sexta-feira, 12 de abril de 2013

CONSIDERAÇÕES SOBRE A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E A PEC 37


SERGIO F. C. GRAZIANO SOBRINHO


SERGIO GRAZIANO OAB/SC 8042 – Advogado do escritório Graziano e Rizzatti Advocacia – Doutor em Direito pela PUC/RJ – Pós-Doutorando na área de Ciências Criminais pela PUC/RS.


 Está havendo, nos últimos dias, aqui no sul de Santa Catarina, uma série de audiências públicas, promovidas pelo Ministério Público Federal e Estadual com o intuito de esclarecer a população sobre os supostos riscos da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 37 que tramita no Congresso Nacional. Não sei o que está ocorrendo em outras regiões do país, mas é preciso dizer, por oportuno, que estas audiências fazem parte de um conjunto de ações promovido pelas citadas instituições em todo o Brasil. Cabe ilustrar, também, que os folders eletrônicos que divulgam estas ações apontam que a referida PEC 37 (denominada de PEC da Impunidade), caso aprovada, permitirá que a investigação criminal seja realizada, com exclusividade, pelas polícias (Federal e Estadual), causando sérios prejuízos à sociedade.
Portanto, pretendo aqui traçar algumas considerações sobre a possibilidade do Ministério Público investigar criminalmente. Outro ponto importante é entender as finalidades constitucionais do Ministério Público e verificar se há algum óbice à Proposta de Emenda Constitucional 37 que pressupõe que a investigação criminal seja realizada pelas polícias.
É necessário esclarecer que o “Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 127, CF). Ademais é importante perceber que o Ministério Público brasileiro não integra a estrutura dos poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário –, mas é órgão único, com carreira e estrutura próprias, dotado de autonomia funcional e administrativa e seus membros gozam de todas as garantias previstas no artigo 95 da Constituição Federal (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídios).
Assim, para os propósitos do presente artigo, é importante perguntar: é atribuição constitucional do Ministério Público a investigação criminal? Não! Não há qualquer previsão na Constituição Federal que autorize o Ministério Público investigar, mas, ao contrário, há previsão que o impede. São várias as atribuições constitucionais do Ministério Público (art. 129 da CF), sendo que, dentre elas, está a de promover o inquérito civil e a ação civil pública (inciso III, do art. 129), bem como “requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial” (inciso VIII, do art. 129) e não está a investigação criminal. O rol de atribuições previsto no referido artigo 129 da CF é taxativo. E não poderia ser diferente.
Somente este argumento bastaria para impedir que o Ministério Público fizesse investigação criminal, contudo é razoável ponderar o motivo pelo qual isso acontece. Ora, o Ministério Público é parte no Processo Penal, ou seja, ele tem interesse direto. No processo penal brasileiro as funções das partes estão definidas com exclusividade: juízes, promotores e advogados têm suas funções. Não há que se comparar com outros países, argüindo que, por exemplo, no Japão o Ministério Público pode investigar, pois lá o Ministério Público pode até fazer o interrogatório do réu. Nos Estados Unidos também podem investigar, contudo os advogados de defesa também podem. No Brasil isso não é possível. São sistemas completamente diferentes entre si e também entre o sistema processual brasileiro e não há que se falar em “melhor” ou “pior”, pois são sistemas processuais diferentes, até mesmo na escolha de seus membros, pois em muitos países eles são escolhidos por voto popular, indicados pelo poder executivo ou até mesmo pela monarquia.
Impende salientar que a atuação do Ministério Público nas ações penais é fundamental em um país democrático, mesmo porque goza de todas as garantias constitucionais, especialmente de estabilidade, não estando sujeito às intempéries políticas do poder político, podendo atuar com total independência. Contudo não é razoável que o Ministério Público possa investigar sob o argumento de que está impregnada, nas polícias, a corrupção. Basta lembrar que um dos maiores escândalos ocorridos em 2012 foi o descortinamento de uma rede de corrupção comandada pelo Senador Demóstenes Torres, membro do Ministério Público de Goiás. Lembremos, também, recentemente o STF decidiu anular uma ação penal porque o Ministério Público escondeu provas as quais poderiam inocentar o réu, ou seja, isso mostra que em muitas circunstâncias o MP é acusador e tem lado.
Se há problemas nas polícias, e há, certamente, vamos corrigi-los, mas são problemas originados na própria Constituição de 1988, especialmente pelo ranço de uma polícia autoritária e corrupta da época da ditadura. Contudo é preciso pensar e implementar uma verdadeira carreira funcional nas policiais, com apenas uma porta de entrada, ascensão profissional com base em concursos, salários dignos e as mesmas garantias constitucionais de magistrados e membros do Ministério Público.

Mudar a estrutura processual penal seria mudar também o espectro geral, pois seria necessário, pelo princípio da paridade de armas, que advogados e defensoria pública pudessem também fazer investigação com o mesmo peso probatório.
Por fim, é preciso pensar sim em mudanças, pois há concordância entre os que pensam segurança pública como política pública que deve haver alterações, especialmente nas estruturas de poder, contudo não é razoável que em um país democrático, que respeita as regras constitucionais, o Ministério Público possa, seletivamente, escolher quem vai investigar e que estas investigações não estejam submetidas às regras do processo democrático.

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