Dos 27 tribunais de Justiça e cinco tribunais regionais federais, apenas dois tratam a execução antecipada da pena de prisão, autorizada pelo Supremo Tribunal Federal, como obrigatória e automática: o TRF-1, com sede em Brasília e a maior abrangência territorial, e o TRF-4, com sede em Porto Alegre.
O enunciado do TRF-4 existe desde 2016 e tornou-se conhecido com a condenação do ex-presidente Lula a 12 anos e 1 mês de prisão, em janeiro deste ano, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Conforme a Súmula 122, “encerrada a jurisdição criminal de segundo grau, deve ter início a execução da pena imposta ao réu, independentemente da eventual interposição de recurso especial ou extraordinário”.
A 4ª Seção do tribunal, composta das turmas que julgam matéria penal, definiu a tese com base em quatro precedentes de 2016 — sem envolver famosos, os réus haviam sido condenados por tráfico internacional de drogas e operação ilegal de câmbio. No mesmo ano, o Supremo havia revisto a própria jurisprudência para autorizar a execução da pena depois da decisão de segunda instância e antes do trânsito em julgado.
“É de saudar a retomada da posição original da Suprema Corte. Antes mesmo da viragem paradigmática referida, esta 8ª Turma, por maioria, já sinalizava a necessidade de mudança”, declarou em um dos acórdãos o desembargador federal João Pedro Gebran Neto, mesmo relator da operação “lava jato” em segunda instância, ao definir regime fechado imediato a um homem condenado a 12 anos e 10 meses de prisão com base na Lei de Drogas.
A súmula vale para processos criminais da Justiça Federal originados no Paraná, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. Foi com base nesse verbete que a 8ª Turma definiu que Lula deveria ir para trás das grades assim que esgotasse a jurisdição da segunda instância.
Em liminar de 2017, porém, o ministro Celso de Mello, decano do STF, cassou uma decisão que determinava a execução provisória da pena por falta de motivação. O caso concreto era justamente uma prisão decretada pelo TRF-4 com base na mesma tese.
Na quarta-feira (4/4), durante o julgamento de um Habeas Corpus do ex-presidente Lula, o ministro Gilmar Mendes disse que a súmula é um dos exemplos da necessidade de se rever o novo entendimento do Supremo. Segundo ele, o STF apenas autorizou a execução antecipada, mas diversos tribunais trataram a decisão como se ela tornasse obrigatória a prisão depois da decisão de segundo grau e dispensasse o trânsito em julgado.
Manual
No TRF-1, são duas portarias que disciplinam o destino do réu com condenação confirmada em segundo grau, uma da 3ª Turma e outra da 4ª Turma, que julgam matéria penal, assinadas em 2017.
As normas definem que, quando a decisão colegiada for proferida, a secretaria de cada turma atestará nos autos a inexistência de recursos. Quando o entendimento for unânime e não houver embargos infringentes, o presidente mandará expedir carta de guia de execução provisória, “endereçada ao juízo de origem para que deflagre o cumprimento da sanção penal, remetendo-a à vara de Execução da Justiça Estadual ou processando-a, acaso seja de sua competência”.
As portarias também citam entendimento do STF (HC 126.292), considerando suposto “efeito repetitivo”, e justificam a medida administrativa pela necessidade de uniformizar os trâmites no tribunal regional.
A 1ª Região da Justiça Federal abrange casos de competência federal em 14 estados: Acre, Amazonas, Amapá, Bahia, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima, Tocantins e o Distrito Federal.
Pelo país
Mesmo sem súmulas ou normas internas, outros tribunais do país afirmam que têm se baseado no Supremo para definir execuções antecipadas, como os tribunais de Justiça do Rio de Janeiro, da Paraíba, do Pará, do Paraná e de Santa Catarina.
Ainda há divergência de entendimento no Tribunal de Justiça de Minas Gerais: em março, a 2ª Câmara Criminal manteve um réu em liberdade por entender que, apesar do que diz o STF, o artigo 5º da Constituição Federal “é muito claro ao dispor que ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’”.
Segundo o colegiado, não cabe “reinterpretação daquilo que é literalmente compreendido, sob pena de se reescrever preceito tido, por força do art. 60, § 4º, IV, como cláusula pétrea por nossa Constituição da República”.
Revista Consultor Jurídico, 7 de abril de 2018.
Nenhum comentário:
Postar um comentário