terça-feira, 1 de abril de 2014

Uganda e Brasil: visões bárbaras sobre sexo

É intolerável nas sociedades civilizadas


Uganda, no princípio de 2014, bem no estilo da política criminal cruel e vingativa, aprovou uma nova lei penal mais severa para punir a homossexualidade (até com prisão perpétua), que já é tratada como crime desde 2009. Visão bárbara sobre o sexo assim como sobre a lei penal. A moral sexual dos adultos não conta com capacidade suficiente para se transformar em bem jurídico-penal. O mundo todo civilizado (neste ponto) vem, há décadas, descriminalizando as relações homossexuais entre adultos. Na contramão da história se encontram Uganda e mais 35 países da África (alguns chegam a punir tal fato com pena de morte).
A justificativa para esse barbarismo reside no nacionalismo (tendo a religião como pano de fundo). Para rechaçar a cultura ocidental (que seria perniciosa), envereda-se para o campo da barbárie. Como bem mostrou editorial da Folha (26/2/14), “se o propósito é abominável, sua justificativa é um equívoco: historiadores atestam que comportamentos homossexuais faziam parte da vida de tribos africanas antes desse período”. É intolerável nas sociedades civilizadas (ou que se inclinam) para isso o conservadorismo dos fundamentalismos religiosos, que sobrevoam os ares dos EUA, da Europa, da África, do Brasil e de tantos outros lugares. Algumas intolerâncias (contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, a favor da “cura gay”, a favor da violência homofóbica etc.) são compatíveis tão-somente com a era pré-iluminista (pré-Voltaire, que foi um ardoroso crítico da intolerância religiosa, no século XVIII).
Mas para se deparar com culturas pré-iluministas, no entanto, não precisamos cruzar o Atlântico e visitar a África. Em pleno século XXI, para 65,1% (conforme pesquisa do Ipea – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), mulher que se “mostra” merece abuso, ataque, ou seja, merece ser estuprada; 91,4% da população concorda, de outro lado, que homem que bate na esposa tem que ir para a cadeia. Há aqui uma contradição: bater não pode, estuprar sim.
Os números são estarrecedores: o estupro como violação massiva dos direitos humanos é mais comum do que se imagina: a pesquisa projeta a ocorrência de 527 mil estupros em 2013 e mais da metade das vítimas tem menos de 13 anos de idade; 15% dos estupros foram cometidos por dois ou mais agressores; “há mulheres feitas para casar e outras para levar para a cama”. Barbárie ou civilização continua sendo o dilema do brasileiro!
Luiz Flávio Gomes
Publicado por Luiz Flávio Gomes
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz..

Nenhum comentário:

Postar um comentário