quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Vai começar o faroeste brasileiro ...

Bolsonaro facilita posse de armas de fogo por decreto



O presidente Jair Bolsonaro assinou nesta terça-feira (15), o Decreto nº 9.685/2019 que facilita a posse de armas de fogo de uso permitido (não inclui armas de uso restrito). O decreto assinado altera o Decreto nº 5.123/2004, que regulamenta a Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).
De início, é importante apontar a diferença entre posse e porte. A posse significa que a pessoa está autorizada a ter uma arma dentro de sua residência ou no estabelecimento comercial/industrial, desde que seja o dono ou responsável legal pelo estabelecimento. Já o porte é quando a pessoa está autorizada a circular com a arma em espaços públicos, portanto fora da residência ou do estabelecimento de trabalho. O porte de armas não foi tratado no decreto.
O novo texto mantém a exigência da comprovação da “efetiva necessidade” de ter uma arma. Contudo, estabelece situações concretas em que se verificam.
Pelo texto, terão “efetivada necessidade” de possuir armas de fogo as pessoas que se encaixarem nos seguintes critérios: Ser agente público (ativo ou inativo); Ser militar (ativo ou inativo); Residir em área rural; Residir em áreas urbanas com elevados índices de violência, assim considerados aquelas localizadas em Estados com índices anuais de mais de dez homicídios por cem mil habitantes (segundo dados apresentados no Atlas da Violência 2018, todos os Estados e o DF se encaixam nesse critério); Ser dono ou responsável legal de estabelecimentos comerciais ou industriais; e Ser colecionador, atirador e caçador, devidamente registrados no Comando do Exército.
Na hipótese de casa em que resida criança, adolescente ou pessoa com deficiência mental, será preciso comprovar a existência de cofre ou local seguro para armazenamento.
Também não tem direito à posse a pessoa que tiver vínculo comprovado com organizações criminosas, mentir na declaração de efetiva necessidade ou agir como ‘pessoa interposta’ de alguém que não preencha os requisitos para ter posse.
Além disso, a Polícia Federal, ao analisar o pedido, vai presumir que os dados fornecidos pelo cidadão para comprovar a “efetiva necessidade” são verdadeiros.
O novo decreto mantém inalteradas exigências que já vigoravam sobre posse de armas, como ter mais de 25 anos de idade, ocupação lícita e residência, possuir capacidade técnica e psicológica, não estar respondendo a inquérito policial ou processo criminal e não ter antecedentes criminais.
O pedido para ter a arma continuará sendo feito para a Política Federal, que será responsável por analisar sobre a necessidade e os demais requisitos, autorizando ou não a posse. Mas o presidente sugeriu que podem ser elaborados convênios com políticas militares e civis para tanto.
O texto permite que o cidadão compre até quatro armas de fogo. Em casos específicos o limite pode ser ultrapassado. A validade do registro foi ampliada para dez anos, tanto para civis como para militares.
A flexibilização, contudo, é um tema que divide a população. Segundo o Datafolha, 61% dos entrevistados é contrário a posse de arma de fogo.
Com efeito, a cada 1% a mais de armas de fogo em circulação, os homicídios aumentam 2%, segundo Daniel Cerqueira do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Ademais, em 2016, 71,1% dos 62.517 homicídios no Brasil foram causados por armas de fogo (a grande maioria por motivos banais e não para a prática de crime contra o patrimônio, de acordo com o Atlas de Violência, do IPEA).
Sem embargo, facilitar o acesso às armas de fogo trará uma falsa sensação de segurança a população. É de se prever que a violência aumentará, bem como os roubos às residências, notadamente porque os ladrões vão agora em busca das armas e, consequentemente, mais armas legais cairão na mão dos criminosos.
Também é importante ressaltar que é falsa a crença de que a pessoa terá tempo de perceber um ataque e se defender (isso só nos filmes). Digo isso porque o criminoso tem a seu favor o 'fator surpresa'. Mesmo que se perceba o ataque, a vítima terá que sacar a arma rapidamente para se defender, bem como precisará de habilidade para efetuar o disparo. Neste ponto tem a questão de acesso a arma - se fica em lugar de fácil acesso, está ao alcance de crianças e estranhos e se fica menos disponível não dará tempo para pegar a arma e se defender. Isso sem falar que se o bandido talvez não quisesse atirar, agora, diante de alguém armado, certamente o fará.
Ademais, é bom lembrar que a maioria dos casos de violência são praticadas por motivos banais, ou seja, costuma ser aquele sujeito que brigou no bar e usou arma de fogo ou aquele sujeito que bate na mulher e também fez uso da arma de fogo etc.
Fica a pergunta: você acredita que o cidadão, tendo a posse da arma legalmente, não vai portar a arma no carro ou em locais públicos? Os “machões” estarão de plantão, demonstrando toda a sua ‘masculinidade’ !
Mas como o mundo é movido pela grana, quem ganha são as indústrias de segurança e armamentistas. A ação da empresa Taurus, fabricante brasileira de armas de fogo, que antes da eleição custava 2 reais, hoje custa em torno de 7 reais.
Também, é bom apontar que o gasto (para se obter a arma) pode variar entre R$7 mil e R$15 mil, a depender do modelo da arma adquirida e os custos dos cursos, testes e exames, além da taxa de inscrição do pedido na Polícia Federal. Ou seja, no faroeste brasileiro, quem tem vantagem (sempre é assim) é quem tem grana e capacidade eficiente de manuseio da arma. Aos pobres e despreparados o caminho é a cova ou o SUS.
E você, está preparado para o “bang-bang”? Como se sente ao saber que o “cidadão de bem” ao seu lado pode estar armado e pronto para o duelo?
A próxima etapa prometida pelo presidente eleito é a flexibilização do porte, redução da idade mínima, anistia a armas irregulares, fim do monopólio da Taurus, redução do imposto para o comprador e a facilitação das condições de compra de armamento.
Segue o tiroteio … embora só está começando ...

Neemias Prudente, Professor de Direito do Ensino Superior
Neemias Prudente, Professor
Professor de Processo Penal e de Legislação Penal Especial (IPE). Servidor Público Federal (MPF/PR). Mestre em Direito Penal (UNIMEP/SP). Especialista em Direito Penal e Criminologia (ICPC/UFPR). Escritor, Palestrante e Graduando em Filosofia (UNINTER).

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