A ordem de formulação dos quesitos no Tribunal do Júri não pode prejudicar a tese primária da defesa. Com esse entendimento, o ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça, reformou decisão de segundo grau e manteve um réu absolvido, embora o conselho de sentença tenha primeiro desconsiderado a ocorrência de crime doloso.
O Ministério Público alegava que houve tentativa de homicídio simples em face de duas vítimas. Já a Defensoria Pública levou ao júri duas teses: a principal pedia a absolvição por legítima defesa, enquanto a subsidiária buscava a desclassificação do crime, de tentativa de homicídio para lesão corporal.
Conforme a ordem estabelecida pelo juízo, os jurados resolveram, primeiro, desclassificar os crimes de homicídio tentado e, em segundo lugar, diante do quesito obrigatório de absolvição, livrar o acusado de ambos os crimes, acatando o pedido da defesa.
O MP questionou a decisão, sob o entendimento de que, como a primeira resposta acabou desclassificando o delito para lesão corporal, a competência para condenação seria deslocada para a juíza que presidia o julgamento, e não para o grupo de jurados — já que eles só devem analisar a prática de crimes dolosos contra a vida.
Diante disso, a acusação ajuizou recurso no Tribunal de Justiça do Amazonas para tentar anular o julgamento. O TJ-AM concordou parcialmente com o argumento do órgão. Segundo a 2ª Câmara Criminal da corte, a primeira conclusão do júri, sobre a desclassificação do crime de homicídio, é irretocável.
Mas os desembargadores entenderam que o réu não poderia ter sido logo depois absolvido pelo conselho de sentença, como apontou o MP, e anulou parcialmente a sessão de julgamento. A corte remeteu os autos ao juízo de origem para nova sentença.
A defesa do réu, então, alegou no Superior Tribunal de Justiça que a ordem de apresentação dos quesitos escolhida pela juíza do Tribunal do Júri foi contrária à sua manifestação — a Defensoria queria que fosse analisada primeiro a absolvição.
Para a instituição, a resposta positiva para ambas as teses apresentadas diante dos jurados não permite anular a absolvição apenas pela ordem das perguntas.
“O quesito absolutório genérico deveria ter sido formulado antes do desclassificatório, sendo que inversão da quesitação, contra a qual a defesa se insurgiu em plenário, não pode prejudicar o recorrente com o afastamento da competência do Tribunal do Júri, de forma a ignorar o resultado da apuração do quesito subsequente”, afirmou a defesa, pedindo o restabelecimento da sentença absolutória.
Ordem correta
O ministro Sebastião Reis Júnior reconheceu que, conforme orientação consolidada do STJ, “o quesito absolutório genérico – na hipótese da absolvição figurar como tese principal da defesa –, deve anteceder o desclassificatório, a fim de evitar violação do princípio da amplitude da defesa”.
Em decisão monocrática, ele restabeleceu a sentença de absolvição do réu porque considerou que a resposta positiva à tese de legítima defesa acabou prejudicando a primeira consideração do júri sobre desclassificar o crime de homicídio culposo.
“Nesse contexto, considerando a ordem correta de formulação dos quesitos (absolvição antes da desclassificação) e a apuração verificada no caso, entendo que deve ser restabelecida a sentença absolutória, uma vez que a resposta ao quesito absolutório genérico acabou por prejudicar o quesito desclassificatório”, concluiu.
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REsp 1.736.439
Mariana Oliveira é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 21 de junho de 2018.
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