segunda-feira, 13 de julho de 2015

Tortura é prática comum no Brasil, mas casos nem sempre chegam à Justiça

Dezoito anos após a promulgação da Lei 9.455/1997, que pune a tortura, o Brasil ainda convive com a prática. Desde 2005, 699 processos contra o crime foram movidos apenas na Justiça do Rio de Janeiro. Desses, 219 já foram julgados, sendo que em 197 casos houve condenações em primeira instância. No segundo grau, o estado é o que possui mais decisões entre 2005 e 2010, segundo estudo da ONG Conectas e do Núcleo de Estudos da Violência da USP, divulgado neste domingo (12/7) pelo jornal O Globo.
A tortura é crime hediondo, inafiançável e sem direito a anistia, punível com pena de até 21 anos e quatro meses de prisão.
No entanto, o presidente da Comissão de Segurança Pública da OAB-RJ, Breno Melaragno, afirma que casos de tortura dificilmente chegam à Justiça, seja por medo das vítimas, seja por uma dificuldade prática em se apurar a ocorrência.
Além disso, Melaragno diz ser difícil responsabilizar agentes públicos pelo crime, uma vez que eles estão protegidos pela autoridade que o cargo lhes confere. Segundo o levantamento da Conectas e da USP, de 75 decisões em segunda instância no Rio entre 2005 e 2010, só 22 envolviam servidores, e, em 10 desses casos, eles foram absolvidos. Além disso, a pesquisa concluiu que agentes públicos acusados de tortura têm menos chances de serem condenados do que os agentes privados.
As polícias Civil e Militar são frequentemente acusadas, especialmente por aqueles mais pobres, de praticarem tortura nos suspeitos. Desde 2010, a PM do Rio abriu 15 procedimentos para investigar 91 policiais — inclusive os 25 que respondem pelo desaparecimento do pedreiro Amarildo, em 2013. Nesse período, 18 agentes foram expulsos da corporação pelo crime.
Os detidos em prisões e instituições de reeducação de jovens também frequentemente se queixam de serem vítimas de tortura. Em 2013, três internas de 15 a 17 anos do Educandário Santos Dumont, na Ilha do Governador, contaram a defensores públicos que era comum o castigo da “bailarina”, segundo o qual elas eram algemadas em grades acima de suas cabeças e obrigadas a ficar na ponta dos pés enquanto apanhavam.
Em 2011, o Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, órgão ligado à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, fez uma vistoria nas prisões e centros educacionais mantidos pelo Departamento Geral de Ações Socioeducativas. Os fiscais verificaram indícios de tortura em quase todas as 50 visitas que fizeram.
Doze sindicâncias foram abertas pela Secretaria de Administração Penitenciária do Rio para apurar a prática entre 2012 e 2014, mas apenas três estão em curso. As demais foram arquivadas.
Militares: torturadores e torturados
A tortura também é uma prática usual nas Forças Armadas, e não apenas contra civis. Conforme o jornal O Globo, a Justiça Militar do Rio julgou 299 casos desde 2005. Todos eles são relatos de maus-tratos e lesão corporal praticados por instrutores durante o treinamento dos oficiais. Parte das acusações, porém, foi modificada para delitos mais leves, como violência contra inferior e ofensa aviltante.

Um tenente de 26 anos sofreu uma parada cardíaca e ficou com uma ferida profunda nas costas durante curso no Centro de Instrução de Operações Especiais do Exército. Sete militares foram denunciados. Contudo, o caso foi enquadrado como maus-tratos, e não tortura, e todos foram absolvidos. A família recorreu ao Supremo Tribunal Federal, mas a corte trancou a ação.
Revista Consultor Jurídico, 12 de julho de 2015.

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