segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

“Quid Iuris”? Qual Direito?

*Wagner Dias Ferreira


A lembrança do professor Mafra (Faculdade de Direito da UFMG), na década de 1990, emergiu forte (porque a cada novo tema trazido à sala de aula ele proclamava o brocardo latino): “Quid Iuris”?

A carta do apóstolo Paulo aos Filipenses o apresenta como alguém que cumpria a Lei de Moisés. E ainda em Atos dos Apóstolos afirma ser ele romano de nascimento. Dessa forma, Paulo possuía dupla cidadania (Romana e Hebraica). Com isso, gozava de direitos especiais no império. Mas todo esse direito ele considerou “refugo” por causa da sua fé.

Hoje vivemos em uma sociedade onde a cada dia somos surpreendidos pelos poderes constituídos com a utilização dos mecanismos democráticos praticando atos e discursos que, mesmo constitucionais e legais, devem ser considerados refugo. Falta-lhes fraternidade e solidariedade com o ser humano vivo, livre e concreto do cotidiano.

A cristandade medieval fez com que, nos tempos modernos, preceitos da fé cristã se incorporassem nos discursos contemporâneos sem gerar comportamento das pessoas.

Hoje se vê pessoas que vivem completamente de acordo com as leis. São seres humanos “irrepreensíveis”. Mas não são solidários e não têm fraternidade. Essas pessoas não percebem que essa vida irrepreensível, como considerou Paulo, é mero refugo.

Viver a justiça de Cristo implica ser criticado, ser altamente questionado por sua forma de pensar e agir, e considerar toda essa legalidade e constitucionalidade como “refugo” se isso não atende a justiça, aquela que procede da fé.

Os noticiários têm trazido a informação de que Jane Fonda, já idosa e consagrada por sua atuação no cinema, está sendo presa por participar de protestos na defesa de suas convicções, mesmo quando vão contra a lei, em busca de estabelecer uma justiça advinda de fé em um mundo melhor. De outra sorte, governantes mundo afora estão proclamando a violência e facilitando o discurso de ódio.

Quando a Constituição da República reconheceu o princípio da solidariedade em seus fundamentos, também constante da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de que: “todos devem agir uns para com os outros em Espírito de Fraternidade” foi vedado no país o discurso do ódio e a promoção da violência.

Assim, as pessoas que, de qualquer forma se projetam com algum tipo de representação, têm o dever de agirem com solidariedade e fraternidade. E qualquer discurso ou ação que se afaste destes princípios deverá ser rechaçado na prática cotidiana brasileira.

Está na hora de as pessoas cuidarem do próximo. Abdicar de suas convicções, abandonar os discursos que trazem a segurança e tranquilidade e partir para a incerteza a fim de estabelecer a justiça que vem da fé. É necessário parar de fazer afirmações e proclamar convicções para questionar e buscar respostas, sempre que possível novas respostas.

Por isso, na boa lembrança do professor Mafra, “Quid Iuris”? Qual Direito? Que se iniciem os questionamentos, a fraternidade e a solidariedade.

*Advogado Criminalista


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