Por ter confirmado a validade da Lei da Anistia, em 2010, o Supremo Tribunal Federal foi criticado pela Human Rights Watch em relatóriopublicado nesta quinta-feira (18/1). "A Corte Interamericana de Direitos Humanos considerou essa decisão do STF como uma violação das obrigações do Brasil sob o direito internacional", diz a entidade.
A ONG defende que os abusos cometidos por autoridades durante a ditadura militar devem ser resolvidos, mas essas elucidações encontram resistência no Judiciário.
De acordo com a entidade, mais de 40 ex-agentes do regime militar foram denunciados por assassinatos, sequestros e outros abusos contra os direitos humanos.
Mas o Judiciário brasileiro rejeitou a maioria dos casos e "o Supremo Tribunal Federal suspendeu dois, pendendo o reexame da aplicação da Lei de Anistia", lamenta a Human Rights Watch.
A HRW é uma organização internacional sem fins lucrativos voltada à proteção dos Direitos Humanos. Seus recursos vêm de doações de pessoas físicas e jurídicas, contribuições governamentais, da realização de eventos e da organização de publicações.
Polícia que mata e morre
O crescimento de 26% no número de assassinatos cometidos por policiais em 2016, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também não escapou das críticas da ONG. Por outro lado, o alto número de policiais mortos no mesmo ano (437) também foi citado. “A grande maioria deles fora de serviço”, ressalta.
Um dos exemplos lembrados pela ONG foi a execução de dez trabalhadores rurais no Pará por policiais. Os agentes de segurança alegaram que atiraram porque foram atacados, mas testemunhas e dados da perícia, segundo a Human Rights Watch, indicam que houve execução.
A entidade também criticou o uso ostensivo de tropas militares para policiamento urbano e a mudança da lei brasileira que impede os membros da Forças Armadas de serem julgados pela Justiça comum caso matem algum civil durante essas operações.
“De acordo com as normas internacionais, execuções extrajudiciais e outras violações graves de direitos humanos devem ser processadas e julgadas na Justiça comum”, afirma a ONG.
A Human Rights Watch traz ainda recortes das duas maiores capitais brasileiras (São Paulo e Rio de Janeiro) sobre assassinatos cometidos por agentes de segurança pública. A capital paulista é citada por causa das 494 mortes causadas por policiais entre janeiro e setembro do ano passado. Esse total representou um aumento de 19% em relação ao mesmo período de 2016.
Já no RJ, a ONG cita que 1.035 pessoas foram mortas por policiais em serviço entre janeiro e novembro. Esse número resultou num aumento de 27% em relação a 2016.
“Enquanto algumas das mortes causadas por ação policial resultam do uso legítimo da força, outras não. A Human Rights Watch documentou dezenas de casos na última década nos quais havia evidência crível de uma execução extrajudicial ou um acobertamento que não foram devidamente investigados ou denunciados”, diz.
Caos carcerário
A Human Rights Watch também destaca em seu relatório as péssimas condições oferecidas aos presos brasileiros. Lembrando que mais de 726 mil pessoas estão presas no Brasil, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça, a ONG reforça que as prisões brasileiras são “extremamente superlotadas, com 197% da capacidade — isto significa dois presos por vaga disponível”.
“A superlotação e a falta de pessoal tornam impossível que as autoridades prisionais mantenham o controle de muitas prisões, deixando os presos vulneráveis à violência”, complementa. Lembra ainda das rebeliões de janeiro de 2017 e de outubro de 2016, que terminaram com centenas de mortos.
Os serviços de assistência jurídica e de saúde são classificados como “deficientes” pela ONG em muitas prisões, além da falta de oportunidades de ressocialização dos egressos do sistema prisional. “Os presos provisórios são frequentemente mantidos juntos com presos condenados, em violação aos padrões internacionais e à lei brasileira.”
As audiências de custódia são mencionadas pela Human Rights Watch como uma medida positiva. Porém, a ONG lembra que essa iniciativa não abrange todo o Brasil. “De acordo com o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), em apenas cerca de 40% das comarcas os detidos são apresentados sem demora a juízes após a prisão, conforme é exigido pelo Direito internacional.”
Afirma também que, sem as audiências de custódia, os presos acabam esperando meses até serem apresentados a um juiz. “No Brasil, em junho de 2016, 40% dos presos aguardavam julgamento. Até a data de elaboração deste relatório, o Congresso avaliava um projeto de lei para tornar as audiências de custódia obrigatórias em todo o país”, diz.
Revista Consultor Jurídico, 18 de janeiro de 2018.
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