possível. E isso, no geral, contribui para um sistema judicial mais eficaz, com maior integridade na maneira que funciona."
Em alguns casos, os réus preferem fazer um acordo de admissão de culpa com a Promotoria, porque o tempo que irão passar na prisão será menor do que o que ficarão aguardando o julgamento na cadeia.
Na decisão, o ministro Richard Wagner previu as possíveis consequências da decisão: as pessoas serão soltas mais frequentemente; muitos presos serão libertados na expiração do prazo; as cortes vão reconsiderar as razões da prisão preventiva e decidir libertar o preso; os presos serão julgados mais rapidamente porque, se forem julgados dentro de 90 dias, não haverá necessidade de mais audiências.
João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.
Revista Consultor Jurídico, 30 de março de 2019.
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