quarta-feira, 27 de abril de 2011

TJ do Rio tranca Ação Penal contra motorista bêbado

Apesar de parte das Câmaras Criminais no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro já ter aderido ao posicionamento de que é necessária a demonstração do perigo concreto para levar adiante Ação Penal contra o motorista flagrado bêbado ao volante, o tema ainda não está pacificado na Corte fluminense. Com o objetivo de não retardar o andamento do processo, a 7ª Câmara Criminal decidiu trancar a Ação Penal a que um motorista que, depois de se submeter ao teste do bafômetro, foi denunciado devido ao teor de álcool encontrado no sangue, superior ao permitido por lei.
A relatora do Habeas Corpus apresentado pelo motorista, desembargadora Marcia Perrini Bodart, lembrou que dispositivos da Lei 11.705/2008, que alterou o Código de Trânsito, está sendo questionado no Supremo Tribunal Federal. Entre eles, o que ocasionou a mudança no artigo 306. A redação atual do dispositivo estabelece que é crime "conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência".
"Resguardado o meu posicionamento, entendo que, por força do artigo 5º, LXXVIII, da Constituição da República, o paciente [motorista] possui direito à solução, ou no mínimo à apreciação, de sua demanda em prazo razoável", disse. Para não causar prejuízo ao réu, continua a desembargadora, "resta-me aderir ao entendimento da maioria dos integrantes desta Câmara no sentido de que para a configuração do crime previsto no artigo 306 da Lei 9.503/97, há necessidade de que o motorista dirija de tal sorte que exponha a dano a incolumidade pública".
A denúncia apresentada contra o motorista diz que ele conduzia o veículo de madrugada por Ipanema, na Zona Sul do Rio, com teor de álcool de 0,51 miligrama por litro de sangue. Pela lei, a quantidade não pode ultrapassar 0,3 miligrama por litro. Como a denúncia não especifica em que situação o motorista foi abordado, limitando a apresentar o resultado do exame, a 7ª Câmara Criminal entendeu que a peça não atende aos requisitos do artigo 41, do Código de Processo Penal. "A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas", diz o artigo 41.
"Inegável que o legislador ordinário quis reduzir as trágicas estatísticas da criminalidade no tráfego viário, e prevení-las ao efetuar as alterações contidas no Código de Trânsito Brasileiro", observa a desembargadora Marcia Perrini. A tentativa do legislador, diz, foi reduzir os índices de mortes e danos no trânsito. "Contudo, violou princípios constitucionais, tais como o da presunção de culpabilidade e da razoabilidade", disse, citando Damásio de Jesus.
Constitucionalidade
Na decisão, a desembargadora também afirmou que "a arguição incidental de inconstitucionalidade é cabível no âmbito do Habeas Corpus, porque existe ameaça, ainda que indireta, à liberdade individual de ir e vir". O juiz, observa Perrini, exerce um papel importante no controle e aferição da validade da norma à luz dos ditames constitucionais.
A desembargadora citou, ainda, a Súmula Vinculante 10 do Supremo Tribunal Federal, que prevê: "viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte".
Para a desembargadora, a competência para analisar a matéria é do Órgão Especial do TJ do Rio. Logo, conclui, se a Câmara reconhecer a violação a esses princípios constitucionais deverá afetar o julgamento ao Órgão. Entretanto, a 7ª Câmara Criminal não tem entendido nesse sentido.
Lei Seca
Desde que entrou em vigor, em 2008, a Lei Seca tem sido alvo de constantes polêmicas. No Rio de Janeiro, a fiscalização tem sido rigorosa. As blitz são constantes nas vias da cidade.
No TJ fluminense, várias Câmaras já se posicionaram pelo trancamento da Ação Penal quando a denúncia não descreve o perigo, ainda que remoto, que o motorista flagrado com teor alcoólico superior ao permitido representou. Não há, nas denúncias contra motoristas flagrados nessas blitz, demonstração do modo como o infrator estava dirigindo, já que o afunilamento do trânsito provocado pela barreira faz com que os condutores dos veículos diminuam a velocidade.
Os desembargadores, que se alinham ao entendimento de que é necessária a demonstração do perigo concreto, explicam o trancamento da Ação Penal não abarca a seara administrativa. Os motoristas flagrados com teor de álcool acima do permitido por lei continuam a ser punidos. Entretanto, quando a denúncia não descreve o perigo concreto, o motorista não será punido criminalmente. O artigo 306, do Código de Trânsito, estabelece pena de "detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor" para o motorista flagrado dirigindo embriagado.
No Superior Tribunal de Justiça, há a discussão sobre os métodos de aferição da embriaguez. Uma pessoa pode ser acusada de dirigir bêbada sem ter feito exame de sangue nem o teste do bafômetro? A pergunta ainda está sem resposta. O ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do STJ, determinou a suspensão de todos os recursos que questionam o exame clínico para e constatar a embriaguez ao volante.

Clique aqui para ler a decisão.

Revista Consultor Jurídico, 23 de abril de 2011

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