segunda-feira, 16 de março de 2015

Pedido de acesso a delações durante inquérito gera polêmica entre advogados

Mesmo antes de o ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki aceitar os pedidos de abertura de inquérito contra políticos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e quebrar o sigilo das investigações, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), já havia requerido acesso aos trechos das delações premiadas obtidas na operação “lava jato” que o mencionam. Mas o debate sobre a viabilidade desse pedido vem gerando polêmica no mundo jurídico.
Para o advogado Pierpaolo Cruz Bottini, responsável pela defesa do deputado federal Arthur Lira (PP-AL) no caso, o pedido de Renan tem fundamento. De acordo com ele, a partir do momento que Teori abriu mão do sigilo, os dados do processo também deveriam ter sido disponibilizados aos acusados.
Bottini argumenta que os políticos devem ter acesso às delações relacionadas a eles porque são pessoas públicas, que estão sendo constantemente bombardeados pela imprensa. Segundo o criminalista, os investigados apenas não devem ter acesso a depoimentos que ainda estão sendo tomados dos delatores.
Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, advogado da ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney (PMDB-MA) e do ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão (PMDB-MA), concorda com Bottini. Ele afirma que toda autoridade pública deve ser notificada antes da abertura de inquérito, e que a PGR descumpriu a regra ao não fazê-lo nesse caso.
Como exemplo do procedimento, ele conta que já defendeu diversos políticos em casos que não foram divulgados porque, ao serem informados das acusações, eles esclareceram os pontos controversos e fizeram com que o Judiciário arquivasse os inquéritos.  
Citando a Súmula Vinculante 14 do STF, Kakay afirmou que os advogados tem que ter acesso a todos os elementos de prova produzidos pela polícia. Sem isso, não dá para preparar a defesa dos acusados. Como isso não está acontecendo no caso dos políticos envolvidos na “lava jato”, o advogado opina que “o direito de defesa está sendo ameaçado” na operação.
Para o criminalista Guilherme San Juan Araujo, sócio do San Juan Araujo Advogados, responsável pela defesa de dois investigados na operação, “é inviável o exercício da defesa sem o acesso amplo e irrestrito em relação à prova já produzida, sob pena de violar-se flagrantemente a ampla defesa”.
Divergência
O advogado e ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça Gilson Dipp (que não está defendendo ninguém no caso), autor do livro A Delação ou Colaboração Premiada:Uma análise do instituto pela interpretação da Lei (Ed. IDP), discorda de Bottini e Kakay — pelo menos em tese.

Segundo ele, a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013) estabelece que o conteúdo das delações premiadas só deve ser divulgado após o oferecimento da denúncia, e, às vezes, pode continuar em segredo mesmo após isso, em casos de escutas telefônicas ou quebra de sigilo bancário. Isso porque elas são um instrumento pré-processual de obtenção de provas, sem garantia de contraditório.
Assim, Dipp entende que os advogados podem requerer acesso ao conteúdo dos depoimentos, mas opina que o juiz não está obrigado a aceitar o pedido.
Revista Consultor Jurídico, 13 de março de 2015.

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