quarta-feira, 20 de abril de 2011

Sensação de (in)segurança

O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) divulgou, no final de março, resultados de pesquisas realizadas para verificar a percepção dos brasileiros em relação ao desempenho do Estado. Esses estudos fazem parte do SIPS, Sistema de Indicadores de Percepção Social, e podem permitir que o Estado atue de forma mais eficaz, focando em pontos específicos das demandas da população e melhorando o planejamento, implementação e avaliação de políticas.
No estudo sobre o tema “Segurança Pública”, foram entrevistados moradores das cinco regiões do Brasil. Os participantes da pesquisa responderam perguntas sobre a sensação de segurança, considerando o medo que tinham (ou não) de serem mortos por homicídio, sobre a confiança no trabalho desenvolvido pelas polícias militar e civil de sua região. A qualidade do atendimento oferecido pelos policiais também foi avaliada.
Em todas as regiões, mais de metade das pessoas alegou ter “muito medo de assassinato”, sendo norte e nordeste as mais inseguras – respectivamente, 92% e 94% da população tem (muito ou pouco) medo. Coincidentemente, estas são as áreas com as maiores taxas de homicídio doloso por 100 mil habitantes: o nordeste apresenta 29,3 homicídios/ 100 mil habitantes, praticamente o mesmo que o norte, com 29,5 homicídios/ 100 mil habitantes.
Mesmo não apresentando um patamar alto de sensação de segurança, o sudeste possui o menor índice de homicídios dolosos do país: são 16,3 por 100 mil habitantes. A partir daí, verifica-se que, apesar de estamparem a maioria das manchetes sobre criminalidade violenta nas mais diversas mídias nacionais, estados como Rio de Janeiro e São Paulo não são, de fato, os mais violentos. É no Espírito Santo que se verifica a taxa mais alta, são 57,9 homicídios/ 100 mil habitantes – menor apenas que a de Alagoas, que é de 63,3 homicídios/ 100 mil habitantes.
O relatório sobre o assunto revelou, ainda, que a maioria dos brasileiros não confia no trabalho policial. Os entrevistados deveriam classificar o nível de sua confiança nas polícias de seu estado de acordo com os quesitos: não confia, confia pouco, confia e confia muito. Em nenhuma região do país, mais que 6% da população afirmou confiar muito.
Confia muito
Confia
Confia pouco
Não confia
Centro-Oeste
4,30%
37,05%
34,20%
24,45%
Nordeste
5,80%
24,10%
43,45%
26,70%
Norte
4,45%
26,15%
47,35%
22,00%
Sudeste
3,00%
21,80%
45,10%
30,05%
Sul
3,40%
28,00%
43,95%
24,65%
Como mostra a tabela, extraída do site do IPEA*, a região sudeste é a que apresentou o menor índice de plena confiança: apenas 3% dos entrevistados optaram por “confia muito”. Enquanto 21% assinalaram confiar nas polícias, os indicadores de baixa confiança - “confia pouco” e “não confia” - somaram mais de 75% das respostas. Trata-se da região que mais gasta com segurança pública (R$ 248,89 por habitante) e possui quantidade de policiais se aproxima da média nacional (273 policiais).
O nordeste se destaca como local em que há maior índice de confiança nacional, ainda que esteja longe de ser elevado (apenas 5,8%). No entanto, também é possível notar que o nível de menor confiabilidade, 70%, se aproxima do apresentado pelo sudeste. A proporção de agentes policiais está próxima à média nacional. No entanto, a área é que apresenta menor gasto per capita com segurança pública (R$ 139,60).
Assim como no nordeste, na região sul, os investimentos em segurança pública estão abaixo da média (sul gasta cerca de R$ 172,75 por habitante). Entretanto, o grau de segurança de seus moradores é bem diferente: é o mais alto verificado, mesmo com o número de efetivo policial menor que as demais regiões brasileiras e com taxas de homicídio doloso dentro da média.
Os dados da pesquisa e as informações estruturais (despesas com segurança pública e número de policiais por habitante) não estão, necessariamente, relacionados de forma direta. Em outras palavras, não é certo que aumentar gastos com segurança resulte em maior índice de confiança da população no trabalho policial ou implique redução da sensação de insegurança. Esta relação é bastante complexa e varia de acordo com as características e necessidades de cada região.
No norte e no nordeste, por exemplo, percebe-se que a sensação de insegurança está ligada aos altos índices de criminalidade violenta. Já no centro-oeste, há elevada taxa de homicídios, mesmo com investimentos em segurança e disponibilidade de policiais muito acima da média. Percebe-se, assim, que traçar objetivos relacionando os fatores acima expostos de maneira simplista pode levar a resultados pouco significativos, sendo necessária uma análise cuidadosa para que haja um aprimoramento real da ação do Estado nessa área.
Em São Paulo, houve um investimento governamental no âmbito da segurança pública: foram aposentados os revólveres calibre 38, conhecidos como “três-oitão”. Usadas desde os anos 1920, essas armas deram lugar à pistola .40, a qual é de uso restrito e, segundo a polícia, mais moderna e eficiente. De acordo com o comandante-geral da Polícia Militar, Álvaro Camilo, a pistola tem um maior poder de impacto contra o criminoso e, ao mesmo tempo, apresenta menor risco de projétil transfixar o alvo e acertar terceiros.
Partindo de dados como estes, não se sabe se a parcela da população paulista que diz ter pouca ou nenhuma confiança no trabalho policial vai mudar sua opinião, ou até se sentir mais segura agora que sabe que foram reduzidas as chances de ser atingida acidentalmente em um tiroteio (depois que a munição já atingiu o “bandido”). Paulo Sette Câmara, especialista em segurança pública, criticou a medida. Em sua opinião, a PM deveria investir em armas não letais, considerando que a maioria das ocorrências é de casos simples.
Relacionar a percepção social em relação à sensação de segurança, investimentos do governo e quantidade de policiais – ou o tipo de armas que estes usam – é uma tarefa difícil e com uma grande margem de erro, uma vez que há inúmeros fatores envolvidos. Levando em conta as particularidades de cada local, medidas como aumentar o número de policiais ou armá-los com dispositivos mais “eficazes” não levará necessariamente à redução nas taxas de criminalidade.
Cabe ressaltar, ainda, que o modo como as pessoas percebem a violência varia de acordo com o nível de escolaridade, faixa etária, renda, etc. A maior desconfiança parte de pessoas com mais instrução e de jovens. Há ainda que se considerar a influência exercida pelos meios de comunicação na sensação de medo da população. Casos de tragédia e violência são expostos de forma exaustiva e, não raras vezes, escandalosa, repercutindo uma sensação de insegurança generalizada.
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O recente ataque à escola do Rio de Janeiro, que levou à morte 12 adolescentes e feriu outros 12, gerou grande comoção pública e suscitou muitas discussões. Questões sobre políticas públicas na área da educação, pertinência da proibição do comércio de armas, segurança nas instituições de ensino e até bullying têm sido debatidas e podem render importantes frutos.
Contudo, vale notar que, depois do chamado “massacre” (e da cobertura implacável dos meios de comunicação), crianças e adolescentes, inclusive de outros estados, declararam à imprensa que estavam com medo de ir à escola. O temor não partia apenas das crianças, mas dos pais. O acontecimento conduziu as pessoas a um pânico coletivo, levando-as a tratar como regra uma ocorrência isolada. É óbvio que existem chances de que acontecimentos como esse se repitam e pelos mais diversos motivos. Mas antes que a sociedade fique paralisada pelo medo, seria interessante refletir sobre as questões levantadas nesta terrível ocasião e tentar encontrar meios para melhorar tanto a segurança quanto a educação no país.
*Para ver o relatório do SIPS na íntegra, acesse:


IBCCRIM. 

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