segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Artigo: Presunção de culpa? Ou seria o contrário?

“É melhor arriscar-se a salvar um culpado do que condenar um inocente.”

Voltaire

Causou perplexidade ao senso comum a decisão da Suprema Corte do Brasil, que decidiu, em um caso concreto, que o réu deve permanecer em liberdade enquanto não houver trânsito em julgado da sentença penal condenatória, ou seja, até o término da formação da culpa, que se concretiza quando não há mais recurso cabível.

Os guardiões da Constituição Federal apenas fizeram valer o que está escrito, desde 1988, no art. 5°, inciso LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. No nosso ordenamento jurídico, a regra é a liberdade, a prisão é a exceção, e a culpa só é formada quando não existir mais a hipótese de manifestação jurisdicional sobre o caso.

Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça, há 189 mil presos provisórios no país, alguns com mais de três anos sem julgamento. Nota-se que execução provisória da pena se tornou praticamente regra no país, o que não merece prosperar. A prisão que só pode ser decretada a título cautelar, nos casos de prisão em flagrante, prisão temporária ou preventiva, não obstante; agora também serve para punir antecipadamente quem se presume inocente. Não se faz justiça antes do tempo, nem prisão resolve os problemas da criminalidade do país. Aliás, o que existe é a falência da pena de prisão, protagonista do mundo de horrores que é justiça criminal brasileira.

O que muitos querem, aí é que mora o perigo, é inverter essa lógica. O réu tem que se presumir culpado para que daí então prove sua inocência, de preferência preso. A indignação social com a violência (culpa do Estado omisso em segurança pública) é tanta, que legitima um viés perigoso contrário à lei maior, contrário à dignidade da pessoa humana, contrário a uma sociedade livre, contrário à própria democracia.

Não queremos mais os anos de chumbo, no qual pessoas eram presas sem nenhuma garantia de liberdade, o AI-5 suspendeu habeas corpus por mais de 10 anos! Não existe democracia sem liberdade. Já dizia o mestre Rui Barbosa: “Eu propugno na liberdade dos ofendidos a minha própria liberdade”. A decisão do STF apenas abre um precedente, não vai esvaziar as cadeias superlotadas como muitos acharam. Apenas demonstrou que existe uma Constituição e que esta foi conquistada com muita luta por nós mesmos.


Iasser de Almeida Rodrigues, Advogado.

Zero Hora.

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