sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Artigo: Lei 9.099/95 e a renúncia ao direito de representação

Há uma situação processual que se tornou bastante comum após o advento da Lei 9.099/95 e que vem gerando uma certa controvérsia quanto ao seu desfecho. É justamente a hipótese em que a vítima, na audiência preliminar, expressamente declara não ter interesse em representar contra o autor da infração.

Defende alguns que, nessas situações, se deverá aguardar o prazo decadencial de seis meses, já que o art. 75, parágrafo único, da Lei 9.099/95 estabelece "que o não oferecimento da representação na audiência não implica decadência do direito que poderá ser exercido no prazo estabelecido em lei". Com isso teríamos uma solução idêntica àquela estabelecida no art. 25 do CPP, que permite que a vítima ofereça a representação e se retrate quantas vezes quiser, desde que antes do oferecimento da denúncia.

Assim, por esse entendimento, mesmo tendo a vítima declarado na audiência não desejar oferecer a representação, poderá mudar de idéia e exercer o direito no prazo decadencial de seis meses.

Nos parece, entretanto, não ser essa a solução correta, devendo o juiz, ante a expressa declaração da vítima, no sentido de não oferecer a representação, declarar, de imediato, a extinção da punubilidade do agente, em face da renúncia.

O raciocínio é o seguinte: a renúncia, como causa de extinção da punibilidade, sempre foi instituto exclusivo da ação penal privada. Exatamente por esse motivo é que, na ação penal pública condicionada, a vítima poderia representar e, posteriormente, se retratar, sem que ocorresse a renúncia. Ocorre, todavia, que o art. 74, parágrafo único, da Lei 9.099/95 criou uma hipótese de renúncia tácita para os crimes de ação pública condicionada ao estabelecer que "tratando-se de crime de ação de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado (em relação aos danos civis) acarreta a renúncia do direito de queixa ou de representação."

Ora, criado o instituto da renúncia tácita, obviamente tornou-se possível o reconhecimento da renúncia expressa, aplicando-se subsidiariamente as regras do Código Penal e Processual Penal (art. 92 da Lei 9.099/95). Seria um contra-senso imaginar que o legislador criaria uma renúncia tácita, mas não reconheceria uma renúncia expressa.

Essa solução, aliás, é a única que se coaduna com os princípios da informalidade, economia processual e celeridade consagrados no art. 62 da lei. Permitir que a vítima mude de opinião quantas vezes quiser durante o prazo decadencial certamente não atende a esses princípios.

Restaria, então, uma pergunta: Qual a finalidade do art. 75, parágrafo único, que dita que o não oferecimento da representação na audiência preliminar não implica em decadência? A resposta é muito simples, ou seja, o dispositivo é aplicável quando a vítima está em dúvida, não tendo certeza se quer ou não representar.

Conclui-se, portanto, que se a vítima oferece a representação na própria audiência, o procedimento prossegue; se a vítima declara que não quer representar, o juiz deve declarar a extinção da punibilidade do autor da infração e, por fim, se a vítima não toma uma das citadas atitudes, por estar em dúvida, poderá, então, se valer do prazo de seis meses para decidir acerca do assunto.


Victor Eduardo Rios Gonçalves, Promotor de justiça e professor de Direito Penal e Processual Penal.

GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Lei 9099/95 e a renúncia ao direito de representação. Boletim IBCCRIM. São Paulo, n.46, p. 08, set. 1996.

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