Se a vítima não foi induzida a erro, tampouco houve obtenção de vantagem patrimonial ilícita em prejuízo alheio, não se pode falar em estelionato. O fundamento levou a 7ª. Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul a aceitar Apelação de um homem condenado por tentativa de estelionato no interior do Estado.
Ele tentou abastecer seu carro pagando com cheque que furtara, mas a compra não se consumou porque o dono do posto percebeu a irregularidade na grafia e avisou a polícia.
A relatora do recurso na corte, desembargadora Jucelana Pereira dos Santos, disse que a prova produzida nos autos não é suficiente para demonstrar que o réu induziu ou manteve alguém em erro (elementar do tipo do estelionato). É que, apesar de ter lançado mão de meio fraudulento, tentar pagar com cheque furtado, ele não causou prejuízo ao dono do posto.
A julgadora citou jurisprudência da própria câmara, da lavra do desembargador José Conrado Kurtz de Souza. O acórdão registrou o seguinte: ‘‘Caso em que a vítima, conhecedora da grande probabilidade de o cheque dado para o pagamento das mercadorias possuir origem ilícita, não o aceitou, tendo ela, inclusive, avisado o proprietário da cártula a respeito do fato, o qual confirmou a subtração de seu talão de cheques. Ausente prova da indução da vítima em erro, faz-se impositiva a absolvição".
Por consequência, o réu foi absolvido com base no artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal, já que o fato noticiado na denúncia não constitui infração penal. O acórdão foi lavrado na sessão de julgamento realizada dia 26 de fevereiro.
Letra diferente
A denúncia aponta que o réu, em companhia de um comparsa, tentou abastecer o seu veículo apresentando cheque furtado, preenchido, no valor de R$ 350. Só não conseguiu o seu intento porque o dono do estabelecimento conhecia a titular da conta e viu que não letra não conferia. Ele ligou para o marido da vítima e confirmou que o cheque fora furtado e preenchido por terceiro.
Com a recusa do cheque, os dois deixaram o posto, e o dono acionou a Brigada Militar. Mais tarde, ambos foram localizados com mais dois cheques (todos preenchidos), além de cartões bancários da mesma vítima. Acabaram presos em flagrante. Posteriormente, tiveram sua prisão preventiva revogada.
Com base no Boletim de Ocorrência, a Promotoria de Justiça apresentou denúncia contra os acusados. Eles foram denunciados por tentativa de estelionato com ajuda de outra — artigo 171, caput, combinado com o artigo 14, inciso II, na forma do artigo 29, caput (todos do Código Penal). No curso do processo, houve a cisão do feito, permanecendo neste apenas um dos réus.
Sentença condenatória
A juíza Ana Paula Della Latta, da Vara Judicial da comarca de São Marcos (RS), escreveu na sentença que a prova e a autoria do delito atribuído ao réu pelo Ministério Público ficaram evidenciados nos autos. O réu, assinalou, admitiu, na fase de interrogatório, que furtou os cheques do interior do veículo da vítima, preencheu-os e tentou passá-los adiante. O relato foi corroborado pelo depoimento dos policiais que efetuaram a apreensão do veículo e a prisão dos denunciado e seu comparsa.
Com isso, julgou procedente a denúncia do MP, nos termos em que apresentada. O réu acabou condenado a 4 meses e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto. Na dosimetria, a pena privatiza de liberdade foi substituída por restritivas de direitos, consistente na prestação de serviços à comunidade (uma hora de trabalho por dia de condenação). A julgadora o condenou, também, à pena pecuniária de 10 dias-multa — à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos.
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