quarta-feira, 22 de abril de 2015

Sócios de clínica terapêutica são denunciados por tortura em MG

Grupo vai responder também por cárcere privado e formação de quadrilha.
G1 não conseguiu contato com a Comunidade, em João Pinheiro.

Clínica de João Pinheiro foi interditada e sócios presos (Foto: MPMG/Divulgação)
Uma ação penal foi ajuizada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) contra os três sócios-administradores e dois funcionários da Comunidade Terapêutica Deus Cura (CTDC), supostamente destinada à recuperação de dependentes químicos, em João Pinheiro, no Noroeste de Minas. 
Eles são apontados nos crimes de tortura, cárcere privado, formação de quadrilha e posse ilegal de arma de fogo (de numeração raspada). O G1 tentou falar com um representane da Comunidade, mas o telefone não foi encontrado. Além disso, o local foi interditado a pedido da Justiça.
A ação foi acertada no fim da semana passada por meio dos promotores de Justiça Luís Gustavo Patuzzi Bortoncello e Fabio Alves Bonfim. Uma operação realizada no local, no dia 27 de março, pela 2ª Promotoria de Justiça de João Pinheiro, em conjunto com a Polícia Civil e com o apoio da Polícia Militar, resultou na deflagração de ações nos âmbitos cível e criminal e no cumprimento de um mandado de busca e apreensão. Atendendo a pedido de liminar feito pelo MPMG na Ação Civil Pública (ACP) , a Justiça determinou a interdição do local.
Na operação, dois administradores do estabelecimento foram presos em flagrante, em decorrência dos crimes pelos quais foram denunciados. O terceiro sócio-administrador também teve a prisão preventiva decretada e está foragido. O quarto integrante da quadrilha, que teve a prisão preventiva decretada, foi apreendido no último dia 15 pela Polícia Civil.
Provas
No estabelecimento, o MPMG e a Polícia encontraram instrumentos utilizados nos crimes, como uma máquina de fabricação caseira utilizada para eletrocutar os internos. Foram apreendidas, ainda, três armas de fogo e dezenas de cartelas de medicamentos de uso restrito, sem receituário médico, que eram ministrados por meio da força aos internos que questionavam alguma ‘regra’ da comunidade terapêutica.

Segundo o promotor de Justiça Luís Gustavo Patuzzi Bortoncello, os internos não recebiam avaliação médica anterior à internação, nem eram inseridos em acompanhamento psiquiátrico ou de qualquer profissional da área médica, já que o local não dispunha desse tipo de profissional.
Bortoncello explicou que não havia enfermeiro ou técnico de enfermagem responsável pelo estabelecimento, cabendo aos próprios internos ministrarem medicamentos uns nos outros, sob a supervisão de algum monitor da Comunidade. 
O promotor ainda acrescentou que o local retinha os documentos pessoais, cartões bancários e de benefícios assistenciais dos atendidos, com a respectiva senha, para impedir que eles abandonassem o ‘tratamento’ ou fugissem e para garantir o pagamento da ‘prestação de serviços’, cujos contratos, inclusive, não eram firmados pelos próprios internos, mas geralmente por algum ‘responsável ou familiar’, para indicar que os pacientes não eram capazes para os atos da vida civil.
Ainda foi apurado que a Comunidade prestava o serviço de ‘resgate’, por meio do qual uma equipe de quatro integrantes, utilizando coletes com a inscrição ‘Operações Especiais’, abordava as pessoas na rua, residência ou local de trabalho, sempre a partir da comunicação de um terceiro. Fazendo uso de força, conduzia o agora interno para a comunidade terapêutica, que continha muros, cercas elétricas e todo um aparato destinado a impedir a fuga ou a deserção do tratamento.
“Na condução do interno, após o emprego de força física, os integrantes da equipe injetavam medicamento tranquilizante no paciente, que imediatamente perdia os sentidos, acabando por recuperá-los apenas no interior da comunidade terapêutica”, denunciou o promotor de Justiça.
Conforme as investigações, o contato social era praticamente inexistente, pois não eram permitidas visitas aos atendidos ou frequência à escola ou instituição religiosa. A instituição permitia, apenas, um telefonema mensal, sob a supervisão de um monitor, para algum familiar.Durante a operação, o Ministério Público e a Polícia Civil colheram depoimento de aproximadamente 20 internos, que confirmaram a prática dos crimes.
“Com a ação, o Ministério Público conseguiu interditar um verdadeiro depósito medieval de seres humanos, onde crianças, adolescentes, adultos e idosos, alguns com deficiência física, conviviam conjuntamente e em condições desumanas. Mais de 30 pessoas recuperaram a liberdade”, ressaltou Bortoncello.

Ação Civil
Além da interdição do estabelecimento, a Justiça deferiu outros pedidos de antecipação de tutela, em caráter liminar, apresentados pelo MPMG na ACP, e indisponibilizou os bens móveis e imóveis dos demandados (com exceção das pessoas jurídicas de direito público), expediu ordem de impedimento de exercerem atividades em clínicas para drogadição, comunidades terapêuticas ou estabelecimentos congêneres (também com exceção das pessoas jurídicas de direito público) e determinou a inserção dos "internos” residentes na comarca em tratamento à drogadição realizado pelo Centro de Atenção Psicossocial  (Caps). Acionada pelo MPMG, a Secretaria Municipal de Ação Social providenciou o encaminhamento dos pacientes aos respectivos núcleos familiares.

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