sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Legalização da maconha: tema polêmico é alvo de debate na CDH


O cultivo de maconha para uso medicinal deve ser liberado no Brasil? E o uso recreativo? A eventual legalização da venda dessa droga pode ajudar a reduzir os índices de criminalidade e desinchar o sistema prisional? Essas foram algumas das perguntas que permearam audiência pública realizada nesta quinta-feira (26) pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). O tema dividiu opiniões em relação a possíveis mudanças nas leis e às consequências que elas podem causar.
O debate foi proposto pelo senador Sérgio Petecão (PSD-AC), com objetivo de instruir a Sugestão Legislativa (SUG) 25/2017, que trata da descriminalização do cultivo da maconha para uso pessoal. O senador é o relator da proposta que teve origem em uma ideia legislativa proposta pelo cidadão Gabriel Henrique Rodrigues de Lima, de São Paulo, no Portal e-Cidadania.
Único ponto a encontrar convergência no debate foi a liberação do uso medicinal da maconha. Atualmente, para utilizar uma substância ou planta como medicamento no Brasil é necessário obter aprovação da Anvisa, que autoriza o uso de medicamentos à base de substâncias presentes na Cannabis assim como a importação. Contudo, a Anvisa ainda estuda a regulação do cultivo para fins medicinais. Mas decisões da Justiça já autorizaram algumas famílias a plantarem pés de maconha em casa.
Médicos, psicólogos, pedagogos e parentes de pessoas que fazem uso medicinal relataram os benefícios terapêuticos do uso da maconha para alguns indivíduos com epilepsia e autismo e defenderam a urgente liberação do cultivo para consumo próprio.
Segundo Cidinha Carvalho, presidente da Associação de Cannabis Medicinal (Cultive), muitas famílias não têm condições de importar remédios do exterior e lutam para conseguir a autorização para cultivar maconha. Ela relatou que muitos médicos ainda não receitam substâncias contidas na erva, o que torna a tarefa ainda mais difícil. Ela observou ainda que existem diversos tipos de maconha e que as reações são diferentes para cada pessoa, por isso é importante a possibilidade de cultivar em casa:
— O autocultivo permite buscar a melhorar resposta terapêutica. Bloquear o autocultivo para o paciente é a mesma coisa que dar uma sentença de sofrimento ou de morte para ele porque você não está permitindo que ele busque a melhor resposta terapêutica para a dor ou a doença. Cultivar não pode ser crime. Lutar pela vida não pode ser crime — disse.
Apesar de concordar com o uso medicinal da maconha, a jornalista Andreia Salles de Souza, que é membro do Movimento Brasil Sem Drogas, teme que o cultivo caseiro abra brecha para que mais pessoas tenham acesso à droga:
— No Estado do Colorado, a venda da droga é proibida para menores de 21 anos. Mesmo assim, sete em cada dez adolescentes em tratamento contra dependência química admitiram ter usado “maconha medicinal” de outra pessoa e, em média, isso ocorreu 50 vezes por ano — apontou.
Guerra às drogas
Defensores da regulamentação da maconha pedem que a planta seja descriminalizada, ou seja, que o uso não seja tratado como crime. Segundo eles, a atual política de combate às drogas não surtiu o efeito esperado e acabou sendo responsável pelo encarceramento em massa, principalmente de pobres e negros das periferias. É o que sustenta  Max Maciel, pedagogo e coordenador da Rede Urbana de Ações Socioculturais (Ruas). Segundo ele, 69% das pessoas que estão no sistema penitenciário brasileiro foram presas por portar menos de 200 gramas de entorpecentes, algo que é liberado em vários países como a Espanha.
— Não se discute ainda que o debate sobre drogas tem um fator de desigualdade social.  A guerra às drogas não funcionou. Alguém acha que a gente fabrica cocaína nas periferias? As drogas pousam em fazendas de gente por aí. Voam em helicópteros — disse.
O presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) e Secretário Executivo da Plataforma Brasileira de Política de Drogas, Cristiano Maronna, ressaltou que em entrevista recente o traficante Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, afirmou que o narcotráfico financia campanhas políticas no Brasil.
— A quem interessa manter as drogas na ilegalidade? — questionou.
Em resposta, Paulo Fernando Mello da Costa, da Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família, sustentou que a legalização não vai diminuir os índices de criminalidade:
—  A legalização não acaba com o crime, força o crime organizado a sair do tráfico e ir para outra atividade — disse.
Já Rodolfo Queiroz Laterza,  diretor da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol), admitiu que a atual política de combate às drogas não tem dado certo, mas avaliou que a liberação da maconha não pode ser feita sem investimento na prevenção e no tratamento.
—  A descriminalização sem esse tripé: redução de danos, conscientização e prevenção vai fracassar — disse.
A regulamentação da maconha é para professora da Universidade de Brasília (UnB) Andrea Gallasi um caminho sem volta. Ela argumentou que as pessoas usam drogas, mesmo elas sendo proibidas e que essa restrição só leva ao consumo de produtos sem qualidade e que podem prejudicar ainda mais severamente o cidadão. Ela concordou que o investimento em educação e em campanhas de conscientização são a melhor forma de prevenção e citou como exemplo a redução no consumo de cigarros no Brasil.
— Será que o Brasil vai legalizar a maconha? Essa pergunta eu não faço mais. A pergunta é "quando". Porque isso vai acontecer — afirmou.

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