segunda-feira, 7 de abril de 2014

Segurança pública e a responsabilidade do Judiciário

Dois projetos de lei em tramitação no Congresso americano receberam destaque no editorial do The New York Times publicado em março passado[1].
Um deles, o Smarter Sentencing Act, prevê a flexibilização do modelo hoje adotado para crimes não violentos relacionados a drogas, para os quais se exige aplicação de penas mínimas, atualmente fixadas em 5, 10 e 20 anos. Pelo novo regime proposto, que permitiria, em certos casos, a fixação de penas abaixo do mínimo obrigatório, milhares de presos condenados por uso de drogas – especialmente o crack – estariam livres da prisão.
Em complementação, dispõe o projeto Recidivism Reduction and Public Safety Act que presos condenados por crimes de baixo potencial ofensivo poderiam reduzir suas penas por meio de créditos pela participação em programas educacionais, de capacitação profissional e de prevenção ao uso de drogas.
Destaca o jornal que esses dois projetos, caso aprovados, por certo darão significativo passo rumo à superação de décadas de história americana marcadas pelo encarceramento em massa, um dos temas mais controversos da política dos Estados Unidos.
Fato que desperta curiosidade nessas duas propostas é que elas estão sendo aceitas inclusive pela ala conservadora do Congresso. A explicação desse raro consenso sobre o tema reside, de acordo com a publicação, no impacto que o sistema prisional representa no orçamento americano: cerca de US$ 7 bilhões por ano, um quarto de todo o orçamento do Departamento de Justiça.
Justamente por esse motivo, diversos estados americanos já procuram adotar medidas semelhantes às ora discutidas em âmbito federal. No Texas, por exemplo, estado que mais encarcera nos Estados Unidos, os legisladores conceberam alternativas ao encarceramento, como tribunais especiais para julgar usuários de drogas e programas eficientes de combate à reincidência. Essa nova política resultou em expressiva diminuição da população carcerária, acarretando, até, o impressionante fechamento de três prisões estaduais, além da redução dos índices de criminalidade.
A conclusão do editorial é óbvia: a experiência que vem sendo adotada em alguns estados mostra que essas medidas apresentam impacto positivo não apenas no tocante à redução da reincidência e na diminuição do número de encarcerados – com a consequente destinação de presídios a infratores mais violentos –, como também na própria gestão de segurança pública.
Aqui no Brasil, também estamos a discutir possíveis ações para superação do quadro de barbárie em que se encontra o nosso sistema carcerário. E é exatamente na necessidade de tratarmos dessa questão de forma indissociável do macrossistema da segurança pública que há tempo venho insistindo.
Em recentes entrevistas a esta ConJur[2] e à Folha de S.Paulo[3], destaquei que a deficiência do sistema carcerário brasileiro deve ser abordada a partir da premissa de que esse problema é de responsabilidade de todos. Um eficaz plano de melhorias deve englobar o trabalho harmônico dos diversos entes estatais, além de ser tratado em conjunto com iniciativas voltadas à prevenção da reincidência, à efetiva atuação dos magistrados, à campanha de prevenção às drogas, entre tantas outras.
Em audiência pública sobre o sistema carcerário que promovemos recentemente no Supremo Tribunal Federal[4], foram relatadas diversas situações que deixaram evidente que há algo verdadeiramente absurdo na tragédia cotidiana do nosso sistema prisional. Ao lado da falta de vagas, foi constatado também que o controle de muitos presídios por facções criminosas é fato preocupante, que em muito tem contribuído para o retorno dos presos à criminalidade quando egressos do sistema.
Além disso, em face da escassez de estabelecimentos prisionais apropriados aos regimes aberto e semiaberto, é comum o cumprimento de penas integralmente em regime fechado ou em prisão domiciliar, sem observância da progressão de regimes prevista na Lei de Execução Penal. Em São Paulo, Estado com a maior população carcerária do país, há aproximadamente seis mil presos cuja progressão para o regime semiaberto já foi deferida pelo juiz, mas que ainda permanecem no regime fechado por falta de vagas no semiaberto[5]. E hoje se sabe que bastariam investimentos da ordem de 400 milhões de reais para se obterem as 24 mil vagas faltantes para o regime semiaberto[6].
Esse quadro alarmante representa, contudo, apenas a ponta do iceberg do entrelaçamento de questões muito mais complexas, mas nem por isso sem solução. São problemas de tal forma imbricados que hoje já não faz mais sentido discuti-los isoladamente. Não obstante tudo isso, o Brasil, ao contrário da situação americana retratada no editorial do The New York Times, já possui legislação e projetos aptos a dar respostas efetivas aos horrores que presenciamos no sistema carcerário nacional.
O sistema prisional é parte importante da segurança pública e assim deve ser tratado.
A segurança pública, por sua vez, tem direta relação com a garantia dos direitos fundamentais: um assegura a efetividade do outro, em um ciclo que se retroalimenta. A concretização e a manutenção das garantias constitucionais dependem da paz social, fundada na real segurança de todos, assegurada, por sua vez, pelo adequado funcionamento das instituições[7].
O balanceamento entre liberdade e segurança sustenta, em última análise, a própria ordem constitucional, de modo que o cidadão não exerça sua liberdade sem limites, mas possa confiar na liberdade que lhe é garantida pelo Estado, assim como na proteção contra o próprio Estado. Nas palavras de Isensee: segurança é obra da liberdade (“Sicherheit ist das Werk der Freiheit”)[8].
Nossa Constituição Federal possui vários dispositivos relacionados à segurança pública, como a previsão de que “a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio” (art. 144), a ser exercida por intermédio da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, da Polícia Ferroviária Federal, das polícias civis e militares e dos corpos de bombeiros militares, a partir de lei que discipline sua organização e funcionamento de maneira a garantir a eficiência de suas atividades (art. 144, §7º).
Cumpre à União legislar privativamente sobre direito penal e processo penal (art. 22, I), sobre requisições civis e militares, em caso de iminente perigo e em tempo de guerra (art. 22, III), sobre convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares (art. 22, XXI), sobre competência da polícia federal e das polícias rodoviária e ferroviária federais (art. 22, XXII). Em relação às Forças Armadas, define que “lei complementar estabelecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças Armadas” (art. 142, §1º).
Podemos citar, ainda, as seguintes disposições constitucionais do art. 5º:
“constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” (art. 5º, XLIV); bem como que a “lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem” (art. 5º XLIII).
Além de garantir os direitos fundamentais de forma ampla (art. 5º), a Constituição prevê normas impositivas de deveres de proteção, tais como as que estabelecem que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei” (art. 5º, LXI).
Todo esse quadro normativo legitima o que aqui se propõe: é preciso uma estratégia global para lidar com a questão da segurança pública. Já passou da hora de insistirmos em tratar desses temas de forma isolada. Um sistema integrado de segurança pública, algo como um “SUS de segurança pública”, poderia ser pensado, por exemplo, em termos de federalismo cooperativo, devendo a União assumir seu papel de organização e coordenação de ações gerais.
Não é possível, portanto, que o assunto “segurança pública” seja tratado como competência exclusiva dos Estados. União, Estados e Municípios têm atribuições próprias, relevantes e conexas, que devem ser exercidas de forma coordenada e com o indispensável senso de cooperação Cabe especialmente à União, no encaminhamento de soluções sobre essa nova perspectiva, importante papel, em razão do seu vasto leque de responsabilidades em matéria de segurança pública: legisla sobre direto penal, sobre processo penal, sobre execução penal, controla a Polícia Federal e as Forças Armadas.
Além disso, é também inequívoco que é a União que detém, hoje, nesse federalismo assimétrico, a concentração de grande parte dos recursos destinados ao sistema de segurança pública. Com raras exceções, os estados estão em situação de penúria. Todavia – e voltamos à ideia principal deste texto –, o que precisamos é de organização e de procedimento. É incompreensível que, diante da notória falta de vagas no sistema prisional, os recursos do Funpen ainda sejam passíveis de contingenciamentos, como infelizmente tem ocorrido. Dados recentes indicam que esse Fundo dispõe de cerca de R$ 1,065 bilhão e recebe, em média, R$ 300 milhões por ano. Só no ano de 2013, por exemplo, o Funpen foi autorizado a investir R$ 384,2 milhões, mas apenas 10,6% desse valor foram efetivamente empregados[9].
Vê-se, pois, que segurança pública, além de um inafastável direito de todos, é também dever da União, dos Estados e dos Municípios. Para o cumprimento dessa obrigação, é preciso que os Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo repensem suas responsabilidades e unam-se, de forma coordenada, em uma ampla estratégia de segurança pública.
Nesse sentido, seria interessante pensar, por exemplo, do ponto vista do Judiciário, em soluções criativas para o enfrentamento do caos reinante no sistema prisional por meio de medidas como o estabelecimento de prazos e indicação de ações concretas para que omissões estatais sejam solucionadas, sob a coordenação do próprio Judiciário.
No biênio em que estivemos à frente da Presidência do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça (2008-2010), instituímos projetos que hoje são referência no combate a essas notórias deficiências. Um deles, o projeto Mutirão Carcerário, em execução desde agosto de 2008, resultou em um amplo mapeamento do sistema prisional, com a recuperação da dignidade de pessoas injustamente esquecidas e ignoradas pela sociedade.
A partir de inspeções realizadas em diversos presídios brasileiros, o Conselho Nacional de Justiça constatou que a contrariedade à lei – especialmente à Constituição – escancara-se diante das péssimas condições em que são cumpridas as penas no país, em situações que vão desde instalações inadequadas até maus-tratos, agressões sexuais, promiscuidade, corrupção e inúmeros abusos de autoridade. A constatação, nesses mutirões, de casos como o de pessoas ainda presas com penas já cumpridas ou sem o gozo de benefícios a que já fariam jus e até – pasmem! – em prisão provisória há 14 anos – faz ruir o velho costume de atribuir-se a culpa pelas mazelas do sistema prisional exclusivamente ao Poder Executivo[10].
Como mais uma forma de combate ao quadro deflagrado pelos Mutirões Carcerários, importante destacar que, após sanção da Lei 12.106, em dezembro de 2009, foi criado, no CNJ, oDepartamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DFM), com a missão de monitorar e fiscalizar os sistemas carcerários do país, além de verificar as medidas socioeducativas aplicadas pelos órgãos responsáveis em cada cidade brasileira.
É patente, todavia, que de pouco valeria qualquer iniciativa com vistas a assegurar os direitos fundamentais dos acusados e dos detentos do sistema prisional brasileiro, caso não fossem igualmente criadas formas de reinserção social dos seus egressos. Para tanto, o CNJ instituiu oPrograma Começar de Novo[11], que, mediante campanhas institucionais, objetiva sensibilizar a população para a necessidade de recolocação de ex-presidiários no mercado de trabalho e na sociedade.
Entre as iniciativas nesse sentido destacam-se, v.g., a realização de campanha de mobilização para a criação de uma rede de cidadania em favor da ressocialização; o estabelecimento de parcerias com associações de classe patronais, organizações civis e gestores públicos, para apoiar as ações de reinserção; a integração dos serviços sociais nos Estados para seleção dos beneficiários do projeto; a criação de um banco de oportunidades de trabalho e de educação e capacitação profissional; e o acompanhamento dos indicadores e das metas de reinserção. O CNJ tem contribuído nessas iniciativas de reinserção por meio acordos de cooperação técnica pelos quais se busca ampliar a capacitação profissional de presos. Mencione-se que, com a proximidade da Copa do Mundo de 2014, foi firmado acordo nesse sentido com o Clube dos 13 e com o Comitê Organizador da Copa do Mundo 2014. Programas semelhantes poderiam ser adotados no plano federal e nos planos locais sem grandes dificuldades.
Ainda com essa visão global em busca de melhorias efetivas, outras ações foram desenvolvidas, como o programa Advocacia Voluntária, criado pela Resolução 62, do CNJ, de 10 de fevereiro de 2010. Esse programa visa prestar assistência jurídica gratuita tanto aos presos que não têm condições de pagar um advogado quanto aos seus familiares. Busca-se, desse modo, ampliar os canais de acesso ao Judiciário às pessoas de baixa renda, principalmente em razão do ainda pequeno número de defensores públicos existentes no país. Esse modelo poderia ganhar uma nova veste com a participação de estudantes e recém-formados em programas de estágios obrigatórios coordenados por diversas instituições, inclusive pela OAB. Lográssemos colocar um bacharel em cada delegacia e, certamente, reduziríamos significativamente os casos de abuso que se repetem cotidianamente.
Das iniciativas do Poder Legislativo[12], também válido citar a criação do Sistema Nacional de Informação de Segurança Pública, Prisionais e sobre Drogas (SINESP), que coleta e analisa os dados necessários à melhor gestão (Leis 12.681 e 12.714, de 2012). Ao lado desses diplomas legislativos, a Lei 12.403/11, originária de projeto integrante do Pacto Republicano, ampliou significativamente o rol de medidas cautelares à disposição do juiz, alterando o art. 319 do Código de Processo Civil. Trata-se, por certo, de importantíssima medida, como destaquei em artigo publicado também nesta coluna do Observatório da Jurisdição Constitucional[13].
Quanto à medida cautelar, apesar de sua previsão ter sido efetivada em 2011, a cultura das prisões provisórias, lamentavelmente, ainda persiste. Estudos indicam que, até aqui, a Lei 12.403/2011 teve pouco impacto na diminuição da população carcerária brasileira. Isso evidencia que tal procedimento precisa ser efetivamente aplicado pelos próprios magistrados.
Tenho insistido, nesse ponto, que deveríamos pensar na apresentação do preso em flagrante ao juiz em curto prazo, para que o magistrado possa avaliar se há justificativa para a prisão preventiva ou aplicação de uma das medidas alternativas. Apesar de prevista em tratados internacionais, já incorporados ao direito interno, como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos e o Pacto de São José, essa medida nunca foi implementada em nosso país[14].
É evidente que não se pode ignorar todas as dificuldades que teríamos na adoção deste modelo, que precisaria ser, de início, um experimento institucional consciente, por certo com relevante impacto nas grandes cidades. Ademais, seria mecanismo de controle de legalidade das prisões em flagrante, prevenindo encarceramentos ilegais, constrangimentos e até tortura no ato de prisão, situações constatadas nos mutirões carcerários realizados pelo CNJ. É claro que, nesse contexto, devemos conferir atenção especial ao funcionamento da justiça criminal, que, como se sabe, tem falhado na prolação de decisão em tempo adequado. É preciso pensar em um programa de modernização da justiça criminal, e aqui se afigura indispensável que o CNJ faça valer a sua liderança, coordenando, inclusive, o aporte de recursos nos sistemas com maiores carências[15].
Em síntese, nenhum programa de redução de criminalidade terá eficácia se não levar em conta as graves deficiências das nossas prisões. Mas a falência crônica do sistema penitenciário também está vinculada a outros temas correlatos como, por exemplo, a reincidência, as alternativas à prisão em casos de delitos de pouca ofensividade e o efetivo funcionamento do Judiciário[16].
Estima-se que um maior protagonismo do Judiciário nas searas referidas justifica-se não apenas em razão de sua competência na matéria, mas também em razão de inequívoca inércia de outros setores a que a ordem jurídica confere atribuições sobre o assunto. Afigura-se fundamental que o CNJ proceda a uma avaliação rigorosa do sistema criminal com iniciativas diversas destinadas a dotar o país de uma justiça moderna também na área criminal.
Medidas assim podem resultar em maior proteção dos direitos e garantias fundamentais não apenas de presos e acusados, mas de toda a sociedade.
Esta coluna é produzida pelos membros do Conselho Editorial do Observatório da Jurisdição Constitucional (OJC), do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). Acesse o portal do OJC (www.idp.edu.br/observatorio). 

[1] The New York Times. A Rare Opportunity on Criminal Justice. Publicado em: 15.3.2014 – Disponível em:http://mobile.nytimes.com/2014/03/16/opinion/sunday/a-rare-opportunity-on-criminal-justice.html?hp&rref=opinion&_r=1&referrer . Acesso em 18.3.2014.
[3] “Para Gilmar Mendes, já é discutir de maneira franca o sistema carcerário brasileiro”. Entrevista concedida à jornalista Mônica Bergamo, publicada na edição de 8.12.2013 da Folha de S.Paulo, disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2013/12/1381683-para-gilmar-mendes-ja-e-hora-de-discutir-de-maneira-franca-o-sistema-carcerario-brasileiro.shtml
[4] Audiência Pública sobre regime prisional, RE 641.320, Rel. Min. Gilmar Mendes.
[5] Audiência Pública sobre regime prisional, RE 641.320, Rel. Min. Gilmar Mendes.
[6] Cf. dados informados na Audiência Pública sobre regime prisional, RE 641.320, Rel. Min. Gilmar Mendes.
[7] Cf. ISENSEE, Josef. Sicherheit als Voraussetzung und als Thema einer freiheitlichen Verfassung. In: Verfassungsvoraussetzungen.Gedächtnisschrift für Winfried Brugger.ANDERHEIDEN, Michael (et alii) Org. Tübingen: Mohr Siebeck, 2013, p. 500.
[9] Cf. dados fornecidos pelo Ministério da Justiça.
[10] Na cidade de Abaetetuba, no Estado do Pará, uma jovem de 16 anos foi mantida presa por mais de 30 dias em uma cela com 20 homens. Acusada de furto, a adolescente afirmou ter sido violentada pelos demais apenados no período em que esteve encarcerada. Segundo a Polícia Civil, no Município não há carceragem feminina, motivo pelo qual a jovem foi indevidamente colocada junto com presidiários do sexo masculino. A juíza que ordenou a prisão da adolescente em uma cela com detentos do sexo masculino foi aposentada compulsoriamente pelo Conselho Nacional de Justiça em abril de 2010.
No Paraná, foi encontrada situação que se repete em diversas outras regiões do país: a inexistência de locais específicos e especializados aos cumpridores de pena que possuem dependência química (usuários de drogas). Normalmente, em muitas localidades, estes são confinados em complexos penais destinados a apenados com doenças mentais, fato também que pode ser considerado agressivo e que em nada contribui com sua melhora. Notícia publicada no site do Conselho Nacional de Justiça: Coordenador de mutirão carcerário recomenda interdição de delegacias no Paraná. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/index.php?option=com_content&view=article&catid=1%3Anotas&id=9136%3Atj-de-roraima-realiza-concurso-para-contratacao-de-servidores&Itemid=169>.
[11] O Projeto Começar de Novo, que até abril de 2010 já tinha proporcionado mais de 1.700 vagas para cursos de capacitação profissional e trabalho, foi prática premiada pelo Instituto Innovare, em sua VII edição, por meio da Resolução 96.
[12] Importante destacar o Projeto de Lei do Senado 513/2013, que apresenta diversas medidas para solucionar problemas do sistema carcerário, como a vedação do contingenciamento dos recursos do Funpen; a criação de novos órgãos da execução penal; a revisão dos direitos e deveres dos presos; a inclusão de direitos dos presos estrangeiros; e a extinção das carceragens em Delegacias de Polícia no prazo de quatro anos.
[13] Cf. artigo de minha autoria: É preciso repensar o modelo cautelar no processo penal. Publicado em 9.2.2013. Disponível em:
[14] Diante desse quadro, mostra-se oportuna a iniciativa do CNJ em dar cumprimento às citadas imposições legais, conforme deliberação plenária daquele órgão em procedimento específico sobre o tema Processo de Ato Normativo 0001731-41.2012.2.00.0000. Encontra-se em elaboração no CNJ, em cumprimento à deliberação do Plenário, projeto de resolução disciplinando o assunto. Sobre o mesmo tema, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei 554/2011, que altera o §1º do art. 306 do CPP para determinar a apresentação do preso à autoridade judicial no prazo de 24 horas após a sua prisão em flagrante.
[15] Em relação especificamente ao Tribunal do Júri, devem ser efetivadas iniciativas que agilizem e concedam maior efetividade às investigações, denúncias e julgamentos de homicídios. Dados alarmantes de Porto Alegre exemplificam o quadro atual: Promotores de Justiça que atuam na Promotoria do Júri na capital gaúcha declararam que 75% dos homicídios da cidade estavam à espera de solução. Depois de mutirão realizado na Delegacia de Homicídios, 1.095 inquéritos foram encaminhados de homicídios praticados nos anos de 2007 e 2008, dos quais 823 não tinham indiciamento, por não ter sido a autoria caracterizada. (Cf. relatório da ENASP – Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública).
[16] Iniciativas com vistas a um melhor funcionamento do sistema de justiça podem ser estimuladas dentro do próprio Judiciário, como, por exemplo, a adoção, pela Vara de Execuções Criminais de Curitiba/PA, de sistema de gerenciamento automático de requisitos para progressão de regime e outros benefícios, pelo qual tem sido possível a realização, em apenas uma semana, de audiências com presos, que antes demoravam meses e até anos.
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Gilmar Ferreira Mendes é ministro do Supremo Tribunal Federal, professor de Direito Constitucional nos cursos de graduação e pós-graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB); Doutor em Direito pela Universidade de Münster, Alemanha; Membro Fundador do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP); Membro da Comissão de Veneza e Membro do Conselho Editorial do Observatório da Jurisdição Constitucional (IDP).
Revista Consultor Jurídico, 5 de abril de 2014

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