sexta-feira, 8 de outubro de 2010

População carcerária

Desde a derrocada do Estado de Bem-Estar Social, é comum ouvirmos a enunciação de uma cultura do controle e do inchaço do sistema penal. Loïc Wacquant, sociólogo e estudioso de políticas criminais, é um dos teóricos que identifica esta “hipertrofia do Estado Penal”, em que o aparelho punitivo do Estado assume as conseqüências das desigualdades sociais.
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Wacquant demonstra esse fenômeno nos EUA, mas no Brasil temos um processo parecido, guardadas suas especificidades. Segundo dados publicados no Jornal Estado de São Paulo (29/09), as prisões brasileiras possuem 494.598 pessoas, sendo a terceira maior população carcerária do mundo, perdendo somente apenas dos Estados Unidos e da China. Os EUA, em 2000, atingiu o número de 2 milhões de presos e 7 milhões, em 2006, dados publicados na Folha. Utilizando a expressão de Wacquant, os EUA entraram na era do “big government” carcerário.
Essa avaliação da população carcerária brasileira foi realizada no seminário Justiça em Números pelo coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o juiz Luciano Losekann. Para ele, o problema desse inchaço está relacionado com a falta de planejamento dos tribunais no âmbito da justiça criminal.
O aumento do número de pessoas presas foi acelerado, nos últimos cinco anos, houve um crescimento de 37%, o que representa 133.196 pessoas a mais nas penitenciárias. Outro ponto ainda mais problemático são os presos provisórios, 44% do total, segundo dados do Ministério da Justiça. São 219.274 pessoas presas que aguardam na prisão o julgamento de seus processos. Para Losekann:“O uso excessivo da prisão provisória no Brasil como uma espécie de antecipação da pena é uma realidade que nos preocupa. Os juízes precisam ser mais criteriosos no uso da prisão provisória”.
O aumento da população carcerária não é explicado pelo aumento da criminalidade. Esse maior encarceramento simboliza uma política criminal, que traz sérias conseqüências, como a superlotação e os conflitos internos nas prisões. A taxa de ocupação dos presídios brasileiros é de 1,65 preso por vaga, o que deixa o país atrás apenas da Bolívia, cuja taxa é de 1,66. “A situação nos presídios levou o Brasil a ser denunciado em organismos internacionais. Falta uma política penitenciária séria”, relata Losekann. Na lista de estados que mais encarceram estão: São Paulo, primeiro lugar, seguido de Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.
Como se trata de um problema sistêmico, a insuficiência de vagas nas unidades prisionais gera outros problemas, 57.195 pessoas estão cumprindo pena em delegacias, que não possuem infraestrutura adequada. Para tentar melhorar esse quadro, os 91 presidentes de tribunais realizarão uma ação para reduzir a zero o número de presos em delegacias.
Sobre perfil dos detentos brasileiros, Losekann destacou o tráfico de drogas responde por 22% dos crimes cometidos pelos presidiários. Entre as mulheres esse índice sobre para 60%. Esses dados revelam a seletividade do sistema penal, nas periferias, os jovens envolvidos com o tráfico são os que mais morrem em confrontos e as mulheres, muitas vezes cúmplices de seus companheiros, sofrem repressão do Estado. Todos marginalizados da sociedade, que estão longe de serem os grandes controladores do tráfico internacional de drogas ou os que mais ganham com ele.
Debates, como a descriminalização das drogas, cada vez mais devem ser travados entre sociedade e as autoridades públicas, a fim de recuperarmos esse quadro penitenciário tão alarmante.

Fonte: O Estado de S. Paulo (29/09/10); Folha Online.

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