Por Neemias Moretti Prudente1
O tráfico de pessoas é um fenômeno mundial que tem sido vivenciado por milhões de pessoas de diferentes lugares do mundo. O tráfico mundial de pessoas se encontra como a terceira maior forte de renda gerada pelo tráfico. Perdendo somente para o tráfico de armas e drogas.
A fim de enfrentar essa prática, o Brasil passa agora a ter um marco regulatório contra o tráfico de pessoas. Foi publicada nesta sexta-feira (7) a Lei nº 13.344, de 6 de outubro de 2016, que “dispõe sobre a prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas”.2
Resultado da aprovação do PL nº 479/2012, a Lei gira em torno de três eixos: prevenção e repressão ao tráfico de pessoas; e atenção (proteção) às vítimas (art. 1º)
A nova Lei amplia as condutas enquadradas como tráfico de pessoas e endurece as punições para pessoas que cometem tráfico interno e internacional de pessoas. Antes dessa Lei, não havia uma legislação sogre tráfico de pessoas de forma mais abrangente, somente limitava-se a tipificar o tráfico de mulheres para fins de exploração sexual e o tráfico de crianças.
O texto (art. 13) acrescenta ao Código Penal o crime de “tráfico de pessoas” (art. 149-A) que, segundo a lei, é “agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso com a finalidade de: I) remover os órgãos, tecidos, ou parte do corpo das pessoas; II) submetê-la a trabalho em condições análogas à escravidão ou a qualquer tipo de servidão; III) adoção ilegal; IV) exploração sexual.”
Pelo texto, a pena prevista para o tráfico de pessoas é de 4 a 8 anos de prisão, além de multa. Essa punição pode ser aumentada caso o crime seja cometido por funcionário público ou contra criança, adolescente, idoso e deficiente, bem como se o agente prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica ou de superioridade hierárquica. Caso a vítima seja retirada do território nacional a punição também pode ser agravada. O texto também prevê casos em que a pena pode ser atenuada, tais como a condição de réu primário e não integrante de organização criminosa.
O Lei exige dois terços (2/3) de cumprimento da pena para que a pessoa que tenha cometido o crime tenha direito à liberdade condicional (art. 12).
A proposta também prevê a possibilidade de apreensão, sequestro e indisponibilidade de bens que sejam provenientes da prática de tráfico de pessoas e isenta as vítimas de punição sobre a prática de crimes que tenham eventualmente cometido em razão desta condição (art. 8º). Além disso, a Lei prevê a criação de um banco de dados de infratores e vítimas de tráfico a fim de evitar novos casos (art. 10).
A Lei também prevê medidas para a prevenção de novos casos de tráfico de pessoas. Entre elas, a criação de políticas públicas interdisciplinares que envolvam profissionais de saúde, educação, trabalho, segurança pública, justiça, desenvolvimento rural, entre outras áreas. Outras formas de prevenir os crimes previstos no projeto são campanhas socioeducativas e de incentivo a projetos sociais de prevenção ao tráfico de pessoas (art. 4º).
Como forma de repressão, a Lei estabelece a cooperação entre órgãos dos sistemas de justiça e segurança nacionais e internacionais, bem como da formação de equipes conjuntas de investigação (art. 5º).
O texto prevê ainda medidas de atenção às vítimas do tráfico de pessoas. Estabelece uma série de assistências, como jurídica, social e de saúde, bem como prevê o pagamento de seguro desemprego àquelas que tiverem sido submetidas a condição análoga à de escravo ou a exploração sexual. Também prevê acolhimento e abrigo provisório para a vítima desse tipo de crime. Ainda prevê, entre outras coisas, a estruturação de uma rede de atendimento às vítimas e de enfrentamento ao problema, envolvendo todas as esferas de governo e organizações da sociedade civil, além do fortalecimento das ações nas regiões de fronteira, consideradas mais vulneráveis (arts. 3º, 6º e 7º).
O texto também estabelece alguns princípios e diretrizes que deverão ser atendidos no enfrentamento ao tráfico de pessoas (arts. 2º e 3º).
Também restou instituído o 'Dia Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas', a ser comemorado, anualmente, em 30 de julho (art. 14).
A Lei, que constitui um marco regulatório contra o tráfico de pessoas, foi aprovado na forma do texto original aprovado no Senado, em vez do substitutivo da Câmara. A lei atende a recomendações da CPI do Tráfico de Pessoas de 2011 e se adapta ao Protocolo de Palermo, documento da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o tráfico transnacional de pessoas, do qual o Brasil é signatário.
Ficamos felizes que o Brasil tenha despertado para essa realidade. Mas apesar do avanço na legislação, ainda há um longo caminho a percorrer. Todos contra o Tráfico de Pessoas!
1 Professor de Direito Processual Penal e Legislação Penal Especial (IPE). Mestre em Direito Penal (UNIMEP/SP) e Especialista em Direito Penal e Criminologia (ICPC/UFPR). Graduando em Filosofia (UNINTER). E-mail: neemias.criminal@gmail.com.
2 A Lei encontra-se disponível para consulta em: <http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?jornal=1&página=2&data=07/10/2016>. Acesso em: 07/10/2016.
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