quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Delação premiada e sigilo

O sigilo sobre o conteúdo de colaboração premiada deve perdurar, no máximo, até o recebimento da denúncia.

Essa é a orientação, da Primeira Turma, que negou provimento a agravo regimental.

A Turma afirmou que, no âmbito da Administração Pública, a publicidade é a regra e o sigilo a exceção (CF, art. 5º, LX) (1).

O sigilo do que ajustado é elemento essencial para a efetividade da colaboração firmada, como forma de garantir o êxito das investigações (Lei 12.850/2013, art. 7º, § 2º) (2), e para assegurar a proteção da pessoa do colaborador e das pessoas próximas (Lei 12.850/2013, art. 5º, II) (3).

A Lei, visando a consecução desses objetivos, estabeleceu diversas cautelas a serem adotadas. O art. 7º dispõe que o pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não revelem a identificação do colaborador e do objeto.

O sigilo sobre o conteúdo da colaboração premiada, consoante versa o § 3º do citado artigo, deve permanecer, como regra, até o recebimento da denúncia.

O preceito trata da cessação do sigilo relativamente ao acordo, além de assegurar o direito de o investigado conhecer aqueles que o subscreveram a denúncia, de modo a viabilizar a ampla defesa e o contraditório. A delação premiada objetiva, com transparência, a elucidação de fato criminoso.

O parágrafo citado não encerra observância absoluta, mas termo final máximo. Deve ser mantido até esse ponto apenas se houver necessidade concreta.

Uma vez realizadas as diligências cautelares, cuja indispensabilidade tiver sido demonstrada a partir das declarações do colaborador, ou inexistentes estas, não subsiste razão para o sigilo.

Nada impede que o sigilo do acordo seja afastado em momento anterior ao recebimento da denúncia e, assim, possibilitar o conhecimento daquele que subscrevera o acordo, bem como o conteúdo do que declarado. Deste modo, tem-se a otimização dos princípios da ampla defesa e do contraditório, em favor do investigado ou dos atingidos pela colaboração premiada. Não há direito subjetivo do colaborador a que se mantenha, indefinidamente, a restrição de acesso ao conteúdo do acordo, ao argumento de que o sigilo teria sido elemento constitutivo da avença.

A Turma ressaltou que o art. 19 (4) da referida norma, ao prever como crime a conduta de imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou de revelar informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas — a chamada delação caluniosa —, reforça a necessidade de conhecimento do que veiculado no acordo.

(1) CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ... LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem”.

(2) Lei 12.850/2013: “Art. 7º. O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto. § 1º. As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao juiz a que recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 (quarenta e oito) horas. § 2º. O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento. § 3º. O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia, observado o disposto no art. 5º”.
(3) Lei 12.850/2013: “Art. 5 º. São direitos do colaborador: ... II - ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados”.
(4) Lei 12.850/2013: “Art. 19. Imputar falsamente, sob pretexto de colaboração com a Justiça, a prática de infração penal a pessoa que sabe ser inocente, ou revelar informações sobre a estrutura de organização criminosa que sabe inverídicas: Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa”.

Inq 4435 AgR/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 12.9.2017. (Inq-4435)


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