A denúncia de crime societário não pode ser genérica, sendo necessária a descrição individualizada da conduta de cada acusado. Seguindo esse entendimento, o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes concedeu Habeas Corpus e extinguiu ação penal do Ministério Público contra quatro sócios de uma editora, acusados de crime contra a ordem tributária.
De acordo com o ministro Gilmar Mendes, antes o STF mitigava a denúncia precisa nos crimes societários, contudo, esse entendimento vem sendo alterado na corte. O relator citou diversos precedentes que consideraram inadmissível a denúncia genérica para crimes societários.
"Assim, mesmo que nesses casos sejam de difícil descrição os pormenores das atividades e da responsabilidade de cada um dos denunciados, é fundamental que o mínimo descritivo dos atos ilícitos praticados esteja contido na denúncia para permitir o recebimento", explicou o ministro.
Os sócios administradores da editora foram acusados pelo Ministério Público pela suposta prática de crime contra a ordem tributária (artigo 1º, inciso I da Lei 8.137/90) por prestarem declarações falsas de faturamento ao Fisco, com o objetivo de reduzir o valor tributável.
Após a denúncia ser recebida pela Justiça Federal de São Paulo, a editora ingressou com Habeas Corpus no Tribunal Regional Federal da 3ª Região que manteve o recebimento. De acordo com o TRF-3, a denúncia descreve de forma adequada os fatos imputados aos acusados, com base em contrato social que os aponta como os responsáveis pela administração da empresa. "Ademais, tratando-se de delito de autoria coletiva, não se exige que a denúncia individualize minuciosamente a conduta de cada denunciado", afirmou a corte regional.
Representada pelo advogado Alberto Zacharias Toron, do Toron, Torihara e Szafir Advogados, a editora tentou ainda anular a decisão no Superior Tribunal de Justiça, que também negou o pedido de Habeas Corpus por considerar suficiente a descrição dos crimes apontadas na denúncia.
O STJ considerou também a jurisprudência da corte, no sentido de que, "nos crimes societários, não se exige a descrição individualizada da conduta de cada acusado, bastando a narrativa do fato delituoso e a indicação da suposta participação do agente, possibilitando-se o exercício da ampla defesa".
A defesa da empresa ingressou então com HC no Supremo Tribunal Federal. No pedido, Toron alegou constrangimento ilegal, tendo em vista a falta de pressupostos mínimos da denúncia. Segundo o advogado, a denúncia é genérica contra todos os sócios com alegados poderes de gerência.
Considerando o novo entendimento do STF, o ministro Gilmar Mendes determinou a extinção da ação penal. Em sua decisão, o ministro explicou que em matéria de crimes societários, a denúncia deve expor, de modo suficiente e adequado, a conduta atribuível a cada um dos agentes, de modo que seja possível identificar o papel desempenhado pelos denunciados na empresa.
O ministro explicou que dos seis sócios da empresa, quatro são qualificado como professores, se dedicando à profissão intelectual, não à atividade empresarial. "É muito provável que alguns dos acusados tenham figurado na administração da sociedade na crença de que estariam praticando atos legítimos de planejamento tributário, sem maior conhecimento das declarações fiscais", explicou o ministro.
Nesse contexto, segundo o ministro Gilmar Mendes, a acusação deveria ter identificado os efetivos responsáveis pelas declarações alegadamente fraudulentas oferecidas ao Fisco. "No entanto, o Ministério Público optou por simplesmente denunciar todos os seis sócios que figuram no contrato social como responsáveis pela gestão", complementou, considerando insuficiente a descrição das condutas dos denunciados e determinando a extinção da ação penal.
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HC 127.415
Revista Consultor Jurídico, 1 de outubro de 2016.
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