quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

MP não sabe pedir cautelar sem usar garantia da ordem pública, diz promotor

Se algum dia o ordenamento jurídico deixar de considerar o argumento da garantia da ordem pública, o Ministério Público não vai saber pedir cautelar. A crítica partiu de dentro da instituição: o promotor Fauzi Hassan Choukr, do MP de São Paulo, analisou a conduta de colegas em evento promovido pelo Instituto dos Advogados de São Paulo na segunda-feira (11/12).
Choukr declarou que o Brasil vive “as dores do parto de maneira canhestra ao ver a capacidade de postulação do MP”. Disse ainda que já foi atacado dentro do órgão por ir contra ideias que norteiam a classe — por exemplo, de que é possível se manifestar depois de as razões recursais estarem firmadas.
Da esquerda para a direita: Miguel Pereira Neto, Fauzi Hassan Choukr, Fábio Tofic, Mariz de Oliveira, Marcelo Nobre e Ana Mascarenhas.
Brenno Grillo
"Isso não faz parte do Estado Democrático de Direito. A acusação precisa ser estabilizada e permanecer assim no momento de sua apresentação", afirmou. As críticas do promotor não se limitaram ao MP: ele afirmou que a magistratura tem cometido “excessos” e afirmou que o Judiciário não deveria dar espaço para “juízes paladinos".
Também presente no evento, a criminalista Flavia Rahal classificou esse setor da magistratura de "juízes heróis", que são aqueles que prendem no começo e impõem pena alta no final. 
Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, declarou que atualmente há uma série de Moros — em alusão ao juiz federal Sergio Moro, responsável pela operação "lava jato" em Curitiba — competindo para ver quem será o menos garantista. "Tem a vaidade, a vontade de vender livro, de se candidatar no futuro."
"Aqui perdeu-se o respeito totalmente. Juiz posando de metralhadora e outro intimando o presidente da República para intervir no Judiciário", lamentou o advogado Miguel Pereira Neto, em referência a foto divulgada recentemente pelo juiz federal Marcelo Bretas, que atua no Rio de Janeiro, e também ao pedido de Moro para que o presidente Michel Temer (PMDB) interceda junto ao Supremo Tribunal Federal para a corte manter tese sobre prisão antes do trânsito em julgado.
Esse ativismo judicial, afirmou Flavia Rahal, é fundado no fato de os magistrados se mostrarem como verdadeiros combatentes da corrupção. "Vivemos um Estado de Direito que desrespeita cada vez mais os direitos e garantias fundamentais como se fossem um contraponto ao sistema penal ineficiente. Essa dicotomia não existe e nunca existiu. É uma hipocrisia gigantesca", opinou.
Da esquerda para a direita: José Horácio Halfeld (presidente do Iasp), Alberto Toron, Marina Pinhão Coelho Araújo, Flávia Rahal, Roberto Tardelli e Cristiano Maronna.
Brenno Grillo
Democratização penal
Os participantes do evento também afirmaram que a suposta democratização do Direito Penal está ocorrendo da pior maneira possível, mantendo abusos do Estado a quem quer que seja. Para o criminalista Alberto Zacharias Toron, essas práticas são chanceladas pela população, que têm cultura “francamente punitiva”.

Toron afirmou que essa democratização se deu porque, antes, apenas “pretos, pobres e putas” eram presos, mas, agora, a classe política e empresarial também passou a ser detida. “Criamos um caldo de cultura que incentiva a violência policial e perdemos a noção do significado da palavra lei.”
O advogado Cristiano Maronna, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), usou o termo “indevido processo legal” para definir a forma como precedentes da operação “lava jato” estão sendo aplicados a pobres em casos de tráfico.
De acordo com o ex-procurador Roberto Tardelli, a cultura punitivista da magistratura e do MP cresce cada dia mais por conta do distanciamento da classe com o mundo real. Esses novos juízes e promotores, segundo ele, são uma “geração de proveta”, que “cresceu em condomínio e não sabe conviver em sociedade”.
Da esq para a dir: Cristiano Zanin, Lenio Streck, Miguel Pereira Neto, Dina Alves, Kakay e Valeska Martins.
Brenno Grillo
Esse contexto, continuou, faz com que eles encontrem uma única solução para a criminalidade existente no Brasil, que é prender o máximo possível. "A sociedade ordeira que eles imaginam é aquela do condomínio. Por isso que ideias como atitude suspeita servem para eles."
O jurista Lenio Streck, colunista da ConJur, também brincou com esses status da magistratura e do MP, dizendo que muitos deles "sonham em ser como minority report — filme em que as autoridades conseguem prever os crimes".
 é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 13 de dezembro de 2017

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