"Ó a higiene que tem para prevenir do coronavírus.” Assim presos que estão no CPP (Centro de Progressão Penitenciária) de Mongaguá, no litoral de São Paulo, mostram pias sem torneira, falta de água e privadas repletas de fezes.
Os vídeos obtidos pela Ponte são de banheiros e áreas em que os presos dormem. Em meio às denúncias de falta de higiene, eles mostram seus colchões. Segundo os presos, a falta de água é constante. “Isso que é higiene que nós temos. Olha a fossa, olha o esgoto. O tanque não tem torneira. A torneira é essa”, diz um preso, enquanto mostra uma garrafa PET de 2 litros com água. “Não joga que vai faltar”, alerta o outro.
O grupo também denuncia ter recebido comida dada pelo presídio com arroz “carnavalesco, que vem em bloco” e linguiça crua. Sem água, eles contam que não conseguem lavar os talheres, que são compartilhados. Em seguida, mostram as torneiras secas.
O presídio de Mongaguá tem capacidade para abrigar até 1.640 pessoas, mas abriga 2.170 presos no local, segundo contagem feita no dia 24 de março disponível no site da Secretaria de Administração Penitenciária.
‘Falta de água preocupa’
A Ponte mostrou os vídeos para a biomédica Lara Duarte Santi, que considerou aquele ambiente arriscado para o coronavírus. “Se alguém pegar, aí vai transmitir para os outros. É muito difícil que um contaminado não transmita aos outros”, alerta.
A profissional explica que nem todos que pegarem a doença ficarão em estado grave, mas serão transmissores do Covid-19. “Caso pegue em alguém que tem tuberculose, como citado, um HIV positivo ou problema cardíaco e diabetes, doenças comuns, fica complicado remover, ter estrutura de UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) para entubar e colocar em um respirador dentro de um presídio”, detalha.
Lara, que deu aula de epidemiologia por dois anos no Centro Formador da Cruz Vermelha de São Paulo, explica que a situação que mais chamou sua atenção no vídeo é a falta de água. “O que mais preocupou é falta de água que, junto do sabão para que se faça a higienização de mãos, são as principais medidas preventivas que temos de adotar”, explica.
Por outro lado, ela alerta para a fala dos presos de não terem como lavar as colheres que recebem suas comidas. “Se pode pegar o coronavírus por via oral justamente compartilhando utensílios e, ali, eles não têm como limpar”, afirma. “Não tendo água corrente, se alguém espirrar na mão e ela colocar na torneira, o vírus pode viver de 24 a 72 horas, tem uma durabilidade maior”.
A biomédica afirma que, apesar de imagem das fezes acumuladas chamar a atenção, elas especificamente só serão um vetor de coronavírus em caso de o preso estar contaminado. No entanto, os excrementos podem passar outras doenças que, somadas ao coronavírus, debilitam o sistema imunológico dos detentos.
“Esse vírus não pode ser considerado uma gripe, é outro tipo. Tem uma característica importante: consegue se adaptar para viver mais tempo fora do corpo, em superfície”, diz.
Contaminação e prevenção
Há ao menos um caso de coronavírus confirmado no sistema penitenciário, de um agente que atua no CDP (Centro de Detenção Provisória) de Praia Grande, também no litoral paulista, conforme fala do secretário Nivaldo Restivo ao Portal G1. Uma contaminação suspeita é de funcionário do Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário, que está afastado do serviço.
De acordo com o Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo, havia três confirmações de pessoas infectadas com a doença e outras três suspeitas até terça-feira (24/3). Além de Praia Grande e na capital, o outro possível infectado trabalha no CDP de Americana, no interior paulista. As suspeitas são de que duas funcionárias do CPP do Butantã, na zona oeste da capital paulista, e uma outra agente na Penitenciária Feminina de Sant’Ana, na zona norte. A SAP não confirma estes casos.
Para diminuir os riscos de proliferação do coronavírus, a secretaria proibiu as visitas aos presos e entrega de jumbo, sacola com itens de higiene, alimentação e remédios, feita presencialmente pelos parentes. As entregas são aceitas somente pelos Correios.
Além disso, afastou os funcionários que estão no grupo de risco (mais de 60 anos, grávidas e pessoas que possuem doenças agravadas pelo coronavírus, como problemas respiratórios, cardíacos e diabetes).
A Ponte questionou a SAP (Secretaria da Administração Penitenciaria), gerida pelo coronel Nivaldo Restivo neste governo de João Doria (PSDB), sobre as condições do presídio de Mongaguá e aguarda um retorno.
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