Os abusos cometidos na cracolândia pelas forças de Segurança Pública, juntamente com a Guarda Municipal paulistana, no domingo (21/5), serão o tema do ato público organizado pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa. O evento acontece nesta quinta-feira (1º/6), às 17h, no largo General Osório, no centro de São Paulo.
Também participam da organização do evento a Associação Juízes para a Democracia (AJD); o Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade de Direito da USP; o Centro de Pesquisa e Extensão em Ciências Criminais, a Cia. Pessoal do Faroeste; o Conselho Municipal de Política sobre Drogas e Álcool (Comuda); o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a Ouvidoria-Geral e o Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública de São Paulo e a Plataforma Brasileira de Política de Drogas.
Segundo o IDDD, no evento serão denunciadas as “arbitrariedades e violações de direitos humanos que vêm sendo observadas” desde a operação policial na cracolândia. No dia 21, a região central de SP foi palco de confronto com a entrada dos policiais no local.
Alegando a necessidade de prender traficantes, as polícias Civil e Militar, fizeram uma operação na cracolândia, mas, após prenderem os vendedores de drogas, derrubaram barracos dos moradores de rua que lá estavam e os retiraram da área para que fosse feita a limpeza. Também foi demolida parte de um prédio sem a confirmação de que pessoas ainda estavam no imóvel. Três ficaram feridos.
Há uma liminar, proferida no dia 24 pela 3ª Vara da Fazenda Pública, proibindo a prefeitura de promover novas emoções na cracolândia sem prévio cadastramento das pessoas para atendimento de saúde e habitação. A decisão reconhece ainda que moradores podem retirar pertences e animais de estimação dos imóveis.
Internação em questão
Além da operação policial, há o debate sobre como deve ser feito o tratamento dos usuários de drogas que circula pela cracolândia. A prefeitura solicitou a internação compulsória à Justiça, mas teve seu pedido extinto nesta terça-feira (30/5).
Para o desembargador Borelli Thomaz, da 13ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça estadual, a Prefeitura de São Paulo não poderia ter apresentado pedido para internar usuários de drogas na ação movida pelo Ministério Público paulista em 2012. Isso porque o pedido deste feito é totalmente diferente das pretensões da administração municipal.
A ação apresentada pelo MP-SP pede que sejam impostos limites à ação da Polícia Militar na abordagem de usuários de drogas. Já há uma cautelar impedindo que os agentes de segurança causem situação vexatória, degradante ou desrespeitosa contra os dependentes químicos.
A liminar também proíbe que policiais impeçam pessoas nessa condição de permanecer na rua ou as obrigue a ir para outros lugares, exceto em caso de flagrante delito. Já o pedido da prefeitura na ação trata de autorização para agentes de saúde e guardas-civis metropolitanos abordarem usuários de crack para avaliar o estado dessas pessoas.
“Não há, pois, mínima identidade entre as pretensões, mesmo porque, como se percebe, a alvitrada na ação é excludente do pretendido no incidente, sem que haja autorização processual para o processamento do nominado incidente”, afirma Borelli Thomaz.
Argumentos da prefeitura
Para a Prefeitura de SP, a medida é necessária porque os usuários de drogas que andam pela região da cracolândia, no centro, não têm mais controle sobre seus atos e precisam de auxílio. A administração alegou ainda que as condições sanitárias da área são péssimas, afetando inclusive a coletividade.
“Os interesses individuais dessas pessoas, que não conseguem mais se conduzir pelas próprias razões, encontrando-se em estado tal de drogadição que precisarão de tratamento extremo (internação compulsória)”, diz a prefeitura.
Em entrevista à ConJur , o secretário de Justiça da cidade de São Paulo, Anderson Pomini, afirma que a internação compulsória não é uma pena e sim um tratamento para desintoxicação em casos extremos.
"A internação compulsória, devido à sua gravidade, somente pode ser realizada caso a caso, não há outra hipótese, e em último caso, após verificadas clinicamente as demais alternativas terapêuticas. Nossa petição formulada à Justiça pretende autorização judicial para busca e apreensão daquelas pessoas (...) inimputáveis. Para que possam ser analisadas por uma junta médica e multidisciplinar, que poderá decidir ou não pela internação compulsória como última solução ao gravíssimo problema enfrentado", declara o secretário.
Críticas à ideia
A Defensoria Pública de São Paulo e o MP-SP se manifestaram contra o pedido da prefeitura paulistana. Para os defensores públicos, o pedido é extremamente vago, amplo e perigoso, sem dar possibilidade de defesa às pessoas abordadas.
A Defensoria argumenta que a Lei Antimanicomial (Lei Federal 10.216/2001) limita a internação compulsória quando outras tentativas de tratamento forem insuficientes. Diz ainda que essa medida deve ser excepcional, com laudo médico prévio, e que o pedido afronta as leis federais 8.080/90 e 11.343/06.
A primeira, que rege os princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), determina a preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral. Já a segunda, que é a Lei de Drogas, garante o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, especialmente à sua autonomia e liberdade, com respeito aos usuários e dependentes de drogas.
Leia o convite para o ato público:
A atuação das organizações públicas, inclusive do sistema de Justiça, nas operações recentes na região da Cracolândia, na cidade de São Paulo, serão tema de um Ato Público e Debate realizado por diversas instituições, entre elas o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), no dia 1 de junho, às 17h, no Largo General Osório (bairro da Luz).Além do IDDD, a atividade reunirá em praça pública representantes da Associação Juízes para a Democracia (AJD), do Centro Acadêmico XI de Agosto (da Faculdade de Direito da USP), do Centro de Pesquisa e Extensão em Ciências Criminais, da Cia. Pessoal do Faroeste, do Conselho Municipal de Política sobre Drogas e Álcool (Comuda), do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), da Ouvidoria-Geral e do Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e da Plataforma Brasileira de Política de Drogas (PBPD).Os representantes das organizações pretendem denunciar arbitrariedades e violações de Direitos Humanos que vêm sendo observadas desde a operação policial realizada no último dia 21 de maio, que cumpriu diversos mandados de prisão e se desdobrou em uma série de ações judiciais nas quais se cogita o uso de internações forçadas para usuárias e usuários de crack da região."
Revista Consultor Jurídico, 31 de maio de 2017.
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