sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Inferno prisional não é desculpa para soltar condenados



Com muita propriedade e extrema perspicácia, o Ministro da Justiça afirmou que preferiria a morte do que cumprir pena nas cadeias brasileiras. 
Examinemos essa realidade, para efeito de atribuir algumas sugestões, as quais poderiam, não apenas melhorar o sistema, fortemente degenerativo, para o formato regenerativo, visando a ressocialização do preso. 
Ataquemos os pontos nevrálgicos, os quais jamais foram enxergados pelos governos, não transferem voto, cujos investimentos são parcos, e se fossemos aplicar rigorosamente a legislação, a grande maioria, ou a totalidade dos presídios deveria estar interditada. 
Fato é que, por problema cultural, a situação da América Latina não é diferente, ao contrário da Europa e dos Estados Unidos, quando a iniciativa privada confere vagas e espaços de celas maiores para aqueles que podem desembolsar e pagar valores exigidos na exploração do serviço. 
A situação do Brasil é peculiar, quer pelo número excessivo de presos, pela falta de controle, e, sobretudo, diante do diagnóstico da execução da pena e seu término. 
Observamos recentemente na Alemanha que ao preso é conferido um cartão, contendo todas as informações a respeito dos crimes praticados e das penas impostas, inclusive a data de sua liberdade, utilizando-se do mesmo cartão para sua livre soltura, automatizado, no exato dia que a pena for cumprida. 
A primeira providência que deveria ser tomada se refere às parcerias público – privadas para construção de presídios em plataformas marítimas e nos estados da Federação, cujas regiões apresentam menor demografia populacional e maior espaçamento para esse tipo de empreitada. 
Não há qualquer obstáculo legal para que presos de um determinado Estado cumpram suas penas em outros, notadamente quando há riscos e transgressão do regime disciplinar imposto. 
Jamais poderia o crime organizado dominar os presídios e se comunicar livre e impunemente para colocar em risco a segurança da sociedade e maltratar os agentes de segurança. 
Natural, portanto, que os presídios de segurança máxima sejam construídos nas áreas com menor número de habitantes, principalmente no Norte e Nordeste do país, e também no centro-oeste, para que a metade da população que vive nos outros estados desfrute com segurança a sua incolumidade. 
A extensão territorial do país, de mais de 8 milhões de km quadrados não serve de desculpa para que os governos estaduais e federal, junto com a iniciativa privada, comunguem esforços para construção de presídios na Amazônia livre, no Pará, Tocantins, Roraima, Rondônia, e também em plataformas marítimas, colocando como condição obrigatória o trabalho para que o preso possa mais facilmente, ao terminar sua pena, ter ocupação profissional. 
A fórmula dessas parcerias permitiria customizar a construção dos presídios e o grande deslocamento da massa carcerária para essas regiões, fazendo com que as grandes cidades saiam do medo e dos transtornos desse modelo que se constata na realidade. 
É bom frisar que somente aqueles condenados, com sentença transitada em julgado, permaneceriam ocupando esses presídios, o que traria maior segurança às capitais e regiões do entorno, isto porque, conforme se comprova, a construção de presídios traz a preocupação de fuga e a multiplicação da delinquência. 
Com isso se permitira também estabelecer sistema prisional agrícola, com maior facilidade, e o número de vagas seria rapidamente reequilibrado, inclusive para efeito de facilitar a fiscalização do cumprimento da pena. 
Falta planejamento, eficiência, e, sobretudo, interesse, naquilo que se denomina vontade política da reconstrução do modelo prisional brasileiro. 
A palavra do Ministro da Justiça apenas retrata aquilo que todos nós conhecemos, porém, é melhor imprimir mãos a obra para que não nos escandalizemos interna e externamente dos horrores do cárcere que tanto infelicitam a sociedade como um todo. 
O inferno prisional não pode servir de mote para que soltemos todos os nossos condenados e encarceremos a população inocente e vítima de absurda violência. 
Carlos Henrique Abrão é juiz convocado do TJ-SP e doutor em Direito pela USP.
Revista Consultor Jurídico, 15 de novembro de 2012

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